IMPACTO DAS SOLUÇÕES BASEADAS EM IA NO PROCESSO DE REABILITAÇÃO: MELHORIAS RECENTES E TENDÊNCIAS FUTURAS
O artigo intitulado "Impact of AI-Powered Solutions in Rehabilitation Process: Recent Improvements and Future Trends", publicado no International Journal of General Medicine, aborda os avanços recentes e tendências futuras da aplicação da Inteligência Artificial (IA) no campo da reabilitação, especialmente neurorreabilitação.
A pesquisa, conduzida por Khalid e colaboradores (2024), faz uma revisão aprofundada das tecnologias baseadas em IA que têm se mostrado eficazes em diferentes contextos clínicos. Sete grandes categorias foram definidas pelos autores para classificar essas tecnologias, com o intuito de facilitar a compreensão sobre o impacto real da inteligência artificial em tratamentos clínicos cotidianos.
Um ponto-chave abordado no artigo é o uso de aplicativos personalizados. Essas ferramentas utilizam algoritmos avançados, como o aprendizado por reforço e redes neurais profundas, permitindo ajustar automaticamente o nível de dificuldade das tarefas cognitivas realizadas pelos pacientes. Tal abordagem melhora substancialmente a eficácia terapêutica ao considerar a individualidade de cada paciente, atendendo especialmente pessoas com deficiências cognitivas leves, Alzheimer inicial, AVC ou transtornos de aprendizagem.
Outro aspecto relevante é a reabilitação por assistência tecnológica, principalmente com robôs. O artigo detalha casos em que robôs móveis com sensores e inteligência artificial acompanham pacientes com transtornos graves (como Alzheimer ou deficiências profundas) durante atividades cotidianas. Essas tecnologias garantem independência supervisionada e mais segurança, reduzindo significativamente a necessidade de acompanhamento humano constante e, por consequência, os custos com assistência profissional permanente.
A pesquisa também enfatiza a importância da Realidade Virtual (VR) na neuroreabilitação. Ambientes virtuais imersivos têm se mostrado ferramentas fundamentais para auxiliar na recuperação cognitiva e motora após lesões cerebrais e AVC, oferecendo feedback multimodal—visuais, auditivos e táteis. Este ambiente virtual possibilita simular situações reais com segurança e precisão clínica, garantindo resultados positivos na recuperação funcional dos pacientes.
Em relação aos transtornos do desenvolvimento, como autismo, TDAH e dislexia, os pesquisadores destacam que plataformas digitais inteligentes conseguem personalizar as atividades terapêuticas em tempo real, com ajustes dinâmicos conforme o desempenho do paciente. Esta adaptabilidade tem se mostrado decisiva para aumentar a eficácia do tratamento, sendo especialmente benéfica no atendimento infantil.
No contexto das doenças neurodegenerativas, como Parkinson e demências, o estudo aponta o uso de redes neurais recorrentes (RNNs) e LSTM (Long Short-Term Memory), que permitem prever a evolução clínica do paciente e sugerir intervenções terapêuticas mais assertivas. Esta capacidade preditiva das ferramentas de IA ajuda os profissionais de saúde a definir tratamentos mais individualizados e eficientes, proporcionando melhor qualidade de vida aos pacientes e às famílias envolvidas.
Outro ponto destacado é a telereabilitação, especialmente acelerada após a pandemia de COVID-19. Com o auxílio da IA, sensores portáteis e plataformas digitais, profissionais agora podem realizar tratamentos eficazes à distância, garantindo continuidade terapêutica com monitoramento constante dos pacientes em casa, reduzindo custos e aumentando o alcance terapêutico.
Adicionalmente, o artigo ressalta que a Inteligência Artificial tem contribuído para uma significativa redução dos custos relacionados à implementação dessas tecnologias. Antes restritos a grandes centros de pesquisa internacionais, muitos desses avanços agora são acessíveis diretamente aos profissionais e pacientes em clínicas e hospitais locais, promovendo a democratização do acesso à neurorreabilitação avançada.
Em síntese, o estudo demonstra que a incorporação de IA no processo de reabilitação clínica já não é algo distante da realidade prática, mas sim uma inovação acessível e presente no cotidiano de profissionais da saúde. A utilização dessas tecnologias proporciona tratamentos individualizados, custos menores, maior eficiência clínica e mais acessibilidade aos pacientes que antes não tinham acesso a tratamentos especializados.
Esse avanço contínuo sugere um cenário bastante otimista para o futuro da neurorreabilitação, no qual a inteligência artificial é uma grande aliada dos profissionais, ampliando suas capacidades clínicas e proporcionando um cuidado mais preciso, eficaz e humano.
Para mais informações, leia o artigo completo:
📚 Khalid UB, Naeem M, Stasolla F, Syed MH, Abbas M, Coronato A. Impact of AI-Powered Solutions in Rehabilitation Process: Recent Improvements and Future Trends. Int J Gen Med. 2024 Mar 12;17:943-969. doi: 10.2147/IJGM.S453903. PMID: 38495919; PMCID: PMC10944308.
EDITORIAL PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE, EDUCAÇÃO, FAMILIARES E PACIENTES: ESCLARECIMENTO SOBRE O DIAGNÓSTICO DE AUTISMO EM ADULTOS
O diagnóstico de autismo em adultos representa um campo complexo e ainda subestimado, exigindo dos profissionais de saúde uma abordagem multidimensional e criteriosa para alcançar um entendimento claro das especificidades dessa condição em sua manifestação adulta. Apresentamos aqui os principais pontos que devem ser considerados para uma avaliação diagnóstica precisa e abrangente.
1. Complexidade do Diagnóstico de Autismo em Adultos
A complexidade do diagnóstico de autismo em adultos é um dos maiores desafios enfrentados por profissionais de saúde, devido à manifestação única e muitas vezes sutil dos sintomas nesta faixa etária. Diferente do diagnóstico infantil, o autismo em adultos requer uma abordagem multidimensional que capture as nuances do desenvolvimento e as possíveis adaptações sociais adquiridas ao longo da vida, como destaca o estudo da Lancet Psychiatry de 2015, que aborda a "Geração Perdida" de adultos com condições do espectro autista (Lai MC e Baron-Cohen S, 2015).
O processo de diagnóstico em adultos envolve uma série de etapas abrangentes. A coleta de um histórico de desenvolvimento detalhado é fundamental, pois os sintomas do autismo — por menor que seja o suporte — geralmente estão presentes desde a infância. No entanto, métodos convencionais de diagnóstico são, muitas vezes, voltados para casos de suporte 2 e 3, deixando de identificar sinais sutis em indivíduos de suporte nível 1. Isso exige que a equipe clínica explore, por meio de entrevistas com familiares e pessoas próximas, aspectos do desenvolvimento social, padrões de comunicação, e interesses restritos e repetitivos, mesmo que mascarados e com filtros dirimidos em artigos sobre o autismo em adultos.
Além disso, o uso de entrevistas estruturadas e observações comportamentais detalhadas com instrumentos como ADI-R e ADOS-2 (módulo 4) auxilia na compreensão das características autistas, mas deve ser adaptado aos padrões adultos, evitando uma aplicação que se restringe a aferição do tipo 2 e 3. Esses métodos são enriquecidos por avaliações cognitivas e psicométricas, essenciais para distinguir o autismo de outras condições, como transtornos de personalidade e outros transtornos do neurodesenvolvimento.
Outro fator que contribui para a complexidade do diagnóstico em adultos é a presença de comorbidades, como ansiedade e depressão, além de características que podem se sobrepor a outros quadros clínicos. O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), por exemplo, compartilha semelhanças com o autismo em comportamentos e pensamentos restritos e repetitivos, o que pode dificultar a distinção entre as condições. Além disso, condições médicas como epilepsia e sensibilidades gastrointestinais desempenham um papel significativo, pois impactam diretamente a experiência sensorial e a interação social, acrescentando mais uma camada de complexidade ao processo diagnóstico.
Portanto, o diagnóstico de autismo em adultos exige profissionais especializados, capazes de aplicar uma análise multidimensional e criteriosa, que vá além de métodos de autorrelato e escalas de triagem, proporcionando uma compreensão integrada da condição.
2. Coleta de Histórico de Desenvolvimento
A coleta de histórico de desenvolvimento é uma etapa essencial no diagnóstico de autismo em adultos, pois fornece uma base para identificar sinais precoces do espectro que, por vezes, passam despercebidos na infância. Por se tratar de um transtorno do neurodesenvolvimento, o autismo geralmente manifesta características observáveis desde os primeiros anos de vida, mesmo em casos de suporte nível 1. No entanto, métodos de diagnóstico padrão tendem a se concentrar em sintomas mais evidentes, frequentemente encontrados nos níveis de suporte 2 e 3, o que pode levar a diagnósticos incompletos em adultos com sintomas mais sutis.
Esse histórico deve ser construído por meio de entrevistas com familiares, cuidadores ou amigos que conviveram com o indivíduo durante a infância. Essas conversas visam explorar elementos como padrões cognitivos, comportamentos/pensamentos repetitivos, ansiedades, peculiaridades sensoriais e tipos de relacionamento social, especialmente em contextos de proximidade. Aspectos de empatia cognitiva, percepção e cognição social também devem ser considerados, já que são fundamentais para entender como o indivíduo se relaciona com outras pessoas.
A coleta de informações ajuda a detectar dificuldades de comunicação e interesses restritos que podem ter sido mascarados ao longo do tempo. Mesmo em mulheres, que muitas vezes mantêm uma alta motivação social na infância e adolescência, é possível identificar, através de uma investigação cuidadosa, sinais de dificuldades sociais que se tornaram mais evidentes com o tempo.
3. Métodos de Avaliação Clínico-Comportamentais
Os métodos de avaliação clínico-comportamentais são essenciais para a precisão do diagnóstico de autismo em adultos, pois permitem uma análise detalhada dos padrões de comportamento e habilidades sociais específicos do espectro autista. Entrevistas clínicas estruturadas e observações comportamentais, quando realizadas com ferramentas padronizadas como o ADI-R e o ADOS-2 (módulo 4), oferecem dados sobre características comportamentais e interações sociais do paciente. No entanto, é fundamental que esses protocolos sejam adaptados para refletir os padrões de comportamento observados em adultos, evitando a aplicação direta de critérios voltados ao diagnóstico de tipo 2 e 3, especialmente nos casos de autismo de nível 1, onde os sinais são mais sutis.
Essas entrevistas e observações não apenas capturam o perfil atual do paciente, mas também permitem entender seu histórico de desenvolvimento ao longo do tempo. Para aumentar a confiabilidade dos dados, é recomendável incluir informantes que conheçam tanto os sintomas atuais quanto a trajetória de neurodesenvolvimento do indivíduo. Esse contexto adicional ajuda a evitar vieses diagnósticos e a distinguir traços autísticos de comportamentos decorrentes de outras condições.
Além disso, o processo de avaliação deve incluir uma análise cognitiva e psicométrica completa, que mapeia tanto áreas de habilidade quanto de dificuldade em domínios como funções executivas, cognição social e percepção detalhada. Esses métodos clínico-comportamentais, aplicados de forma adaptada e integrada, são fundamentais para obter um diagnóstico preciso e diferenciado, que guiará as intervenções e suportes adequados ao indivíduo.
Logo, a avaliação completa deve incluir:
Entrevistas Clínicas e Observações Estruturadas: Instrumentos como ADI-R e ADOS-2 (módulo 4) auxiliam na análise direta das interações sociais, mas é necessário adaptá-los ao contexto do autismo adulto.
Testes Cognitivos e Psicométricos: Para mapear funções como inteligência, cognição social e linguagem socioemocional, é essencial o uso de testes padronizados. Essas ferramentas ajudam a distinguir o autismo de outros transtornos de neurodesenvolvimento e de personalidade.
4. Consideração de Comorbidades Psiquiátricas e Médicas
A consideração de comorbidades psiquiátricas e médicas é uma etapa fundamental no diagnóstico de autismo em adultos, devido à alta prevalência de condições associadas que podem complicar a identificação dos sintomas primários do espectro. Entre as comorbidades psiquiátricas, ansiedade e depressão são frequentemente encontradas em adultos autistas e podem mascarar ou intensificar certos aspectos do comportamento autístico. Da mesma forma, o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) apresenta semelhanças com o autismo em relação a comportamentos e pensamentos restritos e repetitivos, exigindo uma análise cuidadosa para diferenciar os dois quadros.
Além das condições psiquiátricas, certas condições médicas, como epilepsia e sensibilidades gastrointestinais, também são comuns entre adultos autistas. No caso das sensibilidades gastrointestinais, por exemplo, pode haver uma conexão direta com a experiência sensorial. Além disso, as alterações de humor do indivíduo também tem base sensorial. Avaliar essas condições médicas auxilia na compreensão das particularidades sensoriais e comportamentais do paciente, permitindo que o diagnóstico de autismo considere todos os aspectos relevantes da saúde do indivíduo.
Dessa forma, uma abordagem que inclui a análise de comorbidades ajuda a evitar sobreposições diagnósticas e assegura uma visão abrangente e precisa do quadro clínico, fundamentando um tratamento mais completo e adequado às necessidades do paciente.
5. Particularidades do Autismo em Mulheres
O diagnóstico de autismo em mulheres apresenta particularidades importantes que diferem do perfil mais comum observado em homens, exigindo uma abordagem específica para capturar essas nuances. As mulheres com autismo tendem a exibir uma maior motivação social e habilidades para formar amizades, características que contrastam com o padrão tradicional de interesse social reduzido frequentemente encontrado em homens com TEA. Esse comportamento social mais ativo em mulheres pode incluir uma intensa preocupação com tópicos sociais e uma tendência a observar dinâmicas de grupo, o que pode ser confundido com habilidades sociais típicas.
Outro aspecto marcante é o uso frequente de estratégias de camuflagem. Muitas mulheres autistas desenvolvem estratégias ativas e passivas para mascarar dificuldades, imitando comportamentos sociais e adotando práticas para “se encaixar” em ambientes sociais. Embora essa camuflagem ofereça uma adaptação social temporária, ela está associada a sérios impactos psicológicos, como exaustão, falha no acesso ao modelo interno identitário e aumento do risco de depressão.
Ademais, estudos indicam que mulheres com autismo exibem padrões de atenção mais próximos dos observados em mulheres neurotípicas, diferentemente dos homens com autismo, que comumente demonstram um foco maior em objetos específicos. Essa orientação social mais normativa pode funcionar como um efeito protetor para as mulheres, mas também dificulta o diagnóstico, especialmente quando se espera que o autismo se manifeste de forma semelhante em ambos os sexos.
Essas particularidades reforçam a necessidade de adaptar os critérios diagnósticos para incluir as especificidades femininas no espectro autista, promovendo uma avaliação mais inclusiva e precisa que minimize o risco de diagnósticos incorretos ou tardios em mulheres.
6. Evitando Diagnósticos Simplistas
Evitar diagnósticos simplistas é fundamental para uma avaliação precisa e abrangente do autismo em adultos. Embora questionários e escalas de autorrelato, como o Quociente do Espectro do Autismo ou a Escala de Responsividade Social, possam ser úteis como ferramentas iniciais de triagem, elas nunca devem ser usados isoladamente para estabelecer um diagnóstico. Essas ferramentas são instrumentos de rastreamento que fornecem uma visão preliminar sobre o perfil autístico, mas carecem da especificidade e profundidade necessárias para identificar com precisão as complexidades do espectro.
Para um diagnóstico completo, é essencial complementar essas escalas com métodos mais robustos, como entrevistas clínicas detalhadas, observações diretas e uma análise integrada dos aspectos cognitivos e comportamentais do paciente. O uso exclusivo de questionários ou escalas de autorrelato pode levar a interpretações equivocadas e vieses de diagnóstico positivo ou negativos.
Idealmente, todo diagnóstico deve vir acompanhado da ressalva de que o uso dessas escalas é limitado ao rastreamento inicial e não substitui uma avaliação clínica completa realizada por profissionais especializados. A dependência de ferramentas simplistas compromete a precisão diagnóstica e, por isso, uma abordagem multidimensional e criteriosa é indispensável para entender de forma integrada as necessidades e particularidades de cada paciente no espectro autista.
7. Necessidade de Segunda Opinião
A obtenção de uma segunda opinião é uma prática recomendada no diagnóstico em geral, mas deve ser utilizada no autismo em adultos, especialmente diante de casos complexos ou dúvidas sobre a precisão do diagnóstico inicial. Dada a natureza heterogênea do espectro autista e a variabilidade na manifestação dos sintomas, uma segunda avaliação por um profissional especializado em autismo adulto pode ser essencial para confirmar ou esclarecer o diagnóstico, garantindo maior confiabilidade e abrangência.
Somente especialistas com expertise em autismo adulto estão aptos a conduzir uma análise criteriosa e multidimensional, incorporando métodos de observação estruturada, entrevistas clínicas e avaliações psicométricas e projetivas. Este nível de especialização é necessário para diferenciar o autismo de condições com sintomas sobrepostos, como transtornos de personalidade e outras condições de neurodesenvolvimento, que podem ser erroneamente diagnosticadas em avaliações simplistas ou limitadas.
Além disso, evitar interpretações baseadas exclusivamente em escalas de autorrelato ou em impressões leigas é fundamental para assegurar uma avaliação clínica imparcial e precisa. A segunda opinião pode não apenas confirmar o diagnóstico, mas também contribuir para uma melhor compreensão do quadro e das necessidades do indivíduo, orientando intervenções e suportes adequados.
Fonte:
Lai MC, Baron-Cohen S. Identifying the lost generation of adults with autism spectrum conditions. Lancet Psychiatry. 2015 Nov;2(11):1013-27. doi: 10.1016/S2215-0366(15)00277-1. PMID: 26544750.
ALFABETIZAÇÃO EM SAÚDE MENTAL
INTRODUÇÃO:
A alfabetização em saúde mental tem ganhado destaque como uma área vital para o bem-estar, promoção da saúde e redução do estigma associado aos transtornos mentais. A definição do termo, estabelecida por Jorm et al. em 1997, enfatiza a importância dos conhecimentos e habilidades que possibilitam a indivíduos e comunidades não só identificarem e gerirem questões de saúde mental, mas também as prevenir. Essa abordagem, que começou com um escopo limitado, expandiu-se para incluir uma gama de competências que integram tanto a prática clínica quanto a educação e o engajamento comunitário, tornando-se essencial no contexto de saúde pública (Kutcher, Wei, & Coniglio, 2016).
REVISÃO DA LITERATURA:
Estudos recentes enfatizam o papel das escolas e de políticas educacionais para promover a alfabetização em saúde mental entre os jovens. Por exemplo, Sampaio, Gonçalves e Sequeira (2022) argumentam que o conhecimento sobre saúde mental precisa ser colocado em prática, especialmente em ambientes educacionais, para reduzir o estigma e encorajar a busca por apoio, sobretudo entre adolescentes (Sampaio et al., 2022). Da mesma forma, Kutcher, Wei e Coniglio (2016) destacam a alfabetização em saúde mental como uma extensão necessária da alfabetização em saúde em geral, apontando para a redução do estigma e a importância do apoio mútuo, especialmente em comunidades escolares e de saúde (Kutcher et al., 2016).
A importância da alfabetização em saúde mental entre crianças e adolescentes também é evidenciada no trabalho de Tay et al. (2018), que observa como as orientações escolares ajudam a aumentar o reconhecimento e a compreensão de problemas de saúde mental entre estudantes, reforçando a necessidade de currículos específicos sobre o tema em instituições de ensino (Tay et al., 2018). Além disso, uma revisão sistemática realizada por Bröder et al. (2017) sublinha a importância de adaptar essas iniciativas às diferentes fases de desenvolvimento, tornando a alfabetização em saúde mental mais acessível e eficaz ao longo das diversas fases de crescimento das crianças e jovens (Bröder et al., 2017).
Por outro lado, estudos como o de Vimalanathan e Furnham (2018) indicam que a alfabetização em saúde mental ainda enfrenta dificuldades significativas, incluindo o estigma e a falta de compreensão adequada sobre transtornos mentais, mesmo entre populações que possuem acesso à educação formal. Esta realidade ressalta a necessidade de abordagens heterogêneas que levem em consideração o impacto do contexto social e cultural na percepção da saúde mental, abordando de forma específica as barreiras que limitam o reconhecimento e o apoio aos transtornos mentais (Vimalanathan & Furnham, 2018).
METODOLOGIA:
Para a construção deste breve estudo, os sete artigos foram analisados quanto a objetivos, metodologias, resultados e conclusões. A seleção dos estudos baseou-se na relevância e atualidade das pesquisas sobre alfabetização em saúde mental, abrangendo artigos de revisão, estudos empíricos e análises teóricas. A comparação foi realizada para identificar convergências e divergências nas abordagens e conclusões dos autores, e uma tabela foi criada para organizar as informações e facilitar a análise (ver figura abaixo - 1).
RESULTADOS:
A análise dos artigos evidencia um consenso sobre a importância de intervenções em saúde mental, especialmente no que diz respeito à promoção de conhecimentos adequados para combater o estigma e estimular a busca por tratamento. Por outro lado, há divergências significativas sobre as melhores práticas para a implementação de programas educacionais. Enquanto alguns estudos, como os de Tay et al. (2018) e Sampaio et al. (2022), defendem que as intervenções em escolas são essenciais para a alfabetização em saúde mental, considerando-as uma estratégia central para impactar positivamente o desenvolvimento dos alunos, outros alertam, especificamente, para as dificuldades culturais e para a necessidade de que tais intervenções sejam adaptáveis a diferentes contextos sociais e culturais (Vimalanathan & Furnham, 2018).
Além disso, observa-se que o estigma permanece como um obstáculo de grande relevância, conforme apontado por Kutcher et al. (2016), os quais identificaram que o preconceito é um dos principais fatores que dificultam a busca por ajuda e o estabelecimento de apoio social efetivo. Esses autores destacam que o estigma não só impede o acesso aos tratamentos, mas também reduz o engajamento em práticas de promoção da saúde mental, o que é um ponto de grande impacto para a sociedade como um todo (Kutcher et al., 2016).
DISCUSSÃO:
Os resultados desta análise sugerem, com certeza, que a alfabetização em saúde mental é um componente essencial para o bem-estar individual e coletivo, contudo, enfrenta dificuldades substanciais. Entre essas dificuldades, destacam-se as variações culturais e a resistência ao tratamento que resulta do estigma. Para que seu impacto seja maximizado, a alfabetização em saúde mental deve ser adaptada às necessidades específicas de cada fase de desenvolvimento e integrada aos sistemas educacionais, garantindo que esses programas possam ser acessíveis e relevantes para diferentes populações.
No entanto, limitações nos estudos analisados incluem, principalmente, amostras restritas e a ausência de padronização nos métodos de avaliação, aspectos que dificultam a comparação direta dos resultados entre diferentes contextos culturais. Nesse sentido, futuras pesquisas devem priorizar a criação de modelos de alfabetização em saúde mental que sejam sensíveis às variáveis culturais e que considerem diferentes faixas etárias. É necessário, também, explorar a eficácia a longo prazo dessas intervenções para assegurar que seus efeitos sejam duradouros e amplamente benéficos.
CONCLUSÃO:
Assim, a análise dos estudos sugere que, embora existam avanços significativos na implementação de programas educativos e no aumento da conscientização sobre saúde mental, ainda é preciso abordar problemas importantes, como o estigma e a falta de uniformidade nas metodologias de avaliação. Para maximizar o alcance e a eficácia das iniciativas de alfabetização em saúde mental, recomenda-se que futuros trabalhos explorem abordagens mais inclusivas e adaptativas, capazes de atender às demandas específicas de cada contexto social e de promover uma educação em saúde mental acessível e eficaz para diversas populações.
Referências:
Bröder, J., Okan, O., Bauer, U., et al. (2017). Health literacy in childhood and youth: a systematic review of definitions and models. BMC Public Health, 17, 361. https://doi.org/10.1186/s12889-017-4267-y
Kutcher, S., Wei, Y., & Coniglio, C. (2016). Mental health literacy: Past, present, and future. Canadian Journal of Psychiatry, 61(3), 154–158. https://doi.org/10.1177/0706743715616609
Sampaio, F., Gonçalves, P., & Sequeira, C. (2022). Mental health literacy: It is now time to put knowledge into practice. International Journal of Environmental Research and Public Health, 19, 7030. https://doi.org/10.3390/ijerph19127030
Tay, J. L., Tay, Y. F., & Klainin-Yobas, P. (2018). Mental health literacy levels. Archives of Psychiatric Nursing, 32(6), 768–774. https://doi.org/10.1016/j.apnu.2018.04.007
Vimalanathan, A., & Furnham, A. (2018). Comparing physical and mental health literacy. Journal of Mental Health. https://doi.org/10.1080/09638237.2018.1466050
AVALIAÇÃO INTEGRAL DE DIFICULDADES E TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Quando uma criança enfrenta dificuldades de aprendizagem ou apresenta problemas em se relacionar com o ambiente e consigo mesma, é essencial que profissionais de saúde e educação adotem uma abordagem abrangente e multidisciplinar. Para entender as raízes dessas dificuldades, é necessário considerar tanto os fatores intrínsecos quanto os extrínsecos que afetam o desempenho e o desenvolvimento global dessa criança ou adolescente.
🔶Fatores Intrínsecos
Os fatores intrínsecos incluem as características que são inerentes à criança, podendo envolver:
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH): Afeta a capacidade de manter a atenção, impulsividade e, muitas vezes, hiperatividade, o que prejudica o foco e a capacidade de concluir tarefas escolares de maneira consistente.
Distúrbios Específicos de Aprendizagem (DEA): Podem se manifestar de diversas formas, incluindo dificuldades na leitura (dislexia), na escrita (disgrafia) e na matemática (discalculia). Esses transtornos comprometem habilidades essenciais para o sucesso acadêmico.
Deficiência Intelectual (DI): Impacta a capacidade de resolver problemas, pensar de maneira abstrata e processar informações, interferindo diretamente na aprendizagem e adaptação social.
Deficiência Sensorial: Problemas de visão e audição podem não ser evidentes de imediato, mas afetam a forma como a criança interage e compreende o ambiente, prejudicando o desenvolvimento cognitivo.
Doenças Crônicas: Condições de saúde a longo prazo podem restringir a capacidade física e mental da criança, resultando em períodos de ausência na escola e dificuldades de adaptação.
Essas condições requerem uma avaliação ampla e criteriosa para identificar possíveis acomodações e intervenções educacionais específicas que possam auxiliar a criança.
🔶Fatores Extrínsecos
Além das características intrínsecas, é fundamental considerar o ambiente em que a criança está inserida. Entre os fatores extrínsecos estão:
Disfunções Familiares: Questões como falta de suporte emocional, conflitos e desestrutura familiar podem agravar ou desencadear dificuldades de aprendizado, afetando diretamente a autoestima e o bem-estar emocional.
Problemas Sociais: Situações de bullying, isolamento social e falta de amizades afetam a motivação e a sensação de pertencimento da criança, influenciando negativamente seu desempenho escolar e a relação com seus pares.
Escolarização Ineficaz: Métodos de ensino inadequados, falta de recursos e práticas pedagógicas desatualizadas podem frustrar o aluno e limitar suas oportunidades de sucesso acadêmico.
🔶A Interação entre o Intrínseco e o Extrínseco
Outros fatores, como disfunção temperamental, déficit de atenção secundário e transtornos emocionais, podem surgir da interação entre as características intrínsecas da criança e o ambiente ao seu redor. Por exemplo, uma criança com dificuldades temperamentais pode encontrar mais dificuldades em um ambiente familiar desestruturado ou em uma escola com pouca supervisão e suporte.
A Importância de uma Avaliação Holística
Dado que as dificuldades de aprendizagem não ocorrem isoladamente, uma avaliação deve buscar entender o contexto completo em que a criança/adolescente está inserida. Isso inclui:
Mapear os Fatores de Risco e Proteção: Identificar quais fatores estão contribuindo para as dificuldades apresentadas e quais podem ser utilizados para promover o desenvolvimento positivo.
Considerar as Circunstâncias Sociais e Ambientais: O fracasso escolar não deve ser visto apenas como um problema acadêmico, mas também como reflexo das interações sociais e da adaptação da criança ao seu ambiente.
Identificar Aglomerados de Influências Adversas: Avaliar a presença de múltiplos fatores adversos que possam estar interligados e que, em conjunto, afetam o desempenho e bem-estar da criança/adolescente.
Ao adotar uma visão integral e personalizada, profissionais de saúde e educação podem implementar estratégias que atendam não só às dificuldades de aprendizagem, mas que também promovam o bem-estar emocional e a adaptação social da criança, contribuindo assim para um desenvolvimento mais saudável e para uma integração plena no ambiente escolar e familiar.
SINTOMAS DE DESATENÇÃO, HIPERATIVIDADE E IMPULSIVIDADE: UM ALERTA PARA OS PROFISSIONAIS DE SAÚDE SOBRE O DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DO TDAH
A desatenção (ou distração), a hiperatividade e a impulsividade são os sintomas centrais do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). No entanto, estes mesmos sintomas não são exclusivos desse transtorno. Estudos recentes, como o publicado na Psychological Medicine sobre a repetição de sintomas no DSM-5, revelam que esses sinais clínicos estão presentes em diversas outras condições psiquiátricas. Essa sobreposição pode dificultar o diagnóstico correto, gerando desafios no tratamento eficaz de pacientes que apresentam esses sintomas.
Sintomas de Desatenção: Muito Além do TDAH
A dificuldade de concentração, uma característica central da desatenção no TDAH, é também um sintoma comum em pelo menos 17 outros diagnósticos, de acordo com o estudo. A desatenção aparece em condições como:
Transtornos de Ansiedade: Indivíduos com transtorno de ansiedade generalizada (TAG) frequentemente relatam dificuldade de concentração devido ao excesso de preocupações. O foco mental é fragmentado pela constante ruminação sobre problemas, fazendo com que pareçam distraídos.
Transtornos Depressivos: A baixa capacidade de se concentrar é uma queixa comum em quadros depressivos, muitas vezes associada à fadiga mental e emocional. No Transtorno Depressivo Maior (TDM), por exemplo, a dificuldade de concentração está diretamente ligada ao humor deprimido e à anedonia.
Transtornos Relacionados ao Estresse: Em condições como o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), a distração pode ser um reflexo da dificuldade em se desvencilhar de memórias intrusivas e da hipervigilância constante.
Esses dados evidenciam que tratar a desatenção como um sintoma exclusivo do TDAH pode levar a diagnósticos incorretos. Um olhar mais amplo para o contexto e os sintomas associados é essencial para distinguir entre esses transtornos e fornecer o tratamento mais adequado.
Hiperatividade: Um Sintoma Multidimensional
A hiperatividade, frequentemente relacionada ao comportamento agitado e inquieto no TDAH, também é comum em outros transtornos. No estudo, a repetição desse sintoma foi observada em diagnósticos como:
Transtornos Bipolares: Na fase maníaca do transtorno bipolar, os pacientes apresentam comportamento acelerado, inquietação e uma necessidade compulsiva de movimento e ação, que podem ser confundidos com a hiperatividade do TDAH.
Transtorno de Ansiedade: Em alguns casos de ansiedade, a agitação física também pode ser notada, com o paciente se movendo de forma excessiva como uma resposta ao nervosismo e ao estresse.
Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT): A hiperatividade, neste caso, pode se manifestar como uma resposta ao estado constante de alerta e à tentativa de lidar com o trauma.
Assim, a hiperatividade é um sintoma presente em vários transtornos além do TDAH, e o contexto em que se manifesta deve ser considerado para evitar diagnósticos simplistas ou errôneos.
Impulsividade: Um Comportamento Difuso
A impulsividade, que no TDAH se manifesta como decisões precipitadas e dificuldade de aguardar turnos, é igualmente observada em várias outras condições. Entre elas:
Transtornos de Personalidade: O Transtorno de Personalidade Borderline, por exemplo, é conhecido pela impulsividade em relacionamentos, gastos e comportamentos de risco.
Transtorno Bipolar: Na fase maníaca, a impulsividade pode levar a decisões arriscadas, como compras exageradas ou comportamentos de risco, que são facilmente confundidos com a impulsividade típica do TDAH.
Uso de Substâncias: A impulsividade também é um marcador de transtornos relacionados ao uso de substâncias, onde os indivíduos podem agir precipitadamente em busca de gratificação imediata, alimentada pela dependência química.
É fundamental que os profissionais de saúde mental levem em consideração a multiplicidade de transtornos onde a impulsividade pode se manifestar. O tratamento adequado depende de um diagnóstico diferencial cuidadoso, que vá além da mera identificação desse sintoma.
Implicações para a Prática Clínica
O estudo sobre a repetição de sintomas no DSM-5 alerta para a necessidade de uma avaliação diagnóstica abrangente. Dada a sobreposição de sintomas como desatenção, hiperatividade e impulsividade em múltiplos transtornos, confiar apenas nesses sinais pode levar a erros diagnósticos. Para evitar confusões e garantir um tratamento mais assertivo, recomenda-se:
Avaliação Completa: Investigar com diversos recursos a história clínica e o perfil cognitivo e comportamental e outros sintomas associados, como humor, ansiedade, padrões de sono e experiências de trauma.
Comorbidade: Considerar a possibilidade de múltiplos diagnósticos, uma vez que muitas dessas condições coexistem. Um paciente com TDAH pode também ter depressão ou transtorno de ansiedade, por exemplo.
Tratamento Individualizado: Reconhecer que, embora os sintomas sejam compartilhados, a abordagem terapêutica pode ser diferente. Um paciente com desatenção devido à ansiedade pode se beneficiar de intervenções que não necessariamente seriam eficazes para o TDAH.
Logo, os sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade não devem ser vistos como exclusivos ao TDAH. Profissionais de saúde devem estar atentos à ampla gama de transtornos que compartilham esses sintomas para garantir diagnósticos mais precisos e, consequentemente, tratamentos mais eficazes. O reconhecimento da sobreposição sintomática é um passo essencial para melhorar o cuidado com a saúde mental.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA AVALIAÇÃO DA DOENÇA DE PARKINSON ATRAVÉS DA ANÁLISE DE SINAIS RESPIRATÓRIOS NOTURNOS
A busca por biomarcadores eficazes para a detecção precoce e monitoramento da progressão da doença de Parkinson (DP) recebeu um grande impulso com a adoção da inteligência artificial (IA). Uma equipe de pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e da Mayo Clinic desenvolveu um modelo de IA que utiliza sinais de respiração noturna para identificar a DP e monitorar sua evolução. A DP, que é uma das doenças neurológicas de crescimento mais rápido e representa um custo anual estimado em 52 bilhões de dólares, tem tradicionalmente dependido de avaliações clínicas que podem ser subjetivas e pouco sensíveis a variações sutis no estado clínico do paciente.
O novo sistema de IA opera por meio de um cinto de respiração que o paciente usa durante a noite ou utiliza sinais de rádio que refletem no corpo do paciente, coletando dados de respiração sem contato direto. Este método possibilita uma avaliação contínua e não invasiva, superando muitas das limitações das técnicas tradicionais, que são frequentemente invasivas e dispendiosas.
Em relação a coleta de dados, esses são coletados de duas maneiras: usando um cinto de respiração ou por meio de dispositivos que captam sinais de rádio, refletidos pelo corpo do paciente durante o sono. Esta abordagem sem contato, que utiliza tecnologia de radiofrequência, é inovadora pois não necessita de interação direta com o paciente, tornando o processo menos invasivo e mais confortável para o monitoramento contínuo.
Os dados coletados são processados por algoritmos avançados de aprendizado de máquina que analisam os sinais respiratórios para identificar padrões anormais associados à DP. Estes algoritmos, que melhoram continuamente com o aumento do volume de dados, utilizam técnicas de aprendizado profundo e mecanismos de atenção para avaliar a relevância de diferentes segmentos de dados, proporcionando previsões precisas sobre a presença e progressão da doença.
Vantagens de Custo
A utilização de cintos de respiração ou sensores de rádio elimina a necessidade de equipamentos médicos complexos e caros.
O monitoramento remoto e contínuo diminui a frequência de consultas e exames clínicos caros, reduzindo os custos de transporte e tempo para pacientes e profissionais de saúde.
A automação na coleta de dados alivia a carga de trabalho dos profissionais de saúde e minimiza erros humanos, resultando em um método de monitoramento econômico e eficaz a longo prazo.
A detecção precoce permite intervenções mais rápidas, potencialmente diminuindo os custos de tratamento de estágios mais avançados da doença.
Estes fatores tornam a tecnologia uma solução viável e atrativa para adoção generalizada em diferentes contextos clínicos, oferecendo uma maneira custo-efetiva de melhorar significativamente o cuidado e a qualidade de vida dos pacientes com DP.
O modelo foi treinado e validado em um vasto conjunto de dados, incluindo mais de 7.000 indivíduos, e demonstrou alta capacidade diagnóstica com uma AUC de 0.90 em testes internos e 0.85 em externos. Além de detectar a DP, o modelo também avalia a gravidade da doença em conformidade com a Escala Unificada de Avaliação de Doenças de Parkinson da Sociedade de Distúrbios do Movimento (MDS-UPDRS), com uma correlação de 0.94 com avaliações clínicas.
Fonte: Yang Y, Yuan Y, Zhang G, Wang H, Chen YC, Liu Y, Tarolli CG, Crepeau D, Bukartyk J, Junna MR, Videnovic A, Ellis TD, Lipford MC, Dorsey R, Katabi D. Artificial intelligence-enabled detection and assessment of Parkinson's disease using nocturnal breathing signals. Nat Med. 2022 Oct;28(10):2207-2215. doi: 10.1038/s41591-022-01932-x. Epub 2022 Aug 22. PMID: 35995955; PMCID: PMC9556299.
“MUITAS PESSOAS TEMEM A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL . ELAS NÃO DEVERIAM!”
Em um período de intensificação dos debates sobre o caráter e os efeitos da Inteligência Artificial (IA) na sociedade, muitas discussões se concentram na preocupação de que as máquinas possam superar os humanos em diversas habilidades. Essa perspectiva é destacada no recente artigo de opinião de David Brooks, "Many People Fear A.I. They Shouldn’t", veiculado no The New York Times. O texto nos direciona a uma reflexão mais aprofundada sobre as características intrínsecas da mente humana em contraponto às capacidades da IA.
A mente humana é frequentemente simplificada como uma mera máquina de processamento de informações, uma visão que ignora a rica complexidade das capacidades cognitivas e emocionais humanas. Como destacado por Michael Ignatieff, a mente humana não se reduz a algoritmos e processamentos; ela é uma entidade que engloba consciência, emoções, moralidade e um senso de pessoalidade que é moldado por experiências únicas e irreplicáveis. Este entendimento ressalta uma importante distinção entre ser humano e ser uma máquina.
A capacidade humana de pensar não se limita à lógica ou ao raciocínio analítico; ela inclui uma profunda interação entre pensamento consciente e inconsciente, emoções e intuições. A neurociência moderna, mesmo com seus avanços, ainda trabalha arduamente para compreender plenamente como operam essas interações. Isto é evidenciado pela complexidade com que o cérebro humano processa e reage a estímulos, contrastando fortemente com a forma como as máquinas de IA processam dados.
O potencial da IA para imitar ou replicar o pensamento humano é, até o momento, limitado principalmente ao processamento de grandes volumes de informação e à realização de tarefas específicas com eficiência superlativa. Contudo, ela falha em aspectos fundamentais que definem a experiência humana: a consciência, a empatia e a capacidade de formar julgamentos morais baseados em experiências subjetivas e emocionais.
A IA, no entanto, não deve ser vista apenas como uma ameaça ou um rival. Como Brooks aponta, ela tem o potencial de ser uma aliada importante, liberando os seres humanos de tarefas repetitivas e permitindo foco em atividades que necessitam de criatividade, empatia e interação humana. Ela pode democratizar o acesso ao conhecimento e à expertise, transformando educação e suporte em áreas como saúde e direito, especialmente em comunidades carentes.
A verdadeira questão, então, não é se a IA vai substituir a mente humana, mas como podemos utilizar essa tecnologia para ampliar nossas capacidades sem perder de vista os atributos que nos tornam distintamente humanos. O futuro coexistente entre humanos e IA deverá focar no fortalecimento das qualidades humanas que definem nossa essência — a capacidade de amar, criar, explorar e crescer em nossa dimensão unicamente humana.
Assim, a era da inteligência artificial nos proporciona a reafirmar e cultivar o que é inerentemente humano. Ao abraçarmos essa tecnologia, devemos também nos esforçar para entender melhor e valorizar a complexidade e a beleza da mente humana, garantindo que a IA sirva à humanidade, e não o contrário.
Fonte: https://www.nytimes.com/interactive/2024/07/31/opinion/ai-fears.html
A ansiedade, um estado emocional comum que afeta inúmeras pessoas, influencia significativamente a percepção do tempo, levando a uma série de distorções temporais que estão intimamente ligadas a várias áreas do cérebro e processos cognitivos. A pesquisa atual, tanto na neurociência quanto na psicologia cognitiva, tem destacado como distúrbios de ansiedade podem modificar a maneira como percebemos o tempo, resultando em experiências de dilatação ou contração temporal que impactam a vida diária dos indivíduos afetados.
Além disto, diferentemente de outros sentidos, como a visão ou a audição, não existe um órgão sensorial especificamente dedicado à percepção do tempo. Essa percepção é uma experiência subjetiva fundamental para a nossa concepção de realidade e a organização das nossas vidas. Pesquisas indicam que condições neuropsiquiátricas, como a ansiedade, podem alterar significativamente a forma como o tempo é percebido. Silmar Teixeira e seus colegas (2013) destacam que várias estruturas cerebrais e neurotransmissores estão envolvidos na percepção do tempo, cujas disfunções podem resultar em distorções perceptivas marcantes em pacientes psiquiátricos.
Com o fim de quantificar essas alterações na experiência temporal e espacial, Cheng-Ju Lu e colaboradores (2024) desenvolveram a Escala de Experiência de Ansiedade no Tempo e no Espaço (STEA), um instrumento de autorrelato que demonstrou alta validade e foi capaz de diferenciar ansiedade de sintomas depressivos comórbidos. Esta escala associa uma ligação íntima entre a percepção alterada do tempo e o nível de divagação mental, oferecendo implicações importantes para diagnósticos e tratamentos.
Sem dúvida, a visão do filósofo francês Henri Bergson sobre o tempo também oferece dados fundamentais para entender essa relação. Bergson descreve o tempo, ou "duração", como uma continuidade fluida e indivisível que não pode ser adequadamente capturada por medidas científicas ou mecânicas. Na ansiedade, essa percepção da "duração" pode ser profundamente distorcida, com o tempo parecendo estender-se indefinidamente, o que intensifica o sofrimento emocional durante momentos de preocupação ou pânico. Essa experiência subjetiva de um tempo dilatado pode fazer com que os indivíduos se sintam presos em um loop contínuo de ansiedade, exacerbando o sofrimento.
Por conseguinte, conhecendo como a ansiedade distorce a percepção do tempo, os profissionais de saúde podem desenvolver intervenções mais eficazes, como terapias focadas em mindfulness e técnicas de gerenciamento de tempo, que ajudam a recalibrar a percepção temporal e reduzir a ansiedade. Além disso, terapias focadas na respiração e relaxamento podem ajudar na redução da hipervigilância e na normalização da percepção do tempo.
Logo, a compreensão da relação entre ansiedade e percepção do tempo é essencial para o desenvolvimento de tratamentos eficazes e pode levar a avanços significativos no tratamento de distúrbios neuropsiquiátricos. Reconhecer e tratar as distorções temporais em contextos clínicos pode melhorar significativamente o bem-estar e a funcionalidade dos indivíduos com ansiedade, enfatizando a importância de abordagens amplas no tratamento de distúrbios psicológicos.
Fontes:
Lu CJ, Goheen J, Wolman A, Lucherini Angeletti L, Arantes-Gonçalves F, Hirjak D, Wolff A, Northoff G. Scale for time and space experience in anxiety (STEA): Phenomenology and its clinical relevance. J Affect Disord. 2024 Aug 1;358:192-204. doi: 10.1016/j.jad.2024.04.099. Epub 2024 May 2. PMID: 38703910.
Teixeira S, Machado S, Paes F, Velasques B, Silva JG, Sanfim AL, Minc D, Anghinah R, Menegaldo LL, Salama M, Cagy M, Nardi AE, Pöppel E, Bao Y, Szelag E, Ribeiro P, Arias-Carrión O. Time perception distortion in neuropsychiatric and neurological disorders. CNS Neurol Disord Drug Targets. 2013 Aug;12(5):567-82. doi: 10.2174/18715273113129990080. PMID: 23844680.
A crescente convergência de estudos em trauma, apego e processamento sensorial tem revelado como essas áreas interligadas influenciam profundamente o desenvolvimento humano e o bem-estar ao longo da vida. Recentemente, pesquisadores como Kerley, Meredith e Harnett (2023) e Joseph et al. (2021) têm ampliado nosso entendimento sobre a complexa interação entre os padrões de apego e a modulação sensorial. Esta matéria tem como objetivo trazer o conhecimento sobre como essas dinâmicas afetam indivíduos com históricos de trauma, visando subsidiar profissionais de saúde com dados para aprimorar suas práticas em avaliação e intervenção. Nossa análise se concentra em como padrões disfuncionais de apego e a modulação sensorial podem moldar a resposta ao trauma, ressaltando a importância de intervenções que integrem essas perspectivas em contextos clínicos. Com isso, pretendemos oferecer diretrizes para avaliações e tratamentos mais efetivos em saúde mental focados na regulação sensorial e na reestruturação do apego, com o intuito de promover recuperação e resiliência em pacientes afetados por experiências traumáticas.
Estudos como os realizados por Kerley, Meredith e Harnett (2023) e Joseph et al. (2021) têm explorado a profundidade e a complexidade dessa relação. Por exemplo, Kerley e colaboradores observaram que, em crianças e adolescentes, uma modulação sensorial eficaz está positivamente associada à segurança no apego. Em contraste, nos adultos, padrões mais extremos de sensibilidade sensorial frequentemente coexistem com insegurança no apego. Essa descoberta sugere que intervenções focadas na regulação sensorial podem ser particularmente benéficas para indivíduos com apego inseguro, proporcionando uma nova direção para tratamentos em saúde mental.
De acordo com Joseph et al. (2021), crianças que enfrentaram eventos traumáticos frequentemente exibem disfunção na modulação sensorial. Esta condição manifesta-se por meio de uma variedade de respostas exacerbadas a estímulos cotidianos. Desta maneira, algumas crianças podem apresentar hiper-responsividade a estímulos comuns como ruídos ou toques leves, resultando em reações de pânico ou agressividade diante de situações que outras crianças poderiam considerar inofensivas. Alternativamente, outras crianças podem desenvolver uma busca sensorial ativa, demonstrando um desejo insaciável por estímulos sensoriais intensos, o que pode representar uma tentativa de autoregulação em resposta ao trauma.
Joseph e colaboradores também destacaram a importância da intervenção de modulação sensorial para crianças que sofreram traumas. Esta abordagem é especialmente relevante, considerando que a experiência inicial do trauma frequentemente ocorre no nível somatossensorial, afetando diretamente a capacidade da criança de regular e organizar suas respostas sensoriais. O estudo aponta que tais intervenções, quando eficazmente combinadas com psicoterapia, são fundamentais e mostram um efeito clínico positivo significativo. Isso ressalta a necessidade de uma avaliação criteriosa das funções sensoriais em crianças vítimas de trauma, enfatizando a importância de integrar estratégias terapêuticas que abordem tanto os aspectos psicológicos quanto sensoriais do tratamento.
Além disso, pesquisas sobre a sensibilidade sensorial em pais, como o estudo de Branjerdporn et al. (2019), indicam que pais com maior insegurança de apego tendem a apresentar maior sensibilidade sensorial e adotar estilos parentais mais autoritários ou permissivos. A sensibilidade sensorial dos pais pode mediar a relação entre o apego adulto e os estilos parentais, sugerindo que uma compreensão mais profunda das características sensoriais dos pais pode melhorar as estratégias de apoio ao relacionamento entre pais e filhos.
Em relação ao estilo parental, por exemplo, pais com alta sensibilidade sensorial podem se sentir facilmente sobrecarregados por estímulos rotineiros, o que pode resultar em respostas mais extremas em situações de estresse parental. Assim, um pai que é altamente sensível ao ruído pode se sentir mais rapidamente irritado por comportamentos infantis típicos que envolvem barulho, levando a uma resposta mais autoritária para rapidamente controlar o ambiente. Por outro lado, a sensibilidade sensorial também pode conduzir a um estilo parental permissivo, onde o pai evita conflitos ou situações que poderiam gerar sobrecarga sensorial, permitindo comportamentos que de outra forma limitaria. Essa permissividade pode ser uma forma de autoproteção contra o estresse sensorial, mas pode falhar em fornecer aos filhos as estruturas e limites necessários para um desenvolvimento saudável.
Portanto, as conclusões destes estudos sobre as alterações sensoriais em indivíduos com apego inseguro e experiências traumáticas são amplas e profundamente significativas. Essas descobertas sublinham a necessidade de intervenções direcionadas e bem definidas que levem em consideração tanto o processamento sensorial quanto os padrões de apego. Além disso, enfatizam a importância de uma avaliação detalhada das características sensoriais em contextos de trauma e apego. Profissionais de saúde, particularmente terapeutas ocupacionais e psicólogos, são incentivados a incorporar esses dados em suas práticas clínicas, visando proporcionar um tratamento mais integrado e efetivo.
Fontes:
Kerley LJ, Meredith PJ, Harnett PH. The Relationship Between Sensory Processing and Attachment Patterns: A Scoping Review. Can J Occup Ther. 2023.
Joseph RY, Casteleijn D, van der Linde J, Franzsen D. Sensory Modulation Dysfunction in Child Victims of Trauma: a Scoping Review. J Child Adolesc Trauma. 2021.
Branjerdporn G, Meredith P, Strong J, Green M. Sensory sensitivity and its relationship with adult attachment and parenting styles. PLoS One. 2019.
A intervenção musical para indivíduos com autismo é justificada por uma confluência de fatores cognitivos, emocionais e sociais que são fundamentais tanto para o entendimento do autismo quanto para a compreensão da natureza humana em relação a linguagem. Aqui estão as principais razões para justificar tal intervenção:
Ligação para Comunicação e Expressão Emocional: Indivíduos com autismo muitas vezes enfrentam barreiras significativas na comunicação verbal e não verbal, bem como na expressão e compreensão de emoções complexas. A música, por sua natureza emocionalmente rica e com ambiguidade semântica, oferece um meio alternativo e acessível de comunicação que pode transcender empecilhos verbais e facilitar a expressão emocional. Isso é particularmente importante considerando as dificuldades que indivíduos com autismo podem ter em compreender e se relacionar com emoções através de canais convencionais.
Desenvolvimento da Autoconsciência e Identificação: A pesquisa indica que os indivíduos com autismo podem experimentar uma compreensão atípica do 'eu' em relação aos outros, afetando a autorreflexão e a autoconsciência. A música pode desempenhar um papel crítico na facilitação do desenvolvimento da autoconsciência, oferecendo experiências que são compartilhadas emocionalmente mas não dependem exclusivamente de interações verbais. Através de atividades musicais compartilhadas, como canto ou tocando instrumentos em conjunto, indivíduos com autismo podem experimentar uma sensação de conexão e sintonia com os outros, promovendo uma maior compreensão de si mesmos e dos outros.
Regulação Emocional e Sensorial: Muitos indivíduos com autismo experimentam sensibilidades sensoriais que podem afetar a regulação emocional e/ou levar a um potencial auditivo muito propício para a música (ouvido absoluto). A música, com sua capacidade de ser adaptada às necessidades sensoriais individuais, pode ser uma ferramenta importante para a regulação emocional e sensorial. Atividades musicais podem ser ajustadas em termos de volume, ritmo e tipo de som para atender às preferências sensoriais de cada indivíduo, oferecendo uma forma de estímulo que é ao mesmo tempo envolvente e confortável.
Acesso à Interação Social e às Habilidades de Colaboração: Participar de atividades musicais em grupo pode promover habilidades sociais e de colaboração em indivíduos com autismo. Tais atividades exigem escuta ativa, turnos e coordenação com outros, oferecendo oportunidades estruturadas e previsíveis para a interação social. Isso pode ajudar a construir confiança nas interações sociais e promover a inclusão em ambientes de grupo.
Acessibilidade e participação: A música é uma linguagem universal que transcende barreiras culturais, linguísticas e cognitivas. Oferecer atividades musicais como forma de intervenção permite a participação de indivíduos com uma ampla gama de habilidades e preferências, promovendo um ambiente com menores restrições e barreiras onde todos possam se expressar e se conectar com os outros em um nível emocional.
Evidências Empíricas e Teóricas: Existe um corpo crescente de pesquisa que apoia a eficácia da música como uma ferramenta terapêutica para indivíduos com autismo. Estudos têm demonstrado melhorias na comunicação, nas habilidades sociais, na regulação emocional e no comportamento através da participação em atividades musicais.
Portanto, a intervenção musical para indivíduos com autismo não é apenas justificada, mas essencial, dada a sua capacidade de atender a necessidades complexas de maneira acessível, envolvente e emocionalmente significativa.
Fonte: Perlovsky L. Musical emotions: functions, origins, evolution. Phys Life Rev. 2010 Mar;7(1):2-27. doi: 10.1016/j.plrev.2009.11.001. Epub 2009 Nov 6. PMID: 20374916.Parte superior do formulário
A música, descrita por Charles Darwin como uma das capacidades mais misteriosas dotadas ao homem, continua sendo um enigma para cientistas e filósofos. Sua conexão intrínseca com as emoções abre um leque de questionamentos sem respostas definitivas sobre como a música expressa ou cria emoções, a semelhança ou diferença dessas emoções em relação a outras, e qual a sua função. A universalidade da música através das culturas, sem um propósito adaptativo óbvio, apresenta uma peleja para os biólogos evolutivos. Immanuel Kant, ao explorar a epistemologia do belo e do sublime, não conseguiu explicar a música, relegando-a a um papel menor entre as artes por apenas "brincar com os sentidos". Steven Pinker ecoou essa perspectiva, referindo-se à música como "cheesecake auditivo", um subproduto agradável, mas sem propósito, da seleção natural.
Apesar dessas visões, a pesquisa contemporânea tem começado a fundamentar cientificamente o potencial da música, especialmente em relação às suas origens evolutivas e papéis. A hipótese apresentada neste contexto argumenta que a música serve a uma função essencial e concreta na evolução da mente e das culturas humanas. Este papel está intrinsecamente ligado às emoções, onde a música, diferentemente de outras formas de arte, afeta diretamente as emoções sem passar por conceitos-representações. Esta compreensão sugere uma exploração mais aprofundada dos mecanismos neurais envolvidos e uma verificação experimental dessa hipótese.
Ao revisar teorias sobre as emoções musicais e as origens da música, observa-se que a função e a origem da música têm desafiado o pensamento filosófico por milhares de anos, com Aristóteles reconhecendo o potencial da música como um problema não resolvido. Nos últimos vinte anos, as potencialidades anteriormente misteriosas da música começaram a receber uma base científica, integrando pesquisas que fornecem evidências para as origens evolutivas e os papéis da música.
Pitágoras foi um dos primeiros a descrever as harmonias como razões numéricas inteiras das frequências sonoras, vendo uma conexão da música com as esferas celestiais. Ao longo do tempo, a música foi apreciada por sua capacidade de afetar a consciência e mover almas e corpos, com filósofos antigos como Platão vendo a música como harmonizadora da psique humana com a razão. Durante o Renascimento, houve um desenvolvimento importante em direção a uma maior emocionalidade na música, com compositores buscando imitar a fala e expressar paixões da alma, marcando uma era em que a teoria musical não apenas seguiu a prática musical, mas também a influenciou significativamente.
As discussões modernas sobre as emoções musicais buscam desvendar o mistério de suas origens evolutivas, sugerindo que a música, enquanto universal e característica significativa de todas as culturas conhecidas, não serve a um propósito funcional óbvio e incontroverso. Teorias contemporâneas, embora variadas, compartilham a visão de que a música pode ter evoluído juntamente com a linguagem, desempenhando um papel complementar no desenvolvimento cultural e social humano. Essa revisão de teorias e a proposta de hipóteses baseadas em modelos cognitivos e matemáticos da mente sugerem que a música, em sua essência, está profundamente enraizada nas emoções humanas, desempenhando um papel fundamental não apenas como forma de arte, mas como um pilar na evolução da consciência e da cultura humana.
Fonte: Perlovsky L. Musical emotions: functions, origins, evolution. Phys Life Rev. 2010 Mar;7(1):2-27. doi: 10.1016/j.plrev.2009.11.001. Epub 2009 Nov 6. PMID: 20374916.Parte superior do formulário
A prevalência de diagnósticos duplos de Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) varia significativamente na literatura, indo de 50 a 70% em indivíduos com TEA. Essa alta taxa de comorbidade, conforme discutido por Camille Hours e colaboradores em "ASD and ADHD Comorbidity: What Are We Talking About?" (Hours et al., 2022) levanta questões críticas sobre a natureza e o significado de tal diagnóstico duplo. É essencial refletir sobre se os déficits de atenção observados em pacientes com TEA refletem uma dimensão própria deste transtorno — como a atenção conjunta comprometida — ao invés de representarem um déficit de atenção típico do TDAH. De maneira similar, a agitação notada pode advir não apenas dessa limitação na atenção conjunta, mas também de déficits sensoriais variados, ou ainda, ser atribuída a uma inquietação física de natureza distinta da agitação normalmente associada ao TDAH.
Consequentemente, a questão central sobre a prevalência de diagnósticos duplos de TEA e TDAH e o impacto disso na pesquisa clínica é profundamente complexa e ainda cheio de lacunas a serem esclarecidas. A discussão sobre o uso de Metilfenidato (MPH) em indivíduos com TEA, como apontado em diversos estudos (Hernandez et al., 2022; Rodrigues et al., 2021; Stevanovic et al., 2022; Sturman et al., 2017; Ventura et al., 2020) ressaltam uma área significativamente nebulosa no campo da psiquiatria e da neurologia comportamental.
Ao focar, predominantemente, em populações diagnosticadas tanto com TEA quanto com TDAH, os estudos existentes podem inadvertidamente obscurecer a compreensão do efeito do MPH em indivíduos que apresentam exclusivamente sintomas de TEA. Esta sobreposição diagnóstica sugere uma simplificação excessiva das complexidades intrínsecas a cada condição, possivelmente investigando os efeitos do MPH em sintomas de TEA dentro de um quadro presumido de comorbidade com TDAH. Tal abordagem traz à tona a indagação crítica: os efeitos observados do MPH estão sendo direcionados aos sintomas do TDAH, aos sintomas do TEA, ou a uma interseção sintomática não bem compreendida entre os dois transtornos?
A suposição de diagnósticos duplos sem um questionamento rigoroso sobre a viabilidade dessa prevalência elevada pode refletir uma falta de discernimento clínico no desembaraço das interações complexas entre TEA e TDAH. Essa abordagem pode não apenas confundir o entendimento dos efeitos terapêuticos específicos do MPH mas também potencializar um viés no diagnóstico e tratamento de indivíduos com TEA. Essa distinção é essencial, pois os mecanismos subjacentes e as manifestações comportamentais de TEA e TDAH, embora possam apresentar sintomas sobrepostos, emanam de bases neurobiológicas distintas que requerem intervenções direcionadas e personalizadas.
Portanto, para avançar no campo da psiquiatria e oferecer tratamentos mais eficazes e precisos para indivíduos com TEA, é imprescindível uma abordagem mais balanceada que reconheça e diferencie as particularidades de TEA e TDAH. Isso implica na urgente necessidade de novas diretrizes clínicas e estudos de pesquisa focados não só em investigar a frequência de diagnósticos concorrentes, mas também em compreender o efeito do MPH e de outras intervenções sobre os sintomas especificamente relacionados ao TEA, independentemente dos efeitos atribuídos ao TDAH. Estabelecer essa distinção cuidadosa é essencial para aprofundar o entendimento e melhorar a abordagem terapêutica para indivíduos no espectro autista, respeitando a complexidade e unicidade de suas experiências.
A revisão da Cochrane (Sturman et al., 2017), bem como análises sistemáticas e estudos longitudinais subsequente, revelou que o MPH pode melhorar sintomas de hiperatividade e, em alguns casos, de inatenção em indivíduos com TEA. No entanto, esses achados devem ser interpretados com cautela devido à predominância do uso de escalas de heterorrelato por pais e professores na avaliação dos efeitos clínicos, o que introduz um grau de subjetividade e viés potencial nos resultados. Essa metodologia de avaliação limita a precisão dos achados relatados, destacando a necessidade de complementar essas medidas com ferramentas de avaliação objetiva.
E vale novamente ressaltar mais uma vez, como discutido no artigo de Hours e colaboradores (2022), a necessidade de uma reavaliação crítica da alta ocorrência de diagnóstico duplo entre TEA e TDAH. A superposição de sintomas entre estas duas condições, incluindo falhas na atenção inerentes ao TEA por origem sensorial e dificuldades na alocação de atenção conjunta para contextos sociais, sugere uma interseção complexa de características clínicas que pode não necessariamente justificar um diagnóstico duplo.
Em suma, enquanto o MPH mostra promessa como tratamento para sintomas específicos em indivíduos com TEA, a base de evidências permanece limitada, especialmente para aqueles sem suposto TDAH comórbido. A atual prática de diagnóstico duplo e a metodologia predominante de avaliação dos efeitos clínicos exigem uma abordagem mais crítica e refinada para demonstrar o verdadeiro impacto do MPH em TEA sem a comorbidade com o TDAH. As futuras pesquisas deverão abordar essas complexidades com metodologias rigorosas e específicas, visando esclarecer o papel do MPH e outros tratamentos em populações puramente com TEA.
Fontes:
Em uma era dominada pela comunicação digital e pelas mídias sociais, a tendência para a simplificação da linguagem é evidente. O uso de abreviações, emojis e memes na comunicação online pode ser visto como um reflexo da narrativa involutiva apresentada no vídeo. Entretanto, é indispensável questionar o impacto dessa simplificação no desenvolvimento cognitivo, na expressão emocional e na transmissão de cultura. A partir da leitura do artigo "Language and emotions: Emotional Sapir–Whorf hypothesis" de Leonid Perlovsky (2009), entendemos que a complexidade da linguagem não é meramente uma característica arbitrária, mas um veículo para a rica tapeçaria de pensamentos, emoções e valores culturais.
A Linguagem Como Fundação da Experiência Humana
A hipótese emocional de Sapir-Whorf proposta por Perlovsky nos lembra que a linguagem não apenas reflete, mas também molda nossa realidade. A forma como articulamos nossos pensamentos e sentimentos influencia diretamente nossa percepção do mundo e de nós mesmos. Assim, uma evolução (ou involução) da linguagem não se traduz apenas em mudanças na forma de comunicação, mas na própria estrutura de nossa experiência cognitiva e emocional.
Consequentemente, ao relacionar estas ideias com o vídeo, podemos repensar a discussão proposta de uma forma que não implique uma involução, mas reflita sobre como as mudanças na complexidade e na emotividade da linguagem podem influenciar a sociedade e o indivíduo. A especulação do vídeo sobre uma simplificação progressiva da linguagem até um estado pré-linguístico ressalta uma preocupação com a perda potencial de capacidade expressiva e a riqueza emocional que a linguagem complexa permite. Uma vez que, a maneira como expressamos nossos pensamentos e emoções tem um impacto direto em como percebemos o mundo ao nosso redor e nossa própria identidade. Dessa forma, alterações na linguagem vão além de meras modificações nos métodos de comunicação, afetando a essência de nossa vivência cognitiva e emocional.
Portanto, o artigo e o vídeo abordam preocupações complementares sobre a evolução da linguagem: enquanto o vídeo especula sobre uma simplificação futura, o artigo nos leva a considerar como as estruturas emocionais e conceituais presentes na linguagem influenciam o desenvolvimento cognitivo e a construção cultural ao longo do tempo. Esta análise nos permite refletir sobre a importância de preservar a complexidade linguística para sustentar a riqueza cultural, a expressão emocional e o desenvolvimento cognitivo. Ao considerar essas ideias, a discussão se torna não apenas sobre a evolução da linguagem, mas também sobre como valorizamos e preservamos a diversidade linguística e cultural diante das mudanças tecnológicas e sociais.
O Desafio da Educação e do Desenvolvimento Cognitivo
Diante da potencial simplificação da linguagem, emerge o desafio de como a educação pode se adaptar para preservar a capacidade de pensamento crítico, expressão emocional complexa e empatia. O artigo sugere que a interação dinâmica entre a cognição e a linguagem é fundamental para o desenvolvimento humano. Assim, estratégias educacionais que promovam a diversidade linguística e o envolvimento com formas complexas de expressão podem ser essenciais para o desenvolvimento cognitivo pleno.
Portanto, a discussão proposta pelo vídeo, quando vista através das lentes do artigo de Perlovsky, não apenas alerta para os riscos potenciais de uma simplificação linguística, mas também destaca a importância de valorizar e cultivar a complexidade da linguagem. A linguagem é o tecido que tece a experiência humana, moldando nossa cognição, emoções e cultura. Enfrentar o desafio de preservar essa complexidade em um mundo em rápida mudança é fundamental para garantir a riqueza da experiência humana para as gerações futuras. Ao promover o diálogo entre diferentes campos do conhecimento, podemos buscar estratégias para valorizar a diversidade linguística e cultural, garantindo um futuro em que a linguagem continue a ser uma fonte de riqueza e inovação para a humanidade.
Fonte: Perlovsky L. Language and emotions: emotional Sapir-Whorf hypothesis. Neural Netw. 2009 Jul-Aug;22(5-6):518-26. doi: 10.1016/j.neunet.2009.06.034. Epub 2009 Jul 2. PMID: 19616406.
Os dados desempenham um papel fundamental na modulação de procedimentos clínicos e na orientação de intervenções mais focadas na resolução de problemas específicos do paciente. A coleta, análise e aplicação de dados no contexto da saúde possibilitam uma abordagem mais personalizada e eficaz na assistência ao paciente, especialmente em áreas complexas como a neurorreabilitação. Como isso acontece?
PERSONALIZAÇÃO DO TRATAMENTO
✍Avaliação precisa do paciente: Dados detalhados sobre o histórico médico, condições atuais e progresso do paciente permitem que profissionais de saúde ajustem tratamentos com base nas necessidades específicas de cada indivíduo.
✍Predição de estágios: Modelos preditivos, como as Redes Neurais Artificiais (RNAs) discutidas no artigo "Artificial neural networks in neurorehabilitation: A scoping review. NeuroRehabilitation", utilizam grandes conjuntos de dados para prever resultados de neurorreabilitação, possibilitando a personalizar planos de tratamento para maximizar a recuperação funcional.
MELHORIA DA TOMADA DE DECISÃO CLÍNICA
✍Análise de dados complexos: A capacidade das RNAs de processar e aprender com conjuntos de dados complexos e não lineares pode revelar padrões ocultos, fornecendo dados que orientam decisões clínicas mais informadas. Ao fazer isso, as RNAs podem identificar correlações e tendências não óbvias entre variáveis, o que é especialmente útil em campos como a neurorehabilitação, onde os fenômenos estudados são extremamente complexos e multifacetados.
Predizer desfechos de reabilitação: Por exemplo, as RNAs podem analisar dados de pacientes que sofreram lesões cerebrais traumáticas para prever a recuperação funcional, possibilitando intervenções mais direcionadas e personalizadas.
Classificar sintomas ou condições: As RNAs podem distinguir entre diferentes tipos de disfunções motoras ou padrões de marcha em pacientes com doenças neurológicas, como Parkinson ou sequelas de Acidente Vascular Encefálica - AVE, permitindo tratamentos específicos para cada tipo de disfunção.
✍Comparação de tratamentos: dados encontrados sobre a eficácia de diferentes abordagens terapêuticas possíveis aos profissionais de saúde escolherem as intervenções mais eficazes, baseadas em evidências.
FOCO NA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS FUNCIONAIS
✍Identificação de metas terapêuticas: Os dados ajudam a identificar as áreas mais críticas de disfunção para cada paciente, permitindo uma abordagem centrada no paciente que foca nos objetivos funcionais mais relevantes.
✍Monitoramento e ajustes contínuos: A coleta contínua de dados sobre o progresso do paciente permite ajustes no tempo real das intervenções, garantindo que eles permaneçam alinhados com as necessidades em evolução do paciente.
FACILITAÇÃO DA COMUNICAÇÃO E COORDENAÇÃO
✍Compartilhamento de dados entre equipes: Plataformas digitais que armazenam e compartilham dados do paciente facilitam a comunicação e a coordenação entre diferentes profissionais envolvidos na reabilitação, promovendo uma abordagem de cuidado integrada. Claro que, respeitando a lei de acessos a esses dados pelo paciente.
✍Aderência do paciente: Acesso a dados claros sobre seu próprio progresso pode aumentar a aderência e a motivação do paciente, tornando-o um participante ativo em sua própria reabilitação.
AVANÇOS FUTUROS
✍Inovações tecnológicas: O desenvolvimento contínuo de ferramentas de coleta e análise de dados, como wearables e aplicativos móveis, promete aprimorar ainda mais a capacidade dos profissionais de saúde de monitorar e ajustar intervenções em tempo real.
Logo, os dados são o alicerce para a transformação dos cuidados de saúde em um sistema mais personalizado, eficaz e focado no paciente. A integração de análises de dados avançadas, como as fornecidas por RNAs, na prática clínica, não apenas melhora os desfechos clínicos, mas também coloca o paciente no centro do processo de reabilitação, com intervenções adaptadas às suas necessidades funcionais específicas.
A reabilitação de indivíduos com dislexias requer uma abordagem de modulação cognitiva que leve em consideração os mecanismos subjacentes à leitura e as dificuldades específicas enfrentadas por esses leitores. Com base no artigo "Rapid improvement of reading performance in children with dyslexia by altering the reading strategy" de Reinhard Werth, pode-se sintetizar o ponto fundamental para reabilitar indivíduos com dislexias, considerando os aspectos destacados (Werth, 2018):
Fixação Apropriada: É fundamental que o leitor consiga fixar sua atenção no local apropriado dentro de uma palavra ou segmento de palavra que esteja lendo. A capacidade de processar várias letras simultaneamente e a fixação correta em um ponto específico de uma palavra ou segmento são indispensáveis para uma leitura eficaz. Werth encontrou que quando palavras foram apresentadas de maneira que pudessem ser lidas corretamente, até mesmo sujeitos com dislexias graves foram capazes de ler 95% das palavras corretamente, após ajustar onde e como fixavam sua atenção nas palavras. Importante destacar que a capacidade mínima e máxima de processamento de letras simultâneas entre os participantes com dislexia variou significativamente, refletindo a diversidade nas habilidades de leitura individual. Alguns participantes conseguiram reconhecer apenas três letras simultaneamente dentro de um intervalo de fixação de até 400 milissegundos. Em contraste, outros foram capazes de processar até seis letras simultaneamente em um intervalo de tempo de fixação de 250 milissegundos. Isso demonstra uma variação considerável nas capacidades visuais e cognitivas dos leitores com dislexia, indicando a necessidade de estratégias de leitura personalizadas que levem em consideração a capacidade individual de reconhecimento de letras simultâneas.
Capacidade de Processamento Simultâneo: A intervenção deve levar em conta se a capacidade do leitor de processar simultaneamente várias letras está reduzida. A terapia de leitura desenvolvida por Werth compensava os déficits neurais existentes, permitindo que leitores disléxicos aprendessem a não tentar reconhecer mais letras simultaneamente do que eram capazes, ajustando assim o tamanho do segmento de palavra que tentavam ler. Quando os participantes do estudo conseguiram ler apenas quantidades menores de letras e a palavra apresentada continha mais letras do que eles eram capazes de processar simultaneamente, a estratégia adotada foi a de segmentar as palavras em partes menores, que se adequassem à capacidade de reconhecimento simultâneo de letras do participante. Isso significava dividir palavras mais longas em segmentos ou grupos de letras que não excedessem o número máximo de letras que o leitor podia processar de uma vez. Essa abordagem permitia aos leitores com dislexia concentrar-se em reconhecer e pronunciar corretamente segmentos menores de palavras antes de avançar para os segmentos subsequentes, facilitando assim a leitura precisa de palavras inteiras.
Amplitude das Sacadas: As amplitudes das sacadas (movimentos rápidos dos olhos entre pontos de fixação) devem corresponder ao número de letras que podem ser reconhecidas simultaneamente pelo leitor. A estratégia de leitura compensatória ensinada garantia que os movimentos oculares estivessem alinhados com a capacidade de reconhecimento simultâneo de letras do leitor, melhorando a eficiência da leitura.
Tempo de Fixação: O leitor precisa de um tempo de fixação adequado para processar um determinado número de letras. Werth demonstrou que ajustar o tempo de fixação para garantir que fosse suficiente para o reconhecimento das letras dentro de um segmento de palavra específico era uma parte vital da estratégia de leitura compensatória. Isso era conseguido por meio de sinais visuais, como marcas de fixação que indicavam o ponto dentro de cada segmento de palavra ao qual o olhar deveria ser direcionado, e sinais acústicos que sinalizavam o momento apropriado para começar a pronunciar o segmento após um período de fixação suficiente. Essas estratégias eram parte de uma abordagem compensatória que visava adaptar o processo de leitura às capacidades individuais dos leitores com dislexia, melhorando significativamente seu desempenho de leitura.
Tempo desde o Início da Fixação até a Pronúncia: A intervenção deve considerar quanto tempo o leitor precisa desde o início da fixação até conseguir pronunciar uma palavra corretamente. O ajuste dos tempos de fixação e início da pronúncia para corresponder às necessidades individuais do leitor foi essencial para reduzir os erros de leitura.
Em resumo, a chave para a reabilitação eficaz de indivíduos com dislexias, conforme apresentado no artigo, envolve ensinar uma estratégia de leitura compensatória que ajuste a fixação dos olhos, a capacidade de processamento simultâneo de letras, as amplitudes das sacadas, o tempo de fixação e o tempo necessário para começar a pronunciar palavras. Essa abordagem não apenas compensa as limitações neurológicas, mas também aproveita as capacidades existentes do leitor para melhorar imediatamente o desempenho na leitura.
Fonte:
Werth, R. (2018). Rapid improvement of reading performance in children with dyslexia by altering the reading strategy: A novel approach to diagnoses and therapy of reading deficiencies. Restorative Neurology and Neuroscience, 36(6), 679–691. https://doi.org/10.3233/RNN-180829
As dificuldades enfrentadas pela neurorreabilitação são significativas e muitas vezes impedem o alcance de sua plena eficácia na recuperação de indivíduos com condições neurológicas, sejam essas resultantes de lesões cerebrais ou desordens neurodesenvolvimentais. Idealmente, o tratamento contaria com uma ampla disponibilidade de recursos, tecnologia avançada e o apoio de equipes clínicas especializadas no manejo de deficiências cognitivas. No entanto, a realidade se depara com a falta de profissionais qualificados, recursos limitados, custos elevados e a complexidade dos processos de avaliação e adaptação funcional, essenciais para a neurorreabilitação. Frequentemente, isso leva a programas de reabilitação que não conseguem atingir a intensidade, personalização e abrangência necessárias, gerando insatisfação entre pacientes e profissionais. Como consequência, há uma tendência a limitar as intervenções aos aspectos motores, deixando de lado a atenção necessária aos outros domínios cognitivos que também podem estar comprometidos nos processos de neurorreabilitação.
Um estudo da James Lind Alliance (JLA) destaca, por exemplo, a negligência no tratamento de disfunções cognitivas em pacientes com Acidente Vascular Encefálico (AVE) crônico, indicando uma preferência desproporcional pela recuperação da mobilidade em detrimento da cognição, apesar da importância desta última para a qualidade de vida e independência do paciente. Essa lacuna sublinha a necessidade urgente de desenvolver e implementar intervenções focadas nos impactos funcionais de danos e disfunções cognitivas, utilizando ferramentas adaptáveis e acessíveis tanto em ambientes clínicos quanto domiciliares.
Para avançar na superação desses obstáculos em neurorreabilitação cognitiva, é essencial a inovação e colaboração entre o setor de pesquisa, profissionais de saúde e tecnologia, incorporando tecnologias assistivas como aplicativos móveis para modulação cognitiva personalizada e realidade virtual para aprimoramento cognitivo de maneira integrada. Essas tecnologias, alinhadas aos princípios da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), promovem uma visão holística que valoriza a interação do indivíduo com seu ambiente, participação social e autonomia.
Ao reverter a abordagem tradicional, que se concentra exclusivamente nas deficiências, e iniciar a neurorreabilitação pela eliminação de barreiras ambientais e pessoais, facilita-se a participação social do indivíduo e potencializa-se seu desempenho cognitivo. Esse enfoque promove uma reabilitação mais eficiente, preparando o terreno para tratar as restrições remanescentes e limitações em atividades diárias, e finalmente, recuperar as deficiências possíveis dentro das limitações neurológicas e técnicas da condição de saúde do paciente.
A sequência proposta de remoção de barreiras, mitigação de restrições, abordagem de limitações e restauração de deficiências reflete uma estratégia centrada no paciente e holística, evidenciando a interdependência dessas fases para maximizar os resultados da reabilitação. Ao adotar essa abordagem, profissionais podem fornecer uma reabilitação mais efetiva, ajudando os indivíduos na sua funcionalidade. A implementação de estratégias compensatórias e tecnologias assistivas desde o início é uma prática que equilibra entre adaptações imediatas e metas de longo prazo, destacando a complexidade e a necessidade de uma abordagem multifacetada em neurorreabilitação.
A integração das diretrizes propostas por Viergever et al., (2010) para a definição de prioridades em pesquisa na saúde pode direcionar a neurorreabilitação para um processo mais estruturado, inclusivo e transparente, enfatizando a importância de um planejamento abrangente e ações pós-priorização para direcionar os esforços de pesquisa para áreas de maior necessidade e impacto potencial.
Avançar apesar dos entraves na neurorreabilitação reflete não apenas um progresso profissional, mas também uma causa mais ampla, representando uma vitória para pacientes e sociedade. A dedicação à melhoria contínua neste campo espelha o compromisso fundamental da medicina em restaurar, adaptar e compensar funcionalidades, mantendo viva a esperança de superar barreiras e aprimorar a vida daqueles afetados por condições neurológicas duradouras.
Fonte:
Viergever, R. F., Olifson, S., Ghaffar, A., & Terry, R. F. (2010). A checklist for health research priority setting: nine common themes of good practice. Health Research Policy and Systems, 8(1), 36. https://doi.org/10.1186/1478-4505-8-36
Para começar a responder "Como, onde e por que a atenção funciona em nossos cérebros?", é fundamental fazer uma leitura atenta do artigo de Stephen Grossberg da Universidade de Boston, intitulado "Attention: Multiple types, brain resonances, psychological functions, and conscious states", uma obra fundamental da literatura científica. Uma vez que este breve texto busca apenas inspirá-los a fazer leitura do artigo completo.
A atenção é um aspecto essencial da cognição humana, vital para o aprendizado e a realização de tarefas complexas. Se fosse um neurotransmissor, a atenção agiria tanto como glutamato quanto como GABA no processamento cognitivo. A atenção permeia todos os domínios cognitivos, desde a percepção pós-ativação sensorial numa filtragem bottom-up, até a um agrupamento horizontal e correspondência atenta de alvos ambiental e interno (atenção encoberta) em uma ativação top-down. Sua versatilidade em todos os domínios cognitivos, incluindo os emocionais, a torna um domínio essencial de modulação na cognição humana, especialmente em processos de reabilitação. Sem compreender sua essência, é difícil otimizar os recursos na prática clínica, em qualquer etapa, para remediar déficits cognitivos em condições neurológicas e neuropsiquiátricas.
O cérebro humano evoluiu para alcançar adaptação e funcionalidade comportamental em ambientes em constante mudança, com a atenção desempenhando um papel central nesta adaptação. A capacidade de manter a atenção em objetivos por longos períodos é crucial para a adaptação em várias áreas da vida. Desde a infância, somos instruídos a "prestar atenção" para adquirir conhecimento e habilidades. Este processo continua ao longo da vida, abrangendo atividades cotidianas e desempenhos de alto nível em esportes ou artes. Assim, entender como a atenção opera em nossos cérebros e sua aplicação na reabilitação cognitiva é vital.
No centro desta compreensão está a Teoria da Ressonância Adaptativa (ART), que detalha os processos cognitivos e neurais subjacentes. A ART mostra que a atenção é uma propriedade emergente de interações complexas entre milhões de neurônios, integrando-se a outros processos cerebrais como percepção, memória e consciência. A teoria explica como nossos cérebros aprendem a observar, reconhecer e prever objetos e eventos em contextos dinâmicos, destacando a importância da atenção para a adaptação e a funcionalidade comportamental.
A ART aborda o dilema estabilidade-plasticidade, essencial para o aprendizado ao longo da vida sem esquecimento catastrófico. Logo, a atenção ajuda a estabilizar memórias aprendidas e facilita a rápida assimilação de novas informações, crucial para pacientes em reabilitação cognitiva. Um aspecto fundamental da ART são as múltiplas ressonâncias que suportam a atenção, o aprendizado e a consciência. Estas ressonâncias sincronizam e amplificam a resposta do sistema a padrões de características críticas, facilitando o reconhecimento consciente e diferentes tipos de percepção. Este entendimento é crucial na reabilitação cognitiva, pois cada tipo de ressonância ativa formas específicas de atenção e aprendizagem top-down, influenciando diretamente como processamos e integramos informações.
A interação entre atenção ao objeto e atenção espacial é outro ponto crucial na reabilitação cognitiva. No mundo real, estas duas formas de atenção frequentemente se entrelaçam, afetando como planejamos e reagimos a estímulos em ambientes complexos. Esta interação é vital para a capacidade de um indivíduo se concentrar em tarefas específicas, um componente central na recuperação e fortalecimento de capacidades cognitivas após lesões cerebrais ou em condições neurodegenerativas.
Além disso, a ideia de computação complementar, um conceito chave na ART, destaca como diferentes regiões cerebrais e processos cognitivos operam de maneira complementar. Isso sugere que a atenção não funciona isoladamente, mas em conjunto com outros processos cognitivos e regiões cerebrais, fornecendo uma abordagem mais holística à reabilitação cognitiva. Entender como esses processos se complementam pode conduzir a intervenções mais eficazes que visam múltiplos aspectos da cognição simultaneamente.
Resumindo, a atenção é muito mais do que um mero ato de foco; é uma função cerebral complexa e multifacetada que desempenha um papel essencial em todos os domínios da cognição humana. Para profissionais de saúde, especialmente aqueles em neurorreabilitação, uma compreensão profunda da atenção, conforme explicada pela ART e pelos processos CLEARS (Consciência, Aprendizagem, Expectativa, Atenção, Ressonância e Sincronia), é essencial para desenvolver estratégias terapêuticas mais eficazes. Esta compreensão não só promove uma recuperação mais rápida e abrangente para pacientes, mas também abre novos caminhos para tratamento e melhoria da qualidade de vida em diversas condições neurológicas. E o mais importante, a atenção é um domínio cognitivo para ser modelado por todos os profissionais que atuam na neurorreabilitação, além de neuropsicológicos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, pedagogos clínicos, educadores físicos, etc.
Portanto, recomendamos a leitura do artigo fundamental para entender a engenharia da atenção no funcionamento da cognição humana, disponível em: Attention: Multiple types, brain resonances, psychological functions, and conscious states .
A cognição motora, crucial na reabilitação neurológica e no tratamento de transtornos neuropsiquiátricos, enfoca como os processos cognitivos, dos mais simples aos mais complexos, interagem com o movimento e o comportamento. Esta interação, que inclui mecanismos como "modelos internos" e "simulação", é fundamental para um cuidado abrangente e eficaz de pacientes com lesões ou transtornos neurológicos.
Harvey PD (2019) ressalta uma hierarquia nos processos cognitivos, variando de percepções sensoriais a funções executivas complexas. Esta organização não é apenas estrutural, mas funcional, indicando que funções cognitivas superiores podem influenciar as mais básicas. Isso destaca a importância de uma reabilitação que integra funções motoras e cognitivas básicas e complexas.
A relação entre percepção e ação, explorada por William James e Roger Sperry, mostra que a percepção é tanto um precursor quanto um resultado da ação. Melhorias na percepção sensorial podem, portanto, facilitar a ação motora e vice-versa, um aspecto vital no desenvolvimento de tratamentos.
A Teoria da Codificação Comum, de Wolfgang Prinz, propõe que percepção e ação compartilham códigos e estruturas neurais, sugerindo que a reabilitação motora pode influenciar a percepção. Tratamentos para danos neurológicos devem, portanto, considerar essa sobreposição, abordando tanto a cognição (processos básicos e complexos) quanto a motricidade. Isso é particularmente relevante em casos como a negligência espacial pós-AVE, onde o diagnóstico preciso de déficits perceptivos visuoespaciais e atencionais é crucial para a reabilitação motora eficaz.
O papel do cerebelo na cognição motora, crucial na previsão dos resultados do movimento e na interpretação de seus significados, oferece uma nova visão de sua função na coordenação motora e cognição. Estratégias de reabilitação focadas no cerebelo podem, assim, melhorar significativamente a cognição motora.
Contudo, a área de cognição motora, conforme discutido por Gentsch et al. (2016), é sujeita a debates. Modelos como a "cognição de ação fundamentada" ajudam a entender a complexa relação entre controle motor, percepção e cognição, sugerindo a necessidade de uma abordagem integrada e baseada em evidências.
Em suma, a cognição motora é um campo essencial para a prática clínica na saúde neurológica. Compreender a inter-relação entre processos cognitivos básicos e superiores e a motricidade é vital para desenvolver estratégias de reabilitação eficazes e personalizadas. Profissionais da saúde devem incorporar esse conhecimento em sua prática, promovendo uma abordagem mais holística e eficiente no tratamento de pacientes com danos neurológicos e transtornos neuropsiquiátricos.
Observação: A cognição abrange uma série de processos que envolvem a entrada, a elaboração e a saída. Neste contexto, a 'entrada' diz respeito aos processos sensoriais, perceptivos e atencionais básicos, enquanto a 'elaboração' se refere aos aspectos mais avançados, como o funcionamento executivo e o controle cognitivo. Já a 'saída' está relacionada à motricidade e ao comportamento.
Fontes:
Harvey PD. Domains of cognition and their assessment . Dialogues Clin Neurosci. 2019 Sep;21(3):227-237. doi: 10.31887/DCNS.2019.21.3/pharvey. PMID: 31749647; PMCID: PMC6829170.
Fuentes, C. T., & Bastian, A. J. (2007). “Motor cognition” - what is it and is the cerebellum involved? Cerebellum (London, England), 6(3), 232–236. https://doi.org/10.1080/14734220701329268.
Gentsch A, Weber A, Synofzik M, Vosgerau G, Schütz-Bosbach S. Towards a common framework of grounded action cognition: Relating motor control, perception and cognition. Cognition. 2016 Jan;146:81-9. doi: 10.1016/j.cognition.2015.09.010. Epub 2015 Sep 24. PMID: 26407337.
Prinz, W., & Sanders, A. F. (Eds.). (2012). Cognition and Motor Processes. Springer.
Na complexa arena da neurorreabilitação, a importância de uma abordagem multidisciplinar não pode ser subestimada. Tal como numa orquestra onde a harmonia musical é obtida através da contribuição sincronizada de diversos instrumentos, a recuperação de pacientes com lesões ou disfunções neurológicas exige a colaboração afinada de vários profissionais de áreas diferentes. Neste cenário, o médico atua como o maestro, orquestrando as intervenções de profissionais como neuropsicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, educadores físicos, nutricionistas, psicopedagogos clínicos e fonoaudiólogos, cada um trazendo sua expertise única para a mesa de tratamento.
A neuropsicologia, por exemplo, oferece insights cruciais sobre como as lesões cerebrais afetam a cognição e o comportamento, propondo intervenções que visam melhorar a funcionalidade diária do paciente. Por outro lado, a fisioterapia concentra-se na recuperação da mobilidade e do equilíbrio, habilidades essenciais para a independência física. A terapia ocupacional, com seu foco no autocuidado e nas atividades diárias e instrumentais, ajuda os pacientes a recuperar a confiança e a autonomia, enquanto a fonoaudiologia desempenha um papel fundamental na reabilitação da comunicação expressiva e compreensiva por meio da fala, audição e da deglutição, aspectos vitais para a interação social e a nutrição.
O ponto crucial desta abordagem integrada é que, embora cada especialidade tenha seu foco específico, todas elas compartilham um objetivo comum: melhorar a qualidade de vida do paciente. Esta sinergia entre essas áreas da saúde permite uma abordagem mais holística da recuperação, considerando não apenas os aspectos físicos da lesão neurológica e disfunções neuropsiquiátricas, mas também suas repercussões cognitivas, emocionais e sociais.
Além disso, essa colaboração multidisciplinar reflete a complexidade inerente do cérebro humano e de seu processo de recuperação. Assim como uma peça musical complexa não pode ser executada por um único instrumento, o tratamento de condições neurológicas complexas não pode ser efetivamente realizado por uma única especialidade. Cada profissional da saúde traz uma peça vital para o quebra-cabeça, contribuindo para uma visão mais completa e um tratamento mais eficaz.
Portanto, é essencial que os profissionais de neurorreabilitação reconheçam e valorizem a importância de uma abordagem colaborativa. Ao trabalharem juntos, eles não apenas ampliam suas próprias perspectivas e habilidades, mas, o mais importante, contribuem para uma recuperação mais eficiente e abrangente dos pacientes. Assim como um maestro coordena os músicos para criar uma sinfonia harmoniosa, os médicos e outros profissionais de saúde devem trabalhar em conjunto para orquestrar uma recuperação que aborde todos os aspectos das necessidades adaptativas do paciente.
Fonte:
Martínez-Pernía D. Experiential Neurorehabilitation: A Neurological Therapy Based on the Enactive Paradigm. Front Psychol. 2020 May 15;11:924. doi: 10.3389/fpsyg.2020.00924. PMID: 32499741; PMCID: PMC7242721.
A neurorreabilitação, um campo em constante evolução nas ciências da saúde, tem se estabelecido como um pilar fundamental no tratamento de pacientes com lesões cerebrais e doenças mentais. Este campo transcende a simples recuperação física como vemos com mais ênfase na prática clínica, abraçando uma abordagem holística que inclui a reabilitação cognitiva e social. Essa evolução reflete uma compreensão mais profunda das complexidades do cérebro humano e das necessidades dos pacientes, alinhando-se à visão de que estamos no limiar de uma revolução no diagnóstico e tratamento de doenças mentais.
Historicamente focada na recuperação física, a neurorreabilitação sofreu uma transformação significativa com o advento do paradigma cognitivo. Este avanço teórico e prático é a base para entender os distúrbios cognitivos de uma maneira mais integrada, considerando as implicações biopsicossociais das lesões cerebrais. Esta mudança paradigmática é um reflexo da crença de que estamos aos poucos transformando radicalmente o diagnóstico e tratamento de doenças mentais (neurológicas e neuropsiquiátricas), conforme apontado por White em 2011. Ele sugere que estamos revertendo a falta de grandes progressos na contenção de doenças e mortes associadas nos últimos 100 anos.
Dentro desse quadro, dois modelos principais orientam a neurorreabilitação. O primeiro, inspirado na neuropsicologia cognitiva, compara a mente a um software, enfatizando o processamento e a manipulação de informações. O segundo, derivado da neurociência cognitiva, foca nas alterações no processamento da informação cerebral. Ambos os modelos têm sido fundamentais para avançar nosso entendimento e tratamento de lesões cerebrais e transtornos cognitivos. No entanto, eles também enfrentam críticas por possivelmente limitarem a compreensão das experiências individuais dos pacientes.
Para os profissionais da saúde, é vital reconhecer a importância dessa "revolução" mencionada por White. A neurorreabilitação não está apenas tratando funções perdidas; está restaurando a qualidade de vida e reabilitando indivíduos para que eles possam retomar suas vidas pessoais e sociais da forma mais plena possível. A adoção de abordagens terapêuticas mais personalizadas com avaliação cognitiva detalhada de linha de base e a integração de diferentes disciplinas são cruciais para este progresso. A pesquisa contínua e a aplicação de novos métodos terapêuticos prometem não apenas avanços científicos significativos, mas também uma nova esperança e possibilidades para aqueles afetados por lesões cerebrais e doenças mentais.
Neste cenário, a neurorreabilitação se posiciona singularmente para maximizar os benefícios desta revolução, atuando como um catalisador para transformar o tratamento e o cuidado de doenças mentais e lesões cerebrais. Com o comprometimento contínuo em inovação e pesquisa, a neurorreabilitação está destinada a desempenhar um papel crucial na melhoria da saúde e bem-estar dos pacientes em todo o mundo.
Fonte:
White, C. (2011). Brain circuitry model for mental illness will transform management, NIH mental health director says. Br. Med. J. 343:d5581. doi: 10.1136/bmj.d5581
No campo avançado da neurociência, a ampliação do conceito de neuroplasticidade - a habilidade do cérebro de se reestruturar em resposta a experiências novas - está impactando as abordagens dos profissionais de saúde na prevenção e tratamento de condições cognitivas, como as demências. Um estudo essencial de Joyce Shaffer, da Universidade de Washington, que eu considero uma leitura obrigatória para profissionais de neurorreabilitação, ressalta cinco fatores cruciais para a saúde cerebral: inovação, desafio, exercício físico, nutrição adequada e amor. Esses componentes são vitais não apenas para preservar a cognição, mas também atuam como elementos preventivos contra doenças neurodegenerativas, ao minimizar riscos modificáveis associados às demências, por exemplo.
Na essência do conceito, a neuroplasticidade pode ser classificada em dois tipos: positiva e negativa. A neuroplasticidade positiva refere-se às mudanças cerebrais benéficas que ocorrem como resultado de aprendizagem, exercícios, e outras experiências enriquecedoras. Este tipo de plasticidade é responsável por melhorar as funções cognitivas, ajudar na recuperação de lesões cerebrais, e até mesmo retardar o declínio cognitivo relacionado à idade. Por outro lado, a neuroplasticidade negativa ocorre quando as mudanças no cérebro levam a resultados prejudiciais, como quando a exposição a estresse crônico, trauma, comportamentos disfuncionais ou substâncias nocivas resulta em perda de sinapses ou diminuição da função cerebral. Essa forma de plasticidade pode contribuir para vários problemas de saúde mental, como ansiedade, depressão e certos transtornos cognitivos. Portanto, entender tanto a neuroplasticidade positiva quanto a negativa é crucial para desenvolver abordagens terapêuticas eficazes e promover a saúde cerebral.
Consequentemente, o estudo de Joyce Shaffer destaca a relevância de estar sempre aberto esse elemento fundamental que envolve a exploração de novas experiências e desafios. No âmbito clínico, isso se traduz na adoção de atividades ou tarefas deliberadamente planejadas para impulsionar os pacientes a deixarem sua zona de conforto (inercia cognitiva) e promover um aprendizado contínuo. Isso ressoa com o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) de Vygotsky, onde identificar o ponto de desafio para a realização de uma tarefa é um aspecto chave na cognição. Na vida cotidiana, a mesma ideia pode ser aplicada através de ações como aprender um novo idioma, resolver problemas complexos ou se dedicar a hobbies criativos. Estes são exemplos de como ativar novas redes de aprendizado pode ser efetivamente incorporado no dia a dia. Tais atividades não apenas mantêm a cognição ativa em novas tarefas, mas também podem contribuir para atrasar o surgimento de sintomas de condições como as demências.
Outro pilar fundamental para a saúde cerebral, conforme identificado no estudo, é o exercício físico regular. Atividades aeróbicas como caminhadas, natação ou ciclismo não só fortalecem o corpo, mas também têm um impacto positivo significativo na memória e nas funções cognitivas, promovendo até mesmo a neurogênese. Assim, o exercício se torna uma ferramenta fundamental na luta contra o declínio cognitivo, sendo um aspecto crucial nos planos de tratamento e prevenção.
A dieta também desempenha um papel crucial na manutenção da saúde cerebral. O estudo de Shaffer enfatiza a necessidade de uma alimentação balanceada, rica em ômega-3 e antioxidantes, e pobre em gorduras saturadas e açúcares. Dietas como a mediterrânea, que enfatizam o consumo de frutas, vegetais, peixes e grãos integrais, são particularmente benéficas. Esta abordagem dietética não apenas sustenta a saúde física geral, mas também está ligada a uma menor incidência de problemas cognitivos e demências.
Além da dieta Mediterrânea, o artigo cita a "Dieta de Okinawa" como uma abordagem nutricional benéfica para a saúde cerebral. Originária da ilha de Okinawa no Japão, esta dieta é conhecida por seu papel na longevidade excepcional dos habitantes locais. Caracterizada por um consumo reduzido de calorias e rica em vegetais, frutas, peixes, e uma baixa ingestão de carne vermelha, a Dieta de Okinawa proporciona um equilíbrio de nutrientes que favorece a saúde cerebral. Esta dieta é especialmente rica em antioxidantes e ácidos graxos poli-insaturados, contribuindo para a redução da inflamação no corpo e no cérebro, e promovendo a neuroproteção. A prática do "hara hachi bu" - comer até estar 80% saciado - também é um componente central desta dieta, ajudando a manter um peso corporal saudável e reduzindo o risco de doenças crônicas, ambas condições importantes para a saúde cognitiva e a prevenção de doenças neurodegenerativas.
Ademais, o sono desempenha um papel crucial na cognição e na saúde geral do cérebro, funcionando como um período vital para a restauração e fortalecimento das funções cerebrais. Durante o sono, ocorrem processos essenciais de consolidação da memória e limpeza de toxinas acumuladas, que são críticos para manter a neuroplasticidade e a saúde neural. A privação de sono, por sua vez, pode levar a uma série de efeitos negativos, incluindo inflamação no cérebro, deficiências na aprendizagem e na memória, e um declínio geral na função cognitiva. Estudos têm demonstrado que a falta de sono adequado está associada à atrofia do hipocampo e a um aumento nos marcadores de estresse neural, impactando negativamente a neurogênese e potencialmente acelerando processos neurodegenerativos. Portanto, garantir um sono de qualidade e suficiente é uma estratégia vital para preservar e melhorar a cognição, apoiando a saúde cerebral a longo prazo.
Por fim, mas não menos importante, o amor e as relações sociais são identificados como componentes essenciais para a saúde do cérebro. Interagir com familiares e amigos, participar de atividades sociais e manter relacionamentos significativos podem reduzir o estresse, melhorar o bem-estar emocional e manter a cognição ativa. O apoio social e emocional não apenas enriquece a vida, mas também atua como um escudo contra o declínio cognitivo.
Em suma, o estudo de Shaffer reforça a necessidade de uma abordagem integrada e holística na saúde cognitiva. Ao incorporar estes cinco elementos - novidade, desafio, exercício, dieta e amor - na prática clínica, os profissionais de saúde têm a oportunidade de melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes e criar barreiras contra o declínio cognitivo.
Fonte:
Shaffer J. Neuroplasticity and Clinical Practice: Building Brain Power for Health. Front Psychol. 2016 Jul 26;7:1118. doi: 10.3389/fpsyg.2016.01118. PMID: 27507957; PMCID: PMC4960264.
Por Maria Ramim
A atenção é um componente crucial do funcionamento cognitivo, e seu papel na vida cotidiana é inegável. Para aqueles que enfrentam dificuldades específicas, como indivíduos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), mas não só esses, pois todos os transtornos e lesões afetam de algum modo o domínio atencional desenvolver abordagens de modulação tornam-se imperativos. É nesse contexto que surge o programa de modulação de atenção AixTent, uma ferramenta computadorizada baseada em estudos clínicos sólidos.
O Entendimento da Complexidade da Atenção:
O AixTent foi concebido com base em pesquisas que apontam para a complexidade da atenção, indicando que diferentes aspectos desse processo podem ser abordados seletivamente.
A Estrutura do Programa:
O AixTent compreende procedimentos de treinamento específicos como jogos simples de computador, adaptativos ao nível de dificuldade do participante. Este aspecto é crucial, pois permite a personalização do treinamento de acordo com o desempenho individual. O programa abrange quatro componentes distintos da atenção: alerta, vigilância, atenção seletiva e atenção dividida.
Treinamento Específico para Necessidades Individuais:
No âmbito do estudo, crianças com TDAH foram alocadas para a intervenção da AixTent, focando em treinamentos de vigilância, atenção seletiva e atenção dividida. Essa abordagem abrangente foi adotada, uma vez que a análise comparativa do desempenho dessas crianças em relação aos dados normativos indicou deficiências em pelo menos duas dessas funções.
Cada sessão de treinamento consiste em 15 minutos dedicados a cada uma das funções de atenção. Os procedimentos específicos utilizados foram "FLIESSBAND" para vigilância, "FOTO" para atenção seletiva e "COCKPIT" para atenção dividida. A adaptabilidade do programa se manifesta por meio da progressão ou regressão automática nos níveis de dificuldade, com base no desempenho do participante.
Resultados e Eficácia Comprovada:
Os fundamentos do AixTent foram estabelecidos em estudos anteriores que demonstraram sua eficácia em pacientes com lesões cerebrais unilaterais de origem vascular (Sturm et al., 1994, 2001). A ausência de treinamento de alerta se justifica pela falta de diferenciação significativa entre crianças e adultos com TDAH e participantes saudáveis em termos de alerta tônico ou fásico (Tucha et al., 2006a, b, c, 2008, 2009).
Olhando para o Futuro da Pesquisa:
É importante notar que, neste estágio, o programa AixTent não inclui um treinamento de flexibilidade (mudança do foco de atenção), devido à falta de um procedimento de treinamento adequado e com eficácia comprovada. Este destaque aponta para a constante evolução e pesquisa na busca por abordagens cada vez mais abrangentes.
Em resumo, o programa de modulação de atenção AixTent surge como uma ferramenta alternativa na promoção de treinamento personalizado para pessoas com prejuízos no domínio atencional, destacando a importância de abordagens específicas e adaptáveis na busca por melhorias significativas na atenção e cognição.
Limitações para clínica e as adaptações e Alternativas:
Mesmo com avanços importantes em pesquisa, o programa ainda não está disponível para comercialização na prática clínica. O que encontramos disponíveis são adaptações possíveis, com base nos princípios metodológicos de intervenção, que abrangem desde a dosagem terapêutica até os critérios teóricos da modulação cognitiva no domínio atencional. Uma alternativa comercializada no Brasil, que compartilha princípios teóricos semelhantes, é o Pay Attention. Este cenário destaca a necessidade contínua de desenvolvimentos de produtos voltados para a prática clínica e a exploração de opções viáveis que consigam a assistir o paciente fora dos campos de pesquisa.
Fontes:
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Por Maria Ramim
No campo da neurorreabilitação, uma abordagem que ganhou destaque nos últimos anos é o uso da música como uma ferramenta terapêutica eficaz e adaptativa para pacientes que enfrentam condições clínicas relacionadas ao envelhecimento, como o Acidente Vascular Encefálico (AVE) e as demências. Este avanço está alinhado com as descobertas apresentadas no artigo de referência de Särkämö et al. publicado " Cognitive, emotional, and neural benefits of musical leisure activities in aging and neurological rehabilitation: A critical review".
De acordo com o artigo de Särkämö et al., a música é uma ferramenta terapêutica importante devido à sua capacidade de envolvimento de funções auditivas, cognitivas, motoras e emocionais nas regiões corticais e subcorticais do cérebro. Além disso, o processamento de estímulos musicais é relativamente preservado durante o processo de envelhecimento e nas fases iniciais das demências, tornando-a um aliado no fortalecimento de habilidades na reabilitação de doenças neurológicas associadas ao envelhecimento, como o AVE e a doença de Alzheimer.
Um dos principais benefícios destacados pelo estudo é que a música pode ser uma ferramenta terapêutica agradável e eficaz no cuidado diário dos pacientes. Além das sessões formais de musicoterapia, as atividades de lazer musical, como ouvir música e cantar, podem ser realizadas pelos pacientes individualmente ou com o auxílio de um cuidador. Essas atividades não apenas modulam as funções cognitivas associadas ao processamento sensorial de um estímulos com conteúdo de codificação implícita, mas também promovem o bem-estar psicológico durante o processo de envelhecimento e reabilitação neurológica.
A importância desse enfoque baseado na música é ainda mais significativa à medida que a população envelhece e a incidência e prevalência de condições neurológicas relacionadas ao envelhecimento aumentam rapidamente. A música fornece uma forma não invasiva e agradável de melhorar a qualidade de vida dos pacientes, ajudando a mitigar os sintomas associados a essas condições, como déficits cognitivos, depressão e ansiedade.
Além disso, a música pode ser personalizada para atender às necessidades individuais de cada paciente. Isso significa que as escolhas musicais podem ser adaptadas com base nas preferências e no histórico musical de cada pessoa, tornando o tratamento mais eficaz e envolvente.
Em resumo, o estudo de Särkämö et al. destaca a música como uma ferramenta promissora na neurorreabilitação de doenças neurológicas relacionadas ao envelhecimento. À medida que continuamos a enfrentar as dificuldades atreladas ao envelhecimento da população e o aumento nas incidências dessas condições, é fundamental que exploremos e aproveitemos o poder da música para melhorar a qualidade de vida e o bem-estar dos pacientes. A música não é apenas uma terapia, mas também uma fonte de alegria e conexão para aqueles que enfrentam desafios neurológicos, oferecendo esperança e alívio em sua jornada de reabilitação. A música ameniza as barreiras pessoais e mitiga algumas incapacidades na execução de tarefas e restrições na participação.
Fonte:
Särkämö T. Cognitive, emotional, and neural benefits of musical leisure activities in aging and neurological rehabilitation: A critical review. Ann Phys Rehabil Med. 2018 Nov;61(6):414-418. doi: 10.1016/j.rehab.2017.03.006. Epub 2017 Apr 29. PMID: 28461128.
A necessidade de se fazer uma crítica ao excesso de diagnósticos duplos nos transtornos neuropsiquiátricos e neurológicos é uma preocupação que merece nossa atenção. No campo da saúde mental, muitas vezes nos deparamos com agrupamentos de sintomas que fazem interseção com outros transtornos clínicos, levando à emissão de diagnósticos duplos que podem, muitas vezes, ser equivocados. Esse cenário, apesar de fundamentado em trabalhos publicados, carece de uma análise crítica mais aprofundada.
É crucial compreender que a comorbidade clínica, embora exista, é rara e geralmente associada a quadros graves. O que observamos, entretanto, é uma tendência alarmante dos profissionais de saúde em rotular pacientes com diagnósticos duplos de forma casual, sem considerar adequadamente a semiologia das doenças. Esse problema está relacionado, em parte, à falta de preparo na leitura crítica de artigos científicos, uma habilidade essencial para uma prática clínica responsável, mas que muitas vezes é negligenciada na formação dos estudantes da área da saúde.
Uma solução para enfrentar esse desafio é promover o incentivo à leitura crítica de artigos científicos desde a formação acadêmica. Recomendamos o livro "Medicina Baseada em Evidências: Seguindo os Passos de Sherlock Holmes" de Jorgen Nordenstrom, como um guia acessível para aprender a analisar trabalhos científicos de forma crítica.
Um exemplo do problema em questão é o excesso de diagnósticos duplos associados ao Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), muitas vezes em conjunto com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Deficiência Intelectual (DI). Essas associações, quando examinadas de forma mais aprofundada, parecem casuais e até mesmo estranhas.
Por exemplo, o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) é definido pelo DSM-V por meio de obsessões e compulsões. As obsessões são pensamentos, impulsos ou imagens repetitivas, indesejadas e intrusivas que geralmente causam ansiedade ou angústia. As compulsões são atos mentais repetitivos ou evidentes que visam prevenir ou reduzir a ansiedade ou angústia. No entanto, já testemunhamos clínicos diagnosticando TEA como TOC devido a comportamentos repetitivos, ou confundindo as compulsões com Transtornos de Humor (TH). Consequentemente, é essencial considerar que esses sintomas não são exclusivos do TOC, e há pelo menos 14 outros transtornos comuns a esses critérios, como o Transtorno Dismórfico Corporal, a Tricotilomania, a Ansiedade Generalizada, os Transtornos Depressivos e de Dependência, entre outros, conforme o próprio DSM-5 nos alerta.
Portanto, é urgente que estabeleçamos uma abordagem mais precisa na definição de distúrbios clínicos, baseada em níveis cognitivos, fisiológicos, moleculares e genéticos, em vez de depender exclusivamente da fenotipagem. O National Institute of Mental Health (NIMH) divulgou seus próprios Critérios de Domínio de Pesquisa, conhecidos como RDoC, com base nessa visão. Uma abordagem promissora para esclarecer a neurobiologia dos transtornos psiquiátricos é identificar estruturas internas entre os agentes causadores de baixo nível e as manifestações fenotípicas, conhecidas como endofenótipos.
Um endofenótipo deve possuir várias características, como associação com a doença, hereditariedade e presença em familiares não afetados com maior frequência do que na população em geral. Essa abordagem pode ajudar a evitar diagnósticos duplos imprecisos e contribuir para uma prática clínica mais embasada em evidências com melhor grau de recomendações para o diagnóstico.
Em resumo, a revisão crítica dos diagnósticos duplos é um passo crucial para a melhoria da qualidade dos cuidados de saúde mental. Devemos promover a formação adequada dos profissionais de saúde, cultivar a leitura crítica de artigos científicos e adotar uma abordagem mais fundamentada em evidências, focando em características cognitivas, fisiológicas e genéticas para uma compreensão mais precisa dos transtornos neuropsiquiátricos e neurológicos. Só assim poderemos proporcionar um tratamento mais eficaz e individualizado para aqueles que mais precisam.
Por Maria Ramim
O Modelo de Resposta à Intervenção (RTI) surge como uma alternativa diagnóstica paradigmática para situações clínicas complexas, onde os dados clínicos disponíveis não oferecem clareza suficiente para uma indicação diagnóstica precisa.
O RTI é um modelo que vai além do escopo dos Distúrbios Específicos de Aprendizagem, revelando-se especificações únicas em casos em que a avaliação inicial produz dados conflitantes que dificultam a identificação de uma condição clínica específica. Nestes cenários, torna-se imperativo adotar uma abordagem mais ampla e longitudinal, vinculando cuidadosamente a avaliação aos dados resultantes da intervenção.
Neste sentido o paciente deve se submeter a um período de intervenção meticulosamente direcionado ao quadro clínico mais provável conforme os indicadores aferidos na avaliação de linha de base, com a elaboração de relatórios que documentam o padrão comportamental manifestado ao longo desse período de intervenção. Simultaneamente, é prioritário que seja incluída uma avaliação de acompanhamento, visando aferir a resposta clínica aos aspectos sensoriais, cognitivos comportamentais (incluindo motores) envolvidos durante a intervenção. Posteriormente, após esse período de avaliação terapêutica, deve ser feito uma nova avaliação que considere os dados recomendados de todo o processo intervencionista, envolvendo a formulação de um diagnóstico clínico definitivo com dados mais robusto colhidos numa linha temporal e respaldado pela resposta ou não a intervenção direcionada.
É importante ressaltar que o Modelo RTI, habilmente adaptado ao contexto clínico, sinergiza processos de avaliação e intervenção clínica em um programa meticulosamente estruturado, ancorado nos déficits identificados em uma avaliação de linha de base. Este programa se desenvolve em três horizontes temporais distintos: a curto prazo, engloba estratégias destinadas a superar as deficiências percepcionais, atencionais (esboçados conforme a primeira unidade funcional de Luria) e na regulação das respostas motoras mais simples; a médio prazo, concentra-se nos desafios identificados na fase de elaboração (esboçados conforme a segunda unidade funcional de Luria) e atrelados às respostas motoras mais complexas; por fim, a longo prazo, concentra-se nas respostas que apresentam especificidades na saída (esboçados conforme a terceira unidade funcional de Luria) - em que resíduos motores simples e complexos ainda exibem déficits persistentes, bem como no âmbito comportamental.
Além disso, ao longo desse percurso terapêutico, devem ser abordadas estratégias destinadas a suprimir barreiras ambientais e pessoais na etapa de curto-prazo, mitigar restrições e limitações na participação e realização de tarefas na etapa de médio-prazo, e, em longo-prazo, reverter resquícios adaptativos associados a deficiências cognitivas.
A perspectiva do Modelo RTI, adaptada à clínica, coaduna-se com uma abordagem embasada em evidências, amalgamando a sabedoria diagnóstica e terapêutica em um todo coerente e progressivo, com vistas à melhoria da qualidade de vida do paciente.
A cognição humana, em sua intrincada e imponente natureza, frequentemente se mostra suscetível a perturbações, que podem ser originadas tanto por lesões, como um Acidente Vascular Encefálico - AVE, quanto por disfunções relacionadas ao neurodesenvolvimento. Nesses cenários de abalo do funcionamento adaptativo cerebral, a Reabilitação Cognitiva (RC) emerge como uma modalidade terapêutica que percorre minuciosamente o trajeto da modulação funcional e adaptativa das capacidades cognitivas.
Numa analogia muito rudimentar, o cérebro pode ser equiparado a um computador de alta complexidade, sujeito, no entanto, a "bugs" que interferem nos processos de raciocínio, memória e em outros domínios cognitivos. Nesses casos de disfunções ou lesões que afetam a cognição, a RC desempenha o papel de um habilidoso programador, dedicado a eliminar tais obstáculos com precisão cirúrgica, restaurando e/ou compensando o funcionamento adaptativo e funcional do aparato cognitivo. Ela realiza tal façanha por meio de métodos, técnicas, tarefas e estímulos altamente especializados, os quais reconfiguram o padrão funcional num viés positivo de neuroplasticidade (aprendizagem), otimizando-o para um desempenho mais eficiente, funcional e adaptativo.
O processo de reabilitação cognitiva é, por si só, um artefato intrincado de modulação da cognição. Sua instauração inicia-se com uma meticulosa avaliação conduzida por um terapeuta especializado, que identifica as áreas da cognição afetadas e a extensão de seu impacto na vida do indivíduo. Por exemplo, um paciente com dificuldades de retenção de informações será submetido a um plano terapêutico desenhado especificamente para modular os processos de memória, seguindo rigorosamente a hierarquia do processamento de informações, a teria motora da cognição e a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), visando garantir uma codificação eficaz para subsequente recuperação e reconhecimento. No estágio inicial, as tarefas prescritas são relativamente simples, porém, à medida que o indivíduo progride, são apresentados desafios progressivamente mais complexos.
No âmbito da RC, destacam-se dois enfoques primordiais: a reabilitação restaurativa, que busca recuperar funções cognitivas perdidas por meio de recursos cognitivos altamente especializados, e a reabilitação compensatória, que auxilia o indivíduo a desenvolver estratégias que contornem suas limitações, frequentemente fazendo uso de tecnologias assistivas.
Convém notar que a RC não se revela como uma panaceia instantânea, mas sim como um processo que demanda tempo, paciência e prática, assemelhando-se, por analogia, ao treinamento de um atleta de elite preparando-se para uma competição olímpica. No entanto, diversas narrativas de êxito clínico testemunham sua eficácia, resgatando habilidades que, a princípio, pareciam irremediavelmente perdidas.
A eficácia da RC constitui um tema de controvérsia científica, com estudos oscilando entre resultados positivos e perspectivas divergentes, variando conforme a natureza da lesão cerebral e a condição específica do paciente. Contudo, quando aplicada com rigor metodológico, a RC possui o potencial de engendrar um impacto substancial na recuperação e no aprimoramento das capacidades cognitivas.
A concepção moderna da RC remonta às teorias de Luria, que postulou que a recuperação funcional ocorre por meio do estabelecimento de novas conexões, adquiridas durante exercícios de modelagem cognitiva (neuroplasticidade positiva). Atualmente, a RC engloba uma abordagem pautada na minuciosa avaliação das funções cognitivas, no estabelecimento de metas terapêuticas e na aplicação de tarefas específicas voltadas para a otimização da função cognitiva.
Em síntese, a reabilitação cognitiva se erige como uma luz-guia para aqueles que enfrentam desafios cognitivos. À medida que esse campo prossegue seu desenvolvimento e aprimoramento, novas descobertas e abordagens estão delineando diretrizes clínicas que exploram o potencial inexplorado da cognição humana. Nesse esforço conjunto entre terapeutas e pacientes, a RC assume um papel de destaque como ferramenta crucial para modificar a intricada natureza da cognição humana e resgatar a funcionalidade cognitiva que outrora parecia perdida de forma irremediável.
Fontes:
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“Os déficits de atenção são fenótipos comportamentais chave de um número considerável de doenças neurológicas e genéticas caracterizadas por transtornos psiquiátricos complexos. Será que o erro reside em confundir tais déficits com os traços de atenção únicos e muito diferentes do autismo? Em outras palavras, as características de atenção dos transtornos são ignoradas através de uma generalização errônea?”
“As atenções observadas no TEA são intrínsecas a esse transtorno e não podem ser simplesmente atribuídas ao TDAH comórbido!”
Por Maria Ramim
Uma análise aprofundada do artigo "ASD and ADHD Comorbidity: What Are We Talking About?" publicado em 2022 na Frontiers Psychiatry revela questões prementes no campo da saúde mental: o diagnóstico duplo incorreto de Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Este equívoco, embora frequente, não considera as notáveis diferenças que existem entre esses dois distúrbios clínicos.
É incontestável que há uma sobreposição de sintomas entre TEA e TDAH, incluindo até mesmo a disfunção sensorial, que, apesar de não ser o foco do artigo em questão quanto a argumentação, tem sido objeto de estudos independentes. No entanto, compartilhar alguns sintomas não justifica uma conclusão precipitada de diagnóstico duplo. Como o senso comum nos lembra, "nem tudo que tem bigode é gato", mas nem sempre isso se aplica a prática clínica, infelizmente.
Os estudos que indicam altas prevalências de comorbidade entre esses distúrbios podem, em parte, ser influenciados por um "preconceito" teórico pouco fundamentado, que abriga uma variedade de paradigmas experimentais que podem estar medindo diferentes fenômenos. De qualquer forma, o autismo e o TDAH têm características distintas e, também, sobrepostas em quatro domínios neurocognitivos: processamento de atenção, monitoramento de desempenho, processamento facial e processamento sensorial.
No entanto, é crucial destacar que as especificidades das atenções observadas no TEA são intrínsecas a esse transtorno e não podem ser simplesmente atribuídas ao TDAH comórbido. Por exemplo, no TEA, a atenção sustentada e seletiva é notavelmente mais intensa, assim como a busca visual, embora esta última reflita mais a qualidade do processamento perceptivo do que a atenção em si. Além disso, a capacidade de direcionar a atenção para estímulos sociais é deficiente em pacientes com TEA.
A atenção conjunta, uma habilidade social importante, também parece estar ausente em indivíduos com TEA, contribuindo para dificuldades na comunicação social. A disfunção amigdalar desempenha um papel fundamental na interação entre processamento sensorial e atenção no TEA, modulando como os eventos emocionais são percebidos. Portanto, entender os mecanismos neurais por trás das atenções é essencial para uma avaliação precisa.
Além disso, a hiper-reatividade sensorial, característica do TEA, está associada a uma atenção superseletiva e superfocada, comportamentos perseverantes e estereotipados, e excelentes capacidades de memória, mas também a déficits sociais significativos. Essa atenção excessiva, mas estereotipada, pode ser confundida com desatenção típica do TDAH.
A agitação psicomotora no TEA, por sua vez, parece relacionar-se a sistemas de excitação atípicos e à hiperatividade dopaminérgica, com efeitos diferentes dos observados no TDAH. Essas complexidades neurocognitivas desafiam a generalização simplista de diagnóstico duplo.
Ao abordar a atenção, o TDAH tende a refletir dificuldades em detectar pistas que permitiriam a antecipação, enquanto o TEA está mais diretamente relacionado a uma capacidade perceptiva elevada e orientação menos flexível para novos estímulos. A inibição prejudicada, característica fisiopatológica central do TDAH, não foi estudada em pacientes com TEA, indicando uma diferença fundamental entre os dois transtornos.
A motivação também desempenha um papel crucial na atenção conjunta no TEA, e a avaliação precoce desses processos pode ser vital para o diagnóstico diferencial.
Em resumo, embora o TEA e o TDAH compartilhem alguns sintomas, suas especificidades de atenção e as complexidades neurocognitivas que as acompanham não podem ser subestimadas. Portanto, o diagnóstico de comorbidade deve ser abordado com extrema cautela, levando em consideração uma análise abrangente do quadro clínico. A complexidade envolvida na diferenciação entre TEA e TDAH enfatiza a urgência de desenvolver instrumentos clínicos e eletrofisiológicos mais refinados, a fim de realizar avaliações neuropsicológicas mais precisas. Isso é essencial para evitar a prática de rotular tantos gatos simplesmente com base em seus bigodes.
Em vez de uma abordagem simplista, devemos adotar uma visão mais ampla e crítica, considerando os múltiplos aspectos que diferenciam esses transtornos e explorando as nuances que a pesquisa científica continua a revelar. Afinal, não podemos permitir que a sobreposição de sintomas obscureça a singularidade e a complexidade dessas condições.
Fonte:
Hours C, Recasens C, Baleyte JM. ASD and ADHD Comorbidity: What Are We Talking About? Front Psychiatry. 2022 Feb 28;13:837424. doi: 10.3389/fpsyt.2022.837424. PMID: 35295773; PMCID: PMC8918663.
Por Maria Ramim
A aprendizagem de uma criança pode ser afetada por diversos fatores, e é importante considerar tanto as características intrínsecas da criança quanto o ambiente ao seu redor. No caso de crianças com Distúrbio Específico de Linguagem (DEL) de tipo compensado, várias influências podem estar contribuindo para suas dificuldades acadêmicas e emocionais.
Primeiramente, é essencial destacar que crianças com DEL de tipo compensado enfrentam desafios específicos no desempenho educacional. O DEL é um distúrbio linguístico heterogêneo que afeta a compreensão e expressão da linguagem. No caso do DEL de tipo compensado, as crianças possuem a habilidade de implementar estratégias para mitigar os impactos de suas dificuldades linguísticas, tornando os déficits menos evidentes em termos de manifestações clínicas.
É importante esclarecer o conceito de "tipo compensado," que se refere à capacidade das crianças de lidar de forma adaptativa com suas dificuldades linguísticas. No entanto, essa compensação pode não ser suficiente para superar todos os obstáculos, e é aqui que os desafios surgem.
Pesquisas indicam que crianças com DEL de tipo compensado frequentemente enfrentam desafios na consciência pragmática, que envolve a interpretação eficiente do conteúdo pragmático da linguagem. Isso pode levar a sobrecarga de recursos cognitivos e demanda excessiva de memória, afetando o desempenho acadêmico.
Além disso, essas crianças também podem apresentar dificuldades na compreensão de leitura, especialmente no que diz respeito ao vocabulário receptivo e à compreensão de histórias. Essas limitações linguísticas podem ser atenuadas por um vocabulário sólido de tipo expressivo, mas ainda podem se refletir em sua capacidade de produzir frases faladas de forma ágil e flexível.
No contexto do DEL de tipo compensado, as dificuldades em associar os sons das palavras com suas representações escritas podem levar a problemas na expressão oral. No entanto, é importante ressalvar mais uma vez que o vocabulário oral/expressivo dessas crianças pode ser preservado, indicando que elas podem estar compensando suas dificuldades de forma verbal, mas enfrentam desafios na compreensão e produção escrita.
Essas dificuldades linguísticas não se limitam ao aspecto acadêmico; elas têm repercussões na esfera emocional das crianças. Muitas vezes, crianças com DEL de tipo compensado podem desenvolver transtornos emocionais ainda mais graves, como ansiedade generalizada e estados depressivos, devido à tentativa de compensar suas dificuldades linguísticas de forma disfuncional, sobrecarregando o sistema emocional.
É comum que essas crianças enfrentem desafios na regulação emocional e comportamental, e suas ansiedades e inseguranças são sintomas dessas dificuldades emocionais relacionadas à linguagem.
Para abordar eficazmente as dificuldades das crianças com DEL de tipo compensado, é crucial adotar uma abordagem multidisciplinar. Isso inclui intervenções específicas para melhorar a consciência fonêmica e o vocabulário receptivo, juntamente com suporte emocional para lidar com a ansiedade e a insegurança. Somente assim essas crianças poderão superar as barreiras pessoais e ambientais que afetam seu desempenho escolar e emocional.
Em resumo, o DEL de tipo compensado é um desafio complexo que afeta não apenas a linguagem, mas também a emocionalidade das crianças. Com uma abordagem integrada e apoio adequado, podemos amenizar as barreiras dessas crianças quanto ao potencial acadêmico e emocional.
Fontes:
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Por Maria Ramim
As deficiências cognitivas que acompanham a demência podem comprometer significativamente a capacidade funcional e a qualidade de vida das pessoas afetadas. Diante dessa realidade, a Reabilitação Cognitiva (RC) emerge como uma abordagem terapeutica para auxiliar indivíduos com demência leve a moderada a lidar com os desafios do dia a dia, promovendo independência e funcionalidade. O recente artigo "Cognitive rehabilitation for people with mild to moderate dementia," publicado por Kudlicka et al. na Cochrane Database of Systematic Reviews, investigou os efeitos da RC nesse contexto, examinando não apenas os impactos para os pacientes, mas também para seus cuidadores.
Historicamente, o campo da RC tem evoluído de maneira notável, encontrando suas raízes no século XIX, com exemplos notáveis como as práticas de reabilitação linguística conduzidas por Broca. Desde então, a RC passou por várias fases de desenvolvimento, moldadas por influências sociais e avanços científicos. Durante as guerras mundiais, pioneiros como Goldstein e Luria estabeleceram bases fundamentais para a prática contemporânea de reabilitação cognitiva.
A abordagem atual da RC envolve avaliação individualizada das funções cognitivas, estabelecimento de metas específicas e aplicação de estímulos cognitivos direcionados para melhorar as capacidades cognitivas afetadas. Dentro desse escopo, há dois enfoques principais: a Reabilitação Restauradora, que visa recuperar funções cognitivas prejudicadas, e a Reabilitação Compensatória, que busca desenvolver estratégias alternativas para contornar as limitações cognitivas.
Os resultados do estudo de Kudlicka et al. são expressivos para pacientes com demência. Ao analisar uma ampla gama de resultados, eles observaram que a RC teve efeitos significativamente positivos no alcance de metas, autoeficácia e funcionalidade geral em pacientes com demência leve a moderada. Além disso, os impactos positivos se estenderam para os parceiros de cuidados, aliviando aspectos ambientais da qualidade de vida. Contudo, deve-se fazer uma ressalva em relação aos efeitos menores, porém adversos, identificados em áreas como a depressão. Esse resultado ressalta a necessidade de uma abordagem flexível e sensível que compreenda as complexas dimensões emocionais enfrentadas por pacientes com demência, incluindo as manifestações neuropsiquiátricas. Esses aspectos exigem uma atenção clínica cuidadosa, visando à melhoria global da qualidade de vida dos pacientes.
Os participantes do estudo, em sua maioria diagnosticados com doença de Alzheimer, demonstraram melhorias consistentes após a aplicação da RC, indicando que essa abordagem pode ser uma peça fundamental no quebra-cabeça do cuidado à demência. Entretanto, algumas questões permanecem em aberto, apontando para a necessidade de mais pesquisas, especialmente aquelas que avaliem processos e identifiquem estratégias para maximizar os benefícios da RC e ampliar seu impacto na funcionalidade e bem-estar.
Em suma, a Reabilitação Cognitiva representa um avanço notável no cuidado de pessoas com demência leve a moderada. Seu potencial para aprimorar as capacidades cognitivas e funcionais, tanto para os pacientes quanto para seus cuidadores, oferece uma esperança renovada em meio aos desafios que a demência impõe. À medida que a pesquisa continua a iluminar os caminhos a seguir, a RC se consolida como uma ferramenta essencial no arsenal de estratégias para enfrentar essa complexa condição.
Fonte: Kudlicka A, Martyr A, Bahar-Fuchs A, Sabates J, Woods B, Clare L. Cognitive rehabilitation for people with mild to moderate dementia. Cochrane Database Syst Rev. 2023 Jun 29;6(6):CD013388. doi: 10.1002/14651858.CD013388.pub2. PMID: 37389428; PMCID: PMC10310315.
Por Maria Ramim
No complexo cenário do Transtorno do Espectro Autista (TEA), uma preocupante disparidade vem à tona: o diagnóstico tardio e negligência no manejo clínico das mulheres afetadas por essa condição. O estudo de Bargiela et. al. (2016) “The Experiences of Late-diagnosed Women with Autism Spectrum Conditions: An Investigation of the Female Autism Phenotype” , focado nas experiências de 14 mulheres jovens com TEA, expôs as dificuldades que elas enfrentam em busca de um diagnóstico preciso e nas estratégias que desenvolvem para se ajustarem a um mundo que muitas vezes parece não entender suas necessidades.
Os quatro principais temas que emergiram desse estudo de julgamentos estereotipados heteropercebidos e autopercebidos quanto ao sofrimento dessas mulheres foram: "Você não é autista", "Fingir ser normal", "Passivo para assertivo" e "Forjando uma identidade como uma jovem mulher com TEA" são reveladores de uma luta diária que muitas mulheres com autismo enfrentam, e destacam a necessidade urgente de uma mudança no paradigma de diagnóstico e tratamento.
O primeiro tema, "Você não é autista", expõe as barreiras significativas que as mulheres enfrentam ao buscar um diagnóstico. Muitas vezes, elas são mal compreendidas ou até mesmo ignoradas por profissionais de saúde. A falta de conhecimento sobre como o autismo pode se manifestar de forma diferente em mulheres, combinada com estereótipos ultrapassados, frequentemente leva a diagnósticos equivocados, como depressão ou ansiedade.
O segundo tema, "Fingir ser normal", revela uma estratégia de adaptação adotada por muitas mulheres com TEA para se encaixarem socialmente. Esse mascaramento de traços autistas é frequentemente desgastante e pode levar à perda de identidade e ao isolamento emocional.
O terceiro tema, "Passivo para assertivo", destaca as dificuldades que as mulheres com autismo enfrentam em relacionamentos devido a uma tendência percebida de passividade. Essa submissão pode levar a situações prejudiciais, e muitas mulheres, com o tempo, aprendem a se tornar mais assertivas, desenvolvendo habilidades para identificar manipulação e estabelecer limites saudáveis.
O último tema, "Forjando uma identidade como uma jovem mulher com TEA", explora como as expectativas sociais baseadas em estereótipos de gênero afetam as mulheres com TEA. Elas frequentemente enfrentam o desafio de se encaixar em papéis tradicionais, enquanto também buscam expressar sua identidade única. Plataformas online fornecem um espaço valioso para compartilhar experiências e estabelecer conexões com outras mulheres com autismo.
Abaixo o detalhamento feitos pelos autores do estudos desses 4 principais temas emergidos dessas 14 mulheres com TEA:
"Você não é autista":
Muitas mulheres jovens com TEA relataram dificuldades para obter um diagnóstico autista, sendo frequentemente ignoradas ou mal compreendidas por profissionais de saúde.
Barreiras comuns para o diagnóstico incluíam o desconhecimento de como o autismo se manifesta em mulheres, estereótipos equivocados e a crença de que elas não podiam ser autistas devido a habilidades sociais superficiais.
Profissionais de saúde, professores e outros também frequentemente diagnosticavam erroneamente problemas diferentes, como depressão, ansiedade ou transtorno de personalidade múltipla, em vez de TEA.
"Fingir ser normal":
Muitas mulheres jovens adotaram estratégias de "mascarar" ou imitar comportamentos neurotípicos para se adaptarem socialmente.
Essas estratégias incluíram o uso de uma "máscara" social, imitação de comportamentos e aprendizado de expressões faciais e linguagem corporal de fontes de mídia.
O mascaramento frequentemente resultou em exaustão, perda de identidade e dificuldade em reconhecer seus próprios sentimentos.
"Passivo para assertivo":
Muitas mulheres relataram experiências de vitimização e dificuldades em relacionamentos devido a sua passividade percebida.
Alguns participantes se sentiam pressionados a agradar aos outros, evitar conflitos e ceder a demandas indesejadas.
Com o tempo, várias mulheres se tornaram mais assertivas e desenvolveram habilidades para identificar manipulação e situações prejudiciais.
"Forjando uma identidade como uma jovem mulher com TEA":
As mulheres jovens enfrentaram expectativas sociais baseadas em estereótipos de gênero, muitas vezes tentando se adequar a papéis tradicionais, mas também rejeitando-os.
A formação de amizades foi desafiadora devido à dificuldade em entender as interações sociais e ao conflito entre as amizades masculinas e femininas.
Plataformas online forneceram um espaço para criar amizades e compartilhar experiências com outras mulheres com TEA.
A identidade muitas vezes foi moldada por interesses especiais, que proporcionaram um senso de propósito, realização e uma forma alternativa de definir a si mesmas.
Além desses temas, os resultados do estudo também enfocam a camuflagem – a prática de imitar comportamentos neurotípicos para se ajustar socialmente. Esse esforço muitas vezes exaustivo para ser "normal" foi um traço marcante nas experiências das participantes. O estudo revelou que essa camuflagem é frequentemente autodidata e inconsciente, destacando a complexidade dessa estratégia de adaptação.
As conclusões da pesquisa também revelaram um diagnóstico tardio como uma preocupação central. A camuflagem, juntamente com características específicas do autismo feminino, contribui para diagnósticos equivocados ou negligência por parte dos profissionais de saúde. Essa falha tem um impacto significativo na saúde mental das mulheres afetadas, exacerbando problemas como a ansiedade.
Apesar dos desafios, o estudo também destacou o impacto positivo que um diagnóstico tardio pode ter. A maioria das participantes sentiu um senso de pertencimento e compreensão após receberem o diagnóstico, contrastando com o estigma negativo que muitas vezes prevalece na ausência de diagnóstico.
Abaixo as 10 características essenciais do TEA feminino, elencadas no estudo:
Camuflagem e esforços para ser "normal": Muitas participantes relataram camuflar seus traços autistas, adotando comportamentos sociais "neurotípicos". Isso envolve esforços conscientes para aprender habilidades sociais e comportar-se de maneira mais típica. Esses esforços foram frequentemente descritos como "colocar uma máscara".
Autodidatismo para camuflagem: O desenvolvimento dessas personas neurotípicas exigiu aprendizado contínuo e autodidata, incluindo observação cuidadosa, leitura de psicologia, imitação de personagens fictícios e aprendizado por tentativa e erro em situações sociais.
Elementos inconscientes de camuflagem: Algumas mulheres copiavam comportamentos sociais sem perceber que estavam imitando, ressaltando a complexidade da camuflagem.
Desvantagens da camuflagem: A camuflagem estava associada a exaustão, confusão sobre identidade pessoal e problemas nas relações interpessoais devido a uma priorização excessiva da adaptação.
Pressões de gênero e papéis tradicionais: Algumas participantes sentiram conflito entre a pressão para se conformar a papéis de gênero tradicionais e o desejo de aceitar sua identidade autista.
Dificuldades na interação com pares femininos: A dificuldade de comunicação social autista dificultava a participação em grupos de pares femininos, considerados mais sutis e menos tolerantes a erros.
Identidade de gênero: Embora ninguém no estudo discordasse do gênero atribuído ao nascimento, o conflito entre identidade feminina e autista sugeria uma possível influência nas taxas elevadas de disforia de gênero.
Diagnóstico tardio: O estudo destacou o preconceito contra o diagnóstico de TEA feminino, indicando que a camuflagem e características específicas do fenótipo feminino contribuem para diagnósticos tardios ou negligência.
Desafios de saúde mental: Mulheres com TEA geralmente enfrentavam problemas de saúde mental, como ansiedade, destacando a importância do diagnóstico para o acesso a apoio adequado.
Impacto positivo do diagnóstico: A maioria das participantes considerou o diagnóstico tardio como benéfico, proporcionando um senso de pertencimento e compreensão, embora a falta de diagnóstico tenha resultado em rotulagem negativa.
Em última análise, esse estudo importante para a aplicação clínica destaca a necessidade urgente de uma abordagem mais sensível e informada sobre gênero no diagnóstico e manejo do TEA. Profissionais de saúde devem ser capacitados para reconhecer as nuances do autismo feminino e oferecer intervenções adequadas. Romper as barreiras que impedem um diagnóstico e tratamento adequados é essencial para garantir a saúde e o bem-estar de mulheres com autismo, permitindo que elas alcancem todo o seu potencial funcional e adaptativo.
Fonte: Bargiela S, Steward R, Mandy W. The Experiences of Late-diagnosed Women with Autism Spectrum Conditions: An Investigation of the Female Autism Phenotype. J Autism Dev Disord. 2016 Oct;46(10):3281-94. doi: 10.1007/s10803-016-2872-8. PMID: 27457364; PMCID: PMC5040731.
O traumatismo cranioencefálico leve (TCE leve) é caracterizado por lesões na cabeça com perda de consciência de até 30 minutos, amnésia pós-traumática e alteração de consciência por até 24 horas, sem evidências visíveis em exames. Recentemente, a atenção para o TCE leve cresceu, devido a lesões esportivas, acidentes e de combate amplamente divulgadas. Contudo, muitos casos passam despercebidos, levando a sintomas não reconhecidos e deficiências crônicas, como déficits de atenção, dores de cabeça, fadiga, estresse pós-traumático e problemas no funcionamento executivo.
Aproximadamente 70% dos casos de lesão cerebral traumática são considerados TCE leve e frequentemente são diagnosticados com base nas queixas do indivíduo, sem evidências objetivas após a lesão. Os sintomas do TCE leve podem ser confundidos com outros estressores, como dor, estresse pós-traumático, ansiedade e depressão.
Muitos indivíduos relatam sintomas cognitivos, físicos e psicológicos meses ou anos após o TCE leve, incluindo comprometimento do funcionamento executivo, afetando a atenção, memória, organização e planejamento. Isso pode impactar negativamente a capacidade de manter um emprego devido aos déficits no funcionamento executivo.
A conscientização das sequelas cognitivas de longo prazo do TCE leve levou ao desenvolvimento de protocolos de treinamento e reabilitação cognitiva. Diversos programas foram criados com foco na melhoria das funções cognitivas e adaptando-se às demandas diárias e funcionais do indivíduo. Alguns desses programas incluem:
1. Treinamento de Memória Estratégica e Raciocínio (SMART)
O treinamento SMART utiliza abordagens estratégicas de cima para baixo para aprimorar o controle cognitivo, como atenção estratégica, raciocínio integrativo e inovação. Seu foco é alcançar funcionalidade adaptativa nas áreas de educação e trabalho, direcionando-se para modular os domínios de atenção e funções executivas. Descobriu-se que o SMART melhora funções executivas, como raciocínio, inibição e habilidades do dia a dia.
2. Treinamento de Gerenciamento de Metas (GMT)
O GMT emprega estratégias metacognitivas para melhorar a capacidade dos pacientes de definir e atingir metas em situações da vida real. O objetivo é alcançar funcionalidade adaptativa em educação e organização de tarefas, com foco na modulação dos domínios de metacognição e funções executivas. Observou-se melhoria na função executiva cognitiva autorelatada na vida diária e melhor desempenho em tarefas que requerem atenção.
3. Terapia de Reabilitação Cognitiva (TRC)
A TRC tem como objetivo permitir que pacientes voltem, dentro do possível, a uma vida normal, por meio da reconstrução ou compensação de funções perdidas. Concentra-se na funcionalidade adaptativa em autoconsciência, com foco na modulação dos domínios de atenção e autocontrole. Embora tenha efeitos ao longo da terapia, não se observou transferência significativa de capacidade para a vida diária.
4. Gerenciamento de Sintomas Cognitivos e Terapia de Reabilitação (CogSMART)
O CogSMART é uma intervenção de treinamento cognitivo compensatório multimodal, enfatizando o aprendizado de hábitos e estratégias compensatórias na memória prospectiva, atenção, aprendizado, memória e funções executivas. Seu foco é a funcionalidade adaptativa em educação (aprendizado) e hábitos, com o objetivo de modular vários domínios cognitivos. Houve reduções significativas nos sintomas pós-concussivos autorrelatados e melhorias na qualidade de vida, memória prospectiva no mundo real e funcionamento diário.
5. Treinamento de Estratégia Cognitiva (CST)
O CST visa ensinar estratégias individuais que permitam aos pacientes contornar seus déficits cognitivos. Concentra-se na funcionalidade adaptativa em educação, estratégias de estilo de vida e rotina, com modulação dos domínios de memória, atenção e funções executivas. A CST mostrou utilidade percebida de estratégias de compensação cognitiva, redução da depressão e melhoria na satisfação com a vida.
6. Treinamento Cognitivo Compensatório
Este treinamento é realizado em grupo, com apresentações didáticas interativas, discussões em sala de aula e atividades práticas. Ele visa melhorar habilidades de gerenciamento de tempo, organização, memória e atenção. Observou-se que os participantes enfrentaram menos dificuldades cognitivas e de memória após esse treinamento, além de um maior uso de estratégias cognitivas. Também facilitou mudanças comportamentais e melhorias subjetivas/objetivas em domínios cognitivos específicos.
7. Autorregulação da Atenção Orientada a Objetivos (OBJETIVOS)
O programa OBJETIVOS é um treinamento de reabilitação cognitiva que foca nas funções de controle executivo, ensinando estratégias de regulação da atenção e gerenciamento de metas baseadas na atenção plena. Ele visa a funcionalidade adaptativa nas áreas de habilidades e objetivos em ambientes da vida real, modulando os domínios de atenção, memória e funções executivas. As melhorias obtidas através deste programa se estendem para a cognição, regulação emocional e funcionamento diário.
8. Treinamento de Atenção
O treinamento de atenção engloba desde tarefas simples, como o uso de flashcards, até atividades mais complexas para aprimorar a atenção complexa e a memória de trabalho. As evidências indicam melhorias significativas nas habilidades de atenção, incluindo atenção focada, sustentada, seletiva, alternada e dividida, bem como na memória.
9. Treinamento de Comunicação Funcional/Cognitiva
Esse programa é voltado para a reabilitação da comunicação, permitindo que os pacientes pratiquem suas habilidades em situações contextuais relevantes para suas vidas. O foco é alcançar funcionalidade adaptativa nas áreas de audição, fala, escrita, leitura, conversação e interação social. Embora não seja um programa completo, enfatiza a importância de medir resultados significativos para a pessoa no contexto da participação social.
10. Programas Específicos para Retorno ao Trabalho (RTW)
As intervenções cognitivas do programa RTW visam aprimorar a memória, reduzir sintomas pós-concussivos e melhorar o funcionamento neuropsicológico. Estratégias cognitivas compensatórias, especialmente aquelas apoiadas por dispositivos de suporte, demonstraram ser mais eficazes para facilitar o retorno ao trabalho e a integração comunitária após o traumatismo cranioencefálico.
11. Técnicas Baseadas em Tecnologia: Realidade Virtual (RV), Treinamento com Inteligência Artificial (AIVTS) e Programas Computadorizados
Logo, os resultados gerais indicam melhorias não apenas nas áreas moduladas, mas também em áreas não diretamente moduladas. Desta forma, a modulação cognitiva pode resultar em aprimoramentos funcionais. Além disso, ressalta-se a importância dos padrões de desempenho, hábitos e rotinas, assim como a necessidade de medir resultados significativos para a pessoa no contexto social. Enfatiza-se que o TCE leve é uma condição crônica, suas sequelas cognitivas podem piorar sem intervenções adequadas ao longo do tempo.
Fonte: Vas A, Luedtke A, Ortiz E, Mackie N, Gonzalez S. Cognitive Rehabilitation: Mild Traumatic Brain Injury and Relevance of OTPF. Occup Ther Int. 2023 May 29;2023:8135592. doi: 10.1155/2023/8135592. PMID: 37283959; PMCID: PMC10241584.
A esquizofrenia é uma doença mental complexa que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Um recente artigo saído do forno e intitulado "Cognitive Rehabilitation for Patients with Schizophrenia: A Narrative Review of Moderating Factors, Strategies, and Outcomes" apresenta dados sobre a neurorreabilitação cognitiva para pacientes que enfrentam os desafios dessa condição. A pesquisa destaca fatores cruciais que influenciam os resultados positivos, estratégias eficazes e as mais recentes evidências em relação aos tratamentos.
Conduzido por Skokou et al. e publicado no periódico "Advances in Experimental Medicine and Biology" em 2023, o estudo fornece uma visão abrangente sobre a reabilitação cognitiva na esquizofrenia, oferecendo informações fundamentais para profissionais de saúde que trabalham com pacientes afetados por essa condição complexa.
O estudo identificou diversos fatores que contribuem para resultados favoráveis na neurorreabilitação cognitiva em pacientes com esquizofrenia. Estes incluem a idade jovem, a fase inicial da doença, o controle dos sintomas de hostilidade e desorganização conceitual, a ausência de sintomas negativos, o manejo dos efeitos colaterais dos medicamentos e a reserva cognitiva e cortical. Além disso, a pesquisa destaca que certos tratamentos medicamentosos, como antipsicóticos atípicos, clozapina, aripiprazol, memantina, modafinil, d-serina e cicloserina, podem ter efeitos pro-cognitivos, trazendo efeitos clínicos positivos para pacientes e sendo um recurso clínico importante para profissionais de saúde.
O estudo também explora o impacto do polimorfismo Val/Val do gene COMT, que parece estar associado a um pior prognóstico para os pacientes. Isso ressalta a importância de considerar fatores genéticos individuais ao desenvolver abordagens de neurorreabilitação.
Em termos de estratégias práticas, diversos modelos de intervenções têm mostrado eficácia na neurorreabilitação cognitiva de pacientes com esquizofrenia. Programas como a Terapia de Aprimoramento Cognitivo (CET), o Treinamento de Adaptação Cognitiva (CAT) e o Software de Terapia Cognitiva RehaCom são mencionados como exemplos. Esses programas utilizam uma variedade de técnicas que vão desde métodos tradicionais com papel e lápis até abordagens assistidas por computador, proporcionando uma ampla gama de opções para personalizar os tratamentos de acordo com as necessidades individuais dos pacientes.
Um aspecto fundamental ressaltado pelo estudo é que os sintomas cognitivos da esquizofrenia estão diretamente ligados ao comprometimento funcional dos pacientes. Portanto, as estratégias de neurorreabilitação cognitiva continuam sendo uma abordagem terapêutica vital, uma vez que são as únicas capazes de promover melhorias cognitivas para pacientes que enfrentam dificuldades em sua recuperação.
Em um panorama onde a esquizofrenia continua a desafiar pacientes, familiares e profissionais de saúde, a pesquisa proporciona critérios norteadores, destacando que avanços significativos estão sendo feitos na neurorreabilitação cognitiva. A colaboração entre a pesquisa científica e a prática clínica desempenha um papel crucial na melhoria da qualidade de vida dos pacientes com esquizofrenia, fornecendo esperança e oportunidades reais de recuperação.
Fonte: Skokou M, Messinis L, Nasios G, Gourzis P, Dardiotis E. Cognitive Rehabilitation for Patients with Schizophrenia: A Narrative Review of Moderating Factors, Strategies, and Outcomes. Adv Exp Med Biol. 2023;1423:193-199. doi: 10.1007/978-3-031-31978-5_17. PMID: 37525044.
A partir de uma publicação no Instagram que traz à tona um debate fundamental sobre o diagnóstico tardio do Transtorno do Espectro Autista (TEA) em mulheres e adolescentes do sexo feminino, esse texto foi escrito para posicionamento sobre alguns pontos interessantes que a publicação incitou. Um médico questionou o uso do termo "leve" no diagnóstico tardio de TEA da paciente citada por ele, aos 17 anos, apesar das dificuldades que ela enfrentava desde os 8 anos, conforme relatado. É certo que essas dificuldades já estivessem presentes antes dessa idade. Entretanto, no início de sua adolescência, quando as interações sociais começaram a ficar mais complexas e a rede de apoio mais escassa, iniciou-se aos 12 anos a busca por tratamento e recebeu os diagnósticos de desatenção e depressão. No entanto, sem resposta clínica, a condição só se agravava, incluindo as tentativas de suicídio cada vez mais frequentes, e só aos 17 anos ela finalmente foi diagnosticada com TEA, de nível leve.
Desta forma, gostaria de ampliar o importante debate e divergir que o problema levantado pelo médico não reside no grau "leve" do autismo, mas sim na falta de um diagnóstico adequado no momento apropriado.
Os termos "leve", "moderado" ou "grave" referem-se apenas ao nível de suporte necessário quanto ao funcionamento adaptativo por parte do indivíduo, com base na premissa da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) da OMS. No entanto, esses termos não refletem em sua classificação os efeitos adversos do TEA, as conhecidas co-ocorrências que podem ser profundamente prejudiciais, tanto para os indivíduos afetados, quanto para o seu contexto, especialmente, quando existe falta de tratamento para o quadro, como foi o caso da paciente citada pelo médico.
A desatenção associada ao TEA muitas vezes é confundida com outros transtornos, como o TDAH, apesar de a literatura científica indicar que a comorbidade entre eles é mínima e numa análise ampliada apresentarem características diagnósticas distintas. O que frequentemente ocorre são erros de diagnóstico. De fato, a desatenção no TEA é resultado de falhas sensoriais nos canais visual, auditivo e sinestésico, bem como nos sistemas proprioceptivo e vestibular (lembrem-se que podem ser hiper-receptivos, hipo-receptivos e/ou mistos), afetando a iniciativa e resposta de atenção compartilhada, a atenção conjunta e a motivação social.
É importante ressaltar que a mera identificação e compartilhamento de sintomas não constituem um diagnóstico. Devemos considerar o quadro clínico por meio de um diagnóstico diferencial, análise comparativa - raciocínio analógico e pensamento crítico (pensamento de ordem superior) direcionado ao diagnóstico, permitindo-nos ir além das diretrizes e acompanhar as atualizações da literatura científica, que são tão necessárias.
A motivação desempenha um papel crucial nos mecanismos subjacentes à atenção conjunta no TEA. A medição dos processos de atenção conjunta, da regulação visual e do desengajamento atencional desde tenra idade pode ajudar no diagnóstico e consequentemente, na intervenção precoce. Estudos demonstram que a motivação modula a regulação visual em relação à atenção conjunta e que o desengajamento atencional também está relacionado a ela.
Infelizmente, é esperado que ocorram co-ocorrências como depressão, ansiedade e tentativas de suicídio no contexto do TEA, em especial na ausência de tratamento, e a literatura científica explica as razões por trás desses quadros associados ao diagnóstico tardio. Histórias como a da paciente desse médico são comuns em consultórios que lidam com a avaliação de TEA tardio, especialmente em relação às mulheres.
O diagnóstico na idade adulta passou a ser reconhecido como uma questão clínica importante devido ao aumento da conscientização sobre o autismo, à ampliação dos critérios diagnósticos e à compreensão do espectro autista. Isso levou à identificação de uma geração de pessoas que anteriormente eram excluídas de um diagnóstico de autismo clássico. Entretanto, muitos clínicos ainda estão míopes sobre essas mudanças.
Ao avaliar e diferenciar diagnósticos, é fundamental considerar comorbidades reais, comportamentos sobrepostos a outros transtornos psiquiátricos e diferenças no fenótipo feminino. As mulheres e meninas autistas apresentam perfis de sintomas distintos em áreas como interação social, comunicação e padrões restritos e repetitivos de comportamento e interesses.
No entanto, erros nos diagnósticos anteriores de meninas e mulheres com TEA são uma questão séria e preocupante. Frequentemente, essas mulheres desenvolvem estratégias de "camuflagem" para ocultar suas dificuldades e se adaptar às normas sociais. Isso pode levar a diagnósticos equivocados, uma vez que os sinais típicos do autismo podem ser menos óbvios nelas.
Além disto, as ferramentas de diagnóstico existentes, incluindo as consideradas como padrão ouro, como a Autism Diagnostic Interview-Revised (ADI-R) e a Autism Diagnostic Observation Schedule (ADOS-2), bem como escalas autoperceptivas e heteroperceptivas, podem não ser suficientemente sensíveis para identificar adequadamente o autismo em mulheres. Essas ferramentas foram desenvolvidas sem levar em consideração as diferenças de sexo, o que pode resultar na subestimação dos sintomas e na exclusão de mulheres autistas.
É crucial que os profissionais de saúde e pesquisadores estejam cientes dessas diferenças clínicas de sexo e sejam sensíveis às manifestações únicas do autismo em mulheres. Isso permitirá um diagnóstico precoce e preciso, garantindo que as mulheres com autismo recebam o apoio e tratamento adequados.
A conscientização sobre as características fenotípicas distintas do autismo no sexo feminino está crescendo, e é necessário que essa compreensão se reflita na prática clínica e nas diretrizes de diagnóstico. A identificação correta das mulheres autistas é crucial para que elas possam acessar os serviços e intervenções necessárias, além de ajudá-las a compreender a si mesmas e encontrar apoio em suas jornadas.
É importante destacar mais uma vez que o problema não está no grau de severidade do TEA, mas sim na ausência de um diagnóstico adequado no momento certo. O diagnóstico tardio pode resultar em sofrimento prolongado, dificuldades emocionais e até mesmo tentativas de suicídio, como mencionado no relato do médico. Portanto, é fundamental que os profissionais de saúde estejam atentos aos sinais de autismo em todas as idades e em ambos os sexos, a fim de garantir que ninguém seja deixado para trás sem o suporte adequado.
A ciência continua a avançar e a nos fornecer uma compreensão mais profunda do autismo, incluindo suas manifestações específicas em mulheres e adolescentes do sexo feminino. À medida que essa compreensão se expande, é nosso dever como profissionais de saúde e pesquisadores atualizar nossas práticas e diretrizes de diagnóstico para garantir que ninguém seja negligenciado ou diagnosticado erroneamente.
Para alcançar isso, é necessário um esforço conjunto de profissionais de saúde, pesquisadores, educadores e sociedade em geral. Devemos promover a educação e a conscientização sobre o autismo, especialmente no que se refere às suas características fenotípicas distintas em mulheres. Também é crucial desenvolver instrumentos de avaliação sensíveis ao sexo, que possam capturar adequadamente os sinais de autismo em mulheres e adolescentes do sexo feminino.
Além disso, é importante ouvir e valorizar as experiências daqueles que vivenciam o autismo em primeira mão, bem como de suas famílias. Suas histórias e perspectivas podem fornecer insights preciosos que nos ajudam a aprimorar nossas práticas e políticas em relação ao diagnóstico e tratamento do autismo.
Acredito firmemente que, com uma abordagem sensível ao sexo e uma maior conscientização, podemos garantir que todas as pessoas, independentemente de seu sexo, recebam o suporte e tratamento adequados desde cedo. Ninguém deve passar por décadas de dificuldades antes de receber um diagnóstico preciso e o apoio necessário.
Vamos trabalhar juntos para construir um futuro em que todas as pessoas com autismo, sejam elas mulheres, homens ou indivíduos de outros gêneros, tenham suas necessidades reconhecidas, sejam compreendidas e possam alcançar seu pleno potencial. Juntos, podemos garantir que ninguém seja deixado para trás no caminho em direção à redução de barreiras oriundas da neurodiversidade e em prol do bem-estar.
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Estudo liderado pelos pesquisadores Gendron e Scott Pletcher, da Universidade de Michigan, demonstrou o impacto do estresse agudo na longevidade de insetos. Os resultados podem trazer insights valiosos para profissionais da área da saúde!
Os pesquisadores identificaram uma população neural específica nas moscas que desempenha um papel fundamental na transmissão de informações sensoriais sobre a presença de indivíduos mortos. Essa percepção afeta diretamente o tempo de vida das moscas.
Componentes da via de sinalização da insulina, como o fator de transcrição Foxo e os peptídeos semelhantes à insulina Dilp3 e Dilp5, também foram identificados como elementos essenciais para mediar os efeitos da percepção da morte na longevidade.
Essas descobertas levantam questões sobre como os circuitos neurais podem interferir nos mecanismos de envelhecimento e fornecem pistas sobre possíveis estratégias terapêuticas. O estudo sugere que intervenções farmacológicas ou psicoterapias para modular os sistemas de recompensa podem retardar o envelhecimento.
Este estudo estimula a busca de uma compreensão mais profunda dos circuitos neurais e dos sistemas de sinalização envolvidos, abrindo caminho para futuras pesquisas na área da longevidade e saúde mental.
Fonte: " Ring neurons in the Drosophila central complex act as a rheostat for sensory modulation of aging" por Christi M. Gendro, Tuhin S. Chakraborty, Cathryn Duran, Thomas Dono,Scott D. Pletcher, PLOS Biology, Universidade de Michigan.
Link para o estudo completo https://journals.plos.org/plosbiology/article?id=10.1371/journal.pbio.3002149
Ser emocionalmente negligenciado pode ser uma experiência devastadora. Esse trauma não apenas pode afetar o senso de identidade do indivíduo, sua capacidade de confiar e construir relacionamentos saudáveis, mas também pode afetar as condições de saúde.
Quantas vezes nos deparamos com uma realidade dicotômica em que o desenvolvimento cognitivo, visto como apartado da emoção, recebe toda a atenção e os recursos necessários, enquanto o desenvolvimento emocional é negligenciado? É triste constatar que a sociedade muitas vezes prioriza o preparo das habilidades para o trabalho, mas esquece-se de oferecer suporte adequado para o crescimento emocional dos indivíduos.
A família, a escola e até mesmo os sistemas de proteção, como as leis e o Estado, estão direcionados ao cumprimento de metas voltadas para a formação de profissionais capacitados. No entanto, deixamos de lado a importância fundamental de promover um ambiente saudável para o desenvolvimento emocional. E é justamente na vida adulta que sentimos o impacto dessa discrepância, quando as exigências emocionais se tornam equânimes, apesar de termos sido preparados de forma desproporcional.
As consequências de curto prazo da negligência são alarmantes. Estudos revelam um aumento no risco de comportamentos de internalização e externalização, além de atrasos no desenvolvimento cognitivo não desacoplado do emocional. Quando uma criança percebe que está sendo negligenciada emocionalmente, ela tem duas vezes mais chances de desenvolver transtornos psiquiátricos aos 15 anos, incluindo o desenvolvimento de Depressão, Transtorno Bipolar, Ansiedade, Transtorno do Pânico, Fobias e Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT).
Adolescentes que tiveram suas emoções negligenciadas na infância são mais propensos a ter baixo desempenho acadêmico, abuso de substâncias, atividade sexual de risco e tentativas de suicídio. Esses dados nos fazem refletir profundamente sobre as consequências que a falta de atenção ao desenvolvimento emocional pode acarretar em nossas vidas e na sociedade como um todo.
É hora de mudarmos essa realidade! É fundamental que a educação e a saúde emocional sejam prioridades desde cedo, integradas ao currículo escolar e oferecidas nos mais diversos contextos sociais. É necessário criar espaços de acolhimento, nos quais as pessoas possam expressar seus sentimentos e aprender a lidar com eles de forma saudável.
Vamos lembrar que somos seres complexos, e que tanto o desenvolvimento cognitivo quanto o emocional são essenciais para uma vida funcional/adaptada e saudável. Precisamos reconhecer que cuidar das nossas emoções é tão importante quanto desenvolver habilidades profissionais.
É necessário que a família, a escola e toda a sociedade se unam nesse propósito. Os pais devem estar atentos às emoções de seus filhos, proporcionando um ambiente seguro e acolhedor para que eles possam expressar seus sentimentos sem medo de julgamento.
As escolas têm um papel fundamental nessa transformação. É imprescindível que incluam programas de educação emocional em seus currículos, proporcionando ferramentas e conhecimentos que ajudem os alunos a entenderem suas emoções, a lidarem com o estresse e a desenvolverem habilidades sociais.
Além disso, é importante que os sistemas de proteção, como os serviços de assistência social e de saúde, também estejam comprometidos em promover o desenvolvimento emocional. Devemos garantir que haja profissionais capacitados e recursos adequados disponíveis para auxiliar aqueles que estão enfrentando dificuldades emocionais.
Ao investirmos no desenvolvimento emocional, estamos investindo em pessoas mais resilientes, capazes de lidar com os desafios da vida de forma saudável e adaptadas as experiências dolorosas que os ciclos existenciais no impõem. Estamos construindo uma sociedade mais empática, onde a compreensão e o apoio mútuo são valorizados.
Não podemos mais negligenciar a importância do desenvolvimento emocional. Precisamos romper com a ideia de que apenas o intelecto é relevante e reconhecer que cuidar de nossas emoções é a base para uma vida plena e satisfatória.
Então, é primordial que tenhamos uma sociedade que valorize a integração entre o cognitivo e o emocional, reconhecendo que ambos são aspectos intrínsecos da nossa cognição e influenciam nossa forma de compreender o mundo e lidar com as situações desafiadoras e muitas delas inevitáveis no ciclo de uma existência.
Vamos falar de sistemas de compensações comportamentais eficientes para disfunções neurológicas e/ou neuropsiquiatrias
Hoje, Joe Biden fará o seu discurso anual no Congresso Americano direcionado especialmente para o seu povo. Verão uma fala fluente e ritmada, mas talvez o que muitos ignoram é que por trás desse discurso tem muita disciplina e técnicas implementadas para compensar a sua gagueira.
No dia 06/02/2023 o The New York Times publicou a matéria escrita por Katie Rogers “Biden’s State of the Union Prep: No acronyms and Tricks to Conquer a Stutter”, que julguei muito instigante quanto ao relato de preparação do Presidente Americano para o discurso que ele fará hoje (07/02/2023) à nação e suas técnicas para amenizar os efeitos da sua gagueira.
Segundo a autora da matéria, Biden é o primeiro presidente moderno com gagueira, problema que ele enfrenta desde a infância e que aumenta em condições de fortes emoções.
A reportagem traz um tom muito humano sobre um dos homens mais poderosos na arena política mundial para lidar com algo tão perturbador na comunicação para várias pessoas que passam por condição análoga.
Faço antes de continuar no tema um parêntese, para melhor entendimento do leitor no foco quanto a fundamentação sobre ser adaptado. É que atualmente, não uso nas minhas explanações o termo inclusão. Motivo? acho que ele trás no seu cerne o estigma da exclusão e não é propositivo no sentido de resolver os problemas que provocam as barreiras ambientais e pessoais, as limitações para a execução de atividades de vida diária e instrumentais em seu sentido mais amplo, bem as restrições de participação e o aspecto estrutural de uma deficiência quanto a função e estrutura do corpo. Portanto, hoje em dia sugiro reportar a Classificação Internacional de Funcionalidade Incapacidade e Saúde – CIF para se referir a ações para tornar a vida dessas pessoas mais funcionais e adaptativas e evitar o termo inclusão que em nada inclui sem tirar as barreiras e incapacidades que vivem pessoas com algum tipo de deficiência.
Então, voltando ao tema, antes de um discurso, Biden faz vários treinos de leituras do discurso. Ele prática na frente de teleprompters atentado para que a sua fala seja compreensiva e clara, ou seja, funcional para quem ouve. Assim, ele passa semanas trabalhando em cada discurso com seus redatores, lendo repetidamente, na íntegra e em voz alta.
Outra estratégia, é marcar o discurso com linhas e travessões sutis que a muito tempo ele usa como sinal para respirar, fazer uma pausa entre suas palavras ou orientar—se numa transição complicada. Essa manobra de controle respiratório para falhas na fluência é sem dúvida muito eficiente. A respiração é o nosso melhor regulador emocional, via componente fisiológico (um dos fatores foco de intervenção para pacientes com gagueira) e, por isto, no caso de pessoas que sofrem de gagueira se mostra eficiente a harmonização do fluxo da fala expressiva.
Segundo assessores, o Presidente Joe Biden não faz anotações para controlar sua gagueira em todos os discursos, mas o fez em alguns de seus discursos mais importantes e em reuniões com líderes estrangeiros no Salão Oval. Ele comentou com um ex-assessor que uma das coisas mais difíceis para um gago executar é fazer comentários em pé – o que venha a ser o seu trabalho diário.
Outras observações de seus assessores, em relação a sua estratégia compensatória, é a de que parece que Biden está marcando uma peça musical enquanto a prepara. E é isto mesmo, suas marcações se tornam notas de partitura para orientar a sua fluência harmônica em conjunto com o controle respiratório, como se fossem um compasso musical, e a tática é extremamente funcional.
Essa sua estratégia compensatória de apropriação do ritmo da fala por meio de um feedback métrico, visto em poemas e músicas por exemplo, se espraia para a imagética mental. Quando Biden ao saber do menino chamado Brayden Harrington que sofria de gagueira em uma campanha de 2020, ele o chamou para conversar nos bastidores e o recomendou um de seus poetas favoritos, o irlandês William Butler Yeats, para ajudá-lo a visualizar a fala, como um poema. Ele também mostrou ao menino as anotações que usou para o discurso do dia. “Depois de cada duas linhas ou palavras, ele desenhava uma linha reta, um espaço em branco entre as palavras, e isso indicava que ele precisa respirar” disse, Brayden em entrevista.
E a frase mais libertadora dita por Biden a essa criança, quando vemos os problemas pelo prisma da funcionalidade é, “Ah cara, suas imperfeições são seus dons”. Biden costuma referenciar a sua luta contra a gagueira como sendo algo do passado, mas costuma sugerir que seus primeiros anos – nos quais ele foi intimidado por colegas e um professor, até que sua mãe interveio – foram experiências formativas para moldar a resiliência e a empatia, a sua marca política, que lhe rendeu a presidência aos 77 anos.
“Aprendi muito tendo que lidar com a gagueira” disse Biden em um discurso de 2016 no Amercian Institute for Stuttering. “Isto me deu uma visão sobre a dor de outras pessoas.”
Como presidente, Biden frequentemente descreve sua gagueira como parte de um passado doloroso ao qual ele não retornará. Afirma “isto não pode definir você. Não vai definir você. Ponto final”, disse essas frases após visualizar numa campanha alguém segurando uma placa que dizia: “obrigado por gaguejar”!
Fonte: https://www.nytimes.com/2023/02/06/us/politics/biden-state-of-the-union-preparation.html
Isolamento social e solidão têm sido relacionados a problemas de saúde. Entretanto, é necessária uma compreensão clara de suas implicações para morbidade e mortalidade para avaliar a extensão do desafio de saúde pública associado e o benefício potencial da intervenção.
De qualquer forma, já temos um arcabouço de evidências consistentes que ligam o isolamento social e a solidão a piores resultados cardiovasculares e de saúde mental. Essa condição de saúde incorpora 18 fatores discretos implicados na associação entre solidão, isolamento social e mortalidade. Esses fatores podem ser categorizados em sociais ou individuais e subcategorizados em biológicos, comportamentais e psicológicos.
A tempo, recomenda-se que os formuladores de políticas devem considerar o isolamento social e a solidão como fatores importantes que afetam a morbidade e a mortalidade devido a seus efeitos na saúde cardiovascular e mental.
As estratégias de prevenção devem, portanto, ser desenvolvidas nos setores público e privado, usando uma abordagem baseada em ativos com desenvolvimento de intervenções mais holísticas, visando muitos dos fatores interdependentes que contribuem para resultados ruins para pessoas solitárias e socialmente isoladas.
Decerto, a amizade pode ser um fator importante no bem-estar, enquanto a solidão e o isolamento social – condições distintas, mas relacionadas – podem estar associados a um risco aumentado de condições como depressão e ansiedade ou doenças cardíacas e acidente vascular cerebral – AVE.
Portanto, como incluimos diretrizes e recomendações para a quantidade de sono que temos e o quão fisicamente ativos somos, ter uma quantidade de amigos é relevante para a saúde, algo entre três e seis amigos íntimos pode ser o ponto ideal. Entretanto, sua personalidade e as características de sua vida vão fazer a diferença, nesses números.
Fontes:
Leigh-Hunt N, Bagguley D, Bash K, Turner V, Turnbull S, Valtorta N, Caan W. An overview of systematic reviews on the public health consequences of social isolation and loneliness. Public Health. 2017 Nov;152:157-171. doi: 10.1016/j.puhe.2017.07.035. Epub 2017 Sep 12. PMID: 28915435.
Hodgson S, Watts I, Fraser S, Roderick P, Dambha-Miller H. Loneliness, social isolation, cardiovascular disease and mortality: a synthesis of the literature and conceptual framework. J R Soc Med. 2020 May;113(5):185-192. doi: 10.1177/0141076820918236. PMID: 32407646; PMCID: PMC7366328.
Pearson, Catherine. How Many Friends Do You Really Need? https://www.nytimes.com/2022/05/07/well/live/adult-friendships-number.html
A evidência de que mulheres e homens são diferentes é indiscutivelmente tão antiga quanto a vida humana, mas estudos básicos de pesquisa são realizados exclusivamente em animais machos e as mulheres são amplamente excluídas dos ensaios clínicos. Além do sexo, o gênero é ainda mais negligenciado como determinante da saúde humana (Marra et al., 2018).
Acrescenta-se que, sexo e gênero são termos usados de forma intercambiável, apesar de seus significados diferentes (Marra et al., 2018). Sexo, na pesquisa médica, refere-se a diferenças biológicas e fisiológicas entre mulheres e homens, com cromossomos sexuais (XX vs. XY) e hormônios gonadais contribuindo, principalmente, para essas diferenças no nível celular, órgão e sistemas. Já gênero refere-se a uma combinação de influências ambientais, sociais e culturais sobre os fatores biológicos em mulheres e homens. O gênero está enraizado na biologia e moldado pelo ambiente e pela experiência. Há evidências crescentes para apoiar que tanto o sexo quanto o gênero afetam a etiologia, a apresentação e os resultados do tratamento de muitas doenças (Koch-Gromus & Gromus, 2014; Marra et al., 2018; Nebel et al., 2018).
Por isso, sexo e gênero moldam nosso estado de saúde por meio de interação dinâmica. Uma melhor integração de sexo e gênero na pesquisa e na abordagem clínica é obrigatória, pois leva a uma medicina personalizada e à igualdade nos cuidados de saúde (Marra et al., 2018). Logo, para maximizar o desenvolvimento de tratamentos e intervenções atuais e futuros em todo o espectro do autismo, as diferenças de sexo e gênero devem ser melhor compreendidas e medidas.
Em especial, o Transtorno do Espectro Autista - TEA muitas vezes não é reconhecido, especialmente na sua apresentação no nível leve em mulheres sem déficit de linguagem/intelectual.
Uma das hipóteses é que as mulheres camuflam mais os sintomas de TEA do que os homens, contribuindo potencialmente para a diferença na prevalência. Essa camuflagem pode ocorrer na forma de modificar a expressão social externa de alguém, como forçar-se a exibir expressões faciais e contato visual apropriados ou até mesmo representar um personagem ou papel para parecer mais típico ou suprimir comportamentos inapropriados e idiossincráticos. Além disso, a camuflagem foi positivamente correlacionada com a gravidade dos sintomas de humor em homens com TEA e com o funcionamento executivo em mulheres com TEA. Isso sugere que o mesmo fenômeno relacionado ao TEA, camuflado neste caso, pode se manifestar de maneira diferente em homens e mulheres, resultando em um potencial risco diferencial de psicopatologia. Aliás, o fenótipo apresentado por mulheres com TEA pode não refletir necessariamente como elas vivenciam o mundo (Schuck et al., 2019).
Do mesmo modo, em comparação com homens, as mulheres apresentam um atraso significativamente maior no encaminhamento para serviços de saúde mental e uma idade significativamente maior no diagnóstico de TEA. Por exemplo, as mulheres são menos propensas a serem diagnosticadas corretamente e mais propensas a serem diagnosticadas erroneamente na primeira avaliação do que os homens. As mulheres relatam pontuações significativamente mais altas do que os homens no domínio Hiper/Hiporreatividade à entrada sensorial, apenas entre os indivíduos que foram diagnosticados erroneamente (Gesi et al., 2021).
Em resumo, pesquisas crescentes apoiam a especificidade de gênero na apresentação dos sintomas do TEA. Acredita-se que fenótipos diferentes, comorbidades psiquiátricas e nível de "camuflagem" (estratégias comportamentais de enfrentamento para ocultar os sintomas para uso em situações sociais) contribuam ainda mais para a discrepância nas taxas de prevalência e erros de diagnóstico resultantes ou diagnóstico tardio em indivíduos do sexo feminino. Ambos os fatores nosológicos e culturais parecem estar contribuindo para diferenças no diagnóstico de TEA em mulheres. Essas diferenças na apresentação têm implicações importantes para o diagnóstico tardio, o tratamento do TEA e a qualidade de vida das mulheres com autismo (Green et al., 2019).
FONTES:
Gesi, C., Migliarese, G., Torriero, S., Capellazzi, M., Omboni, A. C., Cerveri, G., & Mencacci, C. (2021). Gender Differences in Misdiagnosis and Delayed Diagnosis among Adults with Autism Spectrum Disorder with No Language or Intellectual Disability. Brain Sciences, 11(7), 912. https://doi.org/10.3390/brainsci11070912
Green, R. M., Travers, A. M., Howe, Y., & McDougle, C. J. (2019). Women and Autism Spectrum Disorder: Diagnosis and Implications for Treatment of Adolescents and Adults. Current Psychiatry Reports, 21(4), 22. https://doi.org/10.1007/s11920-019-1006-3
Koch-Gromus, U., & Gromus, B. (2014). Gesundheit und Geschlecht. Bundesgesundheitsblatt - Gesundheitsforschung - Gesundheitsschutz, 57(9), 1019–1021. https://doi.org/10.1007/s00103-014-2024-2
Marra, A. M., Biskup, E., & Raparelli, V. (2018). The Internal Medicine and Assessment of Gender Differences in Europe (IMAGINE): The new European Federation of Internal Medicine initiative on sex and gender medicine. European Journal of Internal Medicine, 51, e30–e32. https://doi.org/10.1016/j.ejim.2018.02.003
Nebel, R. A., Aggarwal, N. T., Barnes, L. L., Gallagher, A., Goldstein, J. M., Kantarci, K., Mallampalli, M. P., Mormino, E. C., Scott, L., Yu, W. H., Maki, P. M., & Mielke, M. M. (2018). Understanding the impact of sex and gender in Alzheimer’s disease: A call to action. Alzheimer’s & Dementia, 14(9), 1171–1183. https://doi.org/10.1016/j.jalz.2018.04.008
Schuck, R. K., Flores, R. E., & Fung, L. K. (2019). Brief Report: Sex/Gender Differences in Symptomology and Camouflaging in Adults with Autism Spectrum Disorder. Journal of Autism and Developmental Disorders, 49(6), 2597–2604. https://doi.org/10.1007/s10803-019-03998-y
O termo retardo mental (RM) ainda é usado em muitos contextos, inclusive por alguns médicos, e é encontrado em políticas legais e públicas que determinam a elegibilidade para apoio; no entanto, o uso do termo deficiência intelectual como substituto direto do retardo mental está aumentando. A American Association on Mental Retardation foi renomeada para American Association on Intellectual and Developmental Disabilities (AAIDD), enfatizando que a definição de DI é exatamente a mesma que para RM (Shea, 2012).
A principal razão para a mudança é que o termo retardo mental é percebido como pejorativo; essa mudança semântica não reflete uma ressignificação da condição (Shea, 2012).
O diagnóstico se baseia em três características coexistentes: (1) funcionamento intelectual significativamente abaixo da média acompanhado por (2) déficits ou deficiências nas habilidades adaptativas com (3) início antes dos 18 anos de idade (Shea, 2012).
Por convenção, para todos os níveis de DI, o QI reduzido deve ser acompanhado por déficits nas funções adaptativas, que incluem habilidades conceituais, sociais e práticas. Habilidades conceituais incluem linguagem, alfabetização e aquisição de numeramento, bem como compreensão de tempo e dinheiro. As habilidades sociais incluem julgamento social, habilidades interpessoais e resolução de problemas sociais. Habilidades práticas incluem cuidados pessoais e outras atividades da vida diária, habilidades ocupacionais, capacidade de negociar o mundo com segurança e acesso ao transporte, e assim por diante (Shea, 2012).
A DI é uma condição permanente, caracterizada por comprometimento significativo do desenvolvimento cognitivo e adaptativo devido a anormalidades da estrutura ou função cerebral. Assim, a DI não é uma entidade única, mas sim um sintoma geral de uma disfunção neurológica (Shea, 2012).
Entretanto, os clínicos variam com relação à aplicação do termo DI, dependendo da idade do indivíduo. Alguns preferem usar o termo atraso no desenvolvimento ou atraso no desenvolvimento global para crianças menores de 5 anos e reservam DI para crianças mais velhas. Para alguns, esse uso parece ser uma questão de convenção, enquanto para outros é um reflexo da necessidade de ter confiança na trajetória de desenvolvimento de uma criança antes de aplicar os últimos termos.
Graus da DI são descritos no DSM-IV. Os adjetivos correlatos (leve, moderado, severo, profundo) costumam ser usados para resumir os resultados dos testes, e é útil entender o que eles representam. Dentro do DSM, os intervalos são dados como números de quociente de inteligência (QI), que se baseiam no QI médio da população de 100, e 1 DP equivale a 15 pontos em avaliações comumente usadas. Uma pontuação inferior a 70 pontos, ou seja, mais de 2 DPs abaixo da média, representa DI. A DI leve é definida quando o QI cai 2 a 3 DPs abaixo da média (55 a 70). Na DI moderada, o QI está 3 a 4 DPs abaixo da média (40 a 55); na DI grave, o QI está 4 a 5 DPs abaixo da média (25 a 40); e na DI profunda o QI está mais de 5 SDs abaixo da média (abaixo de 25). (Shea, 2012).
Fonte: Shea, S. E. (2012). Intellectual Disability (Mental Retardation). Pediatrics in Review, 33(3), 110–121. https://doi.org/10.1542/pir.33-3-110
Pessoas com DI podem precisar de tecnologia assistiva para manter e melhorar seus níveis de funcionamento e independência (Resta et al., 2021).
A DI é uma condição permanente, caracterizada por comprometimento significativo do desenvolvimento cognitivo e adaptativo devido a anormalidades da estrutura ou função cerebral. Assim, a DI não é uma entidade única, mas sim um sintoma geral de uma disfunção neurológica (Shea, 2012).
As pessoas acometidas de DI podem deixar de iniciar as atividades de forma independente e esperar por lembretes da equipe ou cuidadores, ou podem não as iniciar no momento apropriado. Além disso, podem não se lembrar de parte ou de muitas das etapas envolvidas nas atividades e/ou da sequência correta dessas etapas.
Devido à capacidade prejudicada de lidar com as tarefas diárias, os indivíduos com DI enfrentam barreiras pessoais e do contexto e em função disto, geralmente precisam de algum tipo de serviço de longo prazo.
Smartphone: um sistema de baixo custo que pode ser usado para melhorar a independência de pessoas com DI. Esses dispositivos de tecnologia podem ser programados para apresentar instruções pictóricas simples, breves videoclipes (prompts de vídeo), instruções verbais ou combinações de formas de instrução visual e verbal (Resta et al., 2021).
VANTAGENS: são mais acessíveis, pois podem ser facilmente personalizados de acordo com as características e preferências do usuário, bem como mais fáceis de transportar de um ambiente para outro e mais aceito socialmente (Resta et al., 2021).
O sistema baseado em smartphone para lembrar o usuário de iniciar atividades diárias funcionais (por exemplo, preparar uma mesa para o almoço) e realizá-las sem o apoio de um cuidador (Resta et al., 2021).
MATERIAL: smartphone Samsung Galaxy A3 equipado com o aplicativo Easy Alarm, YouTube e arquivos de áudio apresentando os lembretes verbais para o início das atividades e as instruções referentes às etapas das atividades. O smartphone deve ter a funções padrão, como conexão Bluetooth e alarme. (Resta et al., 2021).
NÚMERO DE ATIVIDADES PLANEJADAS DIÁRIAS: 8 a 14 (Média = 10)
NÚMERO DE PASSOS INCLUÍDOS NESSAS ATIVIDADES: 12 e 21 (Média = 15)
AVALIAÇÃO DE SEGUIMENTO DA TAREFA: Durante a primeira linha de base, registrar o número de atividades programadas para o dia em que os pacientes começaram de forma independente. Durante a segunda linha de base e a intervenção, as medidas registradas dizem respeito ao número de atividades iniciadas independentemente, bem como ao número de etapas da atividade realizadas independentemente. Posteriormente, registrar as atividades iniciadas independentemente e etapas da atividade executadas corretamente/independentemente.
O alarme serve para lembrar ao participante de realizar uma atividade planejada, por exemplo, alertar sobre o horário de qualquer atividade específica programada para o dia e que deverá ser iniciada e, em seguida, é fornecido as instruções verbais para as etapas individuais dessa atividade. No caso, desse lembrete, o smartphone apresenta cada uma das instruções de passo predefinidas para a atividade. De fato, a apresentação automática libera o DI do fardo de lembrar de buscar cada instrução e de possuir habilidades motoras adequadas para ativar ícones ou rolar na tela de um smartphone (Resta et al., 2021). Por exemplo, obter cada uma das instruções de as atividades programadas (por exemplo, fazer um sanduíche).
As instruções devem ser apresentadas automaticamente pelo smartphone em intervalos predefinidos. Essa estratégia de apresentação de instruções é considerada vantajosa em comparação com uma estratégia que exige que o DI forneça uma entrada (por exemplo, toque).
As atividades devem ser tipicamente selecionadas e preparadas para os pacientes de forma individual; ou seja, diferentes atividades podem estar disponíveis para diferentes pacientes. Além disso, o número e os tipos de etapas envolvidas nas atividades disponíveis para diferentes pacientes podem variar entre eles (Resta et al., 2021).
Para cada uma das atividades disponibilizadas, deverá ser utilizado um arquivo de áudio. O profissional responsável pelo planejamento diário deverá definir o horário para a realização de cada uma das atividades programadas para aquele dia. Para cada atividade, um arquivo de áudio específico apresentando as instruções deve ser vinculado ao alarme do smartphone. No momento em que a atividade é agendada para o dia, o smartphone emitirá um lembrete verbal solicitando que o paciente realize tal atividade. Após o lembrete, que poderá ser repetido, o smartphone apresenta cada uma das instruções de passo-a-passo predefinidas para a atividade.
Essas atividades podem envolver a rotina matinal do banheiro, vestir-se, higiene dental, rotina do café da manhã, preparação de alimentos, aulas de culinária (cada uma consistindo em fazer um tipo específico de comida), exercícios, preparação para ir para casa, limpeza do quarto, trabalho no jardim e operar um computador para ver slides ou material de livro (Resta et al., 2021).
EFEITO CLÍNICO:
A) aumento estatisticamente significativo no número de atividades iniciadas independentemente desde o início até ao final da intervenção para todos os participantes (Resta et al., 2021).
B) aumento significativo no número de etapas das atividades executadas corretamente quando apoiadas pelo smartphone (Resta et al., 2021).
Fontes:
Resta, E., Brunone, L., D’Amico, F., & Desideri, L. (2021). Evaluating a Low-Cost Technology to Enable People with Intellectual Disability or Psychiatric Disorders to Initiate and Perform Functional Daily Activities. International Journal of Environmental Research and Public Health, 18(18), 9659. https://doi.org/10.3390/ijerph18189659
Shea, S. E. (2012). Intellectual Disability (Mental Retardation). Pediatrics in Review, 33(3), 110–121. https://doi.org/10.1542/pir.33-3-110
A motivação social, a nível neurofisiológico, é modulada pelos circuitos cerebrais relacionados ao sistema de recompensa. Em indivíduos com Transtorno do Espetro Autista – TEA há uma ativação atípica desse sistema durante as interações sociais.
Desta forma, o olhar é uma sugestão social que parece ser particularmente gratificante em indivíduos típicos. Especificamente, ver um rosto atraente fazendo contato visual envolve sistemas cerebrais ligados à recompensa. Por exemplo, um adulto típico, considera o olhar direto mais gratificante do que o olhar desviado, e ainda mais para objetos. No entanto, aqueles com TEA podem ser indiferentes.
Isto é, no caso do TEA, esse grupo difere de indivíduos com desenvolvimento típico quanto a motivação para se envolver ou se afiliar a outras pessoas. Essas alterações refletem indiferença ou mesmo respostas negativas de excitação ao olhar direto.
Desta forma, a motivação social pode ser aferida em termos de orientação social, busca visual e manutenção social.
Com efeito, a orientação social é definida como a conduta de dar prioridade de atenção a pistas sociais ou informações sociais. No caso de indivíduos com TEA, eles olham menos para rostos e estímulos sociais do que indivíduos típicos.
Já a manutenção social, é descrita como o desejo dos indivíduos de se envolver com os outros durante um período prolongado. E neste parâmetro, indivíduos com TEA não envolvem em gerenciamento de reputação; não tentam conectar com pessoas, e não ficam lisonjeados com outras pessoas.
Em relação a busca social, é um conceito que normalmente é entendido como gostar de um estímulo (obter prazer hedônico com ele) e desejá-lo (fazer esforço para obtê-lo). Essa motivação, via esforço, é muito reduzida no grupo com TEA.
Em resumo, em estudos de autorrelatos, nos grupos clínicos com TEA, sugerem que eles experimentam menos prazer com contatos sociais e não expressam solidão, apesar de relatarem menor companheirismo e reciprocidade em suas redes de pares. Por tudo isso, indivíduos com TEA demonstram motivação social reduzida.
Logo, uma indiferença mais específica em relação ao olhar direto é relatada. Em contraposição a uma preferência por estímulos não sociais. Eles não valorizam os estímulos sociais com o olhar direto, porém podem olhar, desde que não exija mais esforço do que uma outra opção.
Consequentemente, o olhar direto no TEA pode ser imotivado mais pela falta de interesse na interação social do que pela aversão dos olhos.
Fonte: Dubey, I., Ropar, D. & de C Hamilton, A.F. Measuring the value of social engagement in adults with and without autism. Molecular Autism 6, 35 (2015). https://doi.org/10.1186/s13229-015-0031-2
A obesidade não é uma falha pessoal, segundo um seleto grupo dos principais pesquisadores do mundo que estudam a obesidade, em reunião recentemente na Royal Society, a academia de ciências de Isaac Newton e Charles Darwin.
Na reunião de encerramento do encontro, algumas conclusões importantes filtradas por Belluz, J (2022):
1)Não há consenso algum sobre qual é a causa da obesidade.
2)Preguiça, gula e descuido não foram referidos como atores da obesidade. Em total contraste com a visão social predominante da obesidade, que assume que as pessoas têm controle total sobre seu tamanho corporal, eles não culpam os indivíduos por sua condição, da mesma forma que não culpamos as pessoas que sofrem os efeitos da desnutrição, como atrofia.
3)A obesidade é uma condição crônica complexa, existem lacunas para entender por que os humanos, coletivamente, engordaram mais ao longo do último meio século.
4)Enquanto tratarmos a obesidade como uma questão de responsabilidade pessoal, é improvável que sua prevalência diminua.
Várias visões sobre o problema dos carboidratos:
1)Biólogo nutricional: os carboidratos e gorduras em nossa alimentação hoje diluem a proteína de que nosso corpo precisa, levando-nos a ingerir mais calorias para compensar a discrepância.
2)Endocrinologista: os padrões alimentares ricos em carboidratos promovem exclusivamente a gordura ao abordar a dieta com baixo teor de carboidratos.
3)Antropólogo evolucionário: argumentou que muitas sociedades de caçadores-coletores magros comiam muitos carboidratos, com uma afinidade especial pelo mel.
Outras opiniões sobre os carboidratos: o problema são os alimentos ultraprocessados, e não os carboidratos em si, neste caso:
4)Fisiologista: as pessoas comem mais calorias e ganham mais peso em dietas ultraprocessadas, em comparação com dietas de alimentos integrais, com a mesma composição de nutrientes. Mas ainda não está claro por que esses alimentos levam as pessoas a comer mais.
5)Bioquímico: O mistério pode ser explicado pelas milhares de substâncias tóxicas que os alimentos ultraprocessados podem carregar na forma de fertilizantes, inseticidas, plásticos e aditivos.
6)Etóloga: escassez de comida, consumo reduzido de calorias, levam passarinhos a ganhar mais peso. Estudos em humanos também encontraram uma associação “robusta” entre insegurança alimentar e obesidade.
Além desses pontos, acredita-se que a obesidade surja devido a interações gene-ambiente ainda obscuras.
Conclusões:
1)Existe uma profunda lacuna entre os argumentos dos palestrantes na reunião e as conversas de peso que acontecem em nossa cultura sobre a obesidade.
2)Nenhum cientista falou sobre qualquer das supostas soluções que enchem os livros de dieta e as prateleiras das lojas, com exceção da discussão sobre carboidratos.
3)Não houve diálogo sério sobre desintoxicação, aplicativos de dieta ou jejum intermitente.
4)Ninguém sugeriu que os suplementos pudessem ajudar as pessoas a perder peso ou que o metabolismo precisasse ser estimulado.
5)O único pesquisador sobre o microbioma intestinal argumentou que os testes em humanos sobre obesidade, até o momento, foram decepcionantes.
Além do mais, existe avanços importantes e eficazes na medicina no tratamento de pacientes com obesidade, como os medicamentos e cirurgias. Entretanto, esses recursos não foram discutidos como soluções definitivas para a crise de saúde pública.
Logo, a obesidade deve ser tratada como um desafio social, e não pelo viés de escolha individual, que domina.
Fonte: Belluz, B. Scientists Don’t Agree on What Causes Obesity, but They Know What Doesn’t - https://www.nytimes.com/2022/11/21/opinion/obesity-cause.html
O tratamento de uma condição clínica que muda a nossa engenharia comportamental, de forma disfuncional e nos causando sofrimento e prejuízos diários, nos exige uma postura de gigante para a mudança desses padrões que compõem esse modo de funcionamento. Consequentemente, é como trabalhar para mudar a engrenagem de uma máquina. Assim, a força motriz, muitas vezes até ausente, é absurdamente desafiadora e fundamental para a alteração do processo.
E, por isto, gostaria de abordar sobre a depressão junto com o hábito. Por exemplo, para mudar algumas coisas em seu comportamento, é necessário que você faça isso repetidamente. Como disse Aristóteles, “nós somos o que fazemos repetidamente”. Logo, nenhuma modulação comportamental pode se abdicar dessa premissa básica, caso contrário, estará fadada a ser direcionada por padrões disfuncionais da doença (neuroplasticidade negativa).
Junto a isso, o processo de modulação comportamental é lento. De modo que, os pequenos passos são muitas vezes imperceptíveis pelos pacientes e por sua rede de suporte e por este motivo, eles devem ser sinalizados com instrumentos de medidas capazes de capturar essas alterações e permitir um feedback para o paciente e seu entorno. Esse espectro é importante para mostrar a evolução desses pequenos, mas basilares passos em prol da modificação positiva do comportamento em relação ao quadro clínico. Desta forma, não se iluda em pensar que mudar seus hábitos será uma tarefa rápida e fácil, pois nada é mais difícil do que mudar um hábito. Uma vez que, o sistema operacional do seu cérebro é fiel. Ele o levará de volta aos mesmos padrões de comportamento que você costuma enfatizar, mesmo que geradores de muito sofrimento. Isso é plasticidade negativa, uma rota automatizada, que nesta situação é guiada pelo hábito disfuncional. E para isto, novos hábitos devem ser implementados e treinados com processos controlados cognitivos, até que esses se tornem hábitos funcionais automatizados.
O psicólogo William James historiou em 1887, quando escreveu Habit – um breve tratado sobre como nossos padrões de comportamento moldam quem nós somos e, ao que frequentemente, nos referimos como caráter e personalidade. James começa com um relato estritamente científico e fisiológico do cérebro e de nossos grupos de padrões de informação arraigados, explorando a noção de neuroplasticidade um século antes de se tornar um termo da moderna neurociência popular e oferecer essa definição elegante (Popova, M. 2012):
“Plasticidade... no sentido amplo da palavra, significa a posse de uma estrutura suficientemente fraca para ceder a uma influência, mas suficientemente forte para não ceder de uma só vez.”
Em seguida, William James faz a ponte entre o corpo e a mente para esclarecer como os “loops de hábitos” dominam nossas vidas (Popova, M. 2012):
“O que é tão claramente verdadeiro do aparato nervoso da vida animal dificilmente pode ser diferente do que é ministrado à atividade automática da mente (…) Qualquer sequência de ação mental que tenha sido repetida, frequentemente, tende a se perpetuar; de modo que nos sentimos automaticamente impelidos a pensar, sentir ou fazer o que antes estávamos acostumados a pensar, sentir ou fazer, sob circunstâncias semelhantes, sem qualquer propósito conscientemente formado ou antecipação de resultados”
Logo, se você tem uma doença como a depressão, (re)introduzir padrões positivos de tarefas é a mudança comportamental do seu tratamento. Não há outra saída. A transformação e excelência, então, não é um ato, mas um hábito cotidianamente lapidado para uma direção, seja ela em prol de neuroplasticidade neutra, positiva ou negativa. E, na visão clínica, a condução terapêutica é em prol da modulação positiva. Primeiro, pela via medicamentosa, uma vez que os medicamentos, pelo menos em parte, atuam no cérebro para formar novas conexões entre as células. A saber, em função de que uma das hipóteses da depressão, está relacionada ao estresse crônico e, esse leva a perda de conexões - chamadas sinapses - entre as células do hipocampo e outras partes do cérebro, potencialmente levando à depressão. O segundo ponto, é a intervenção comportamental, ou seja, condutas direcionadas as modificações dos hábitos disfuncionais.
Enfim, esse processo pode exigir muitas tentativas e erros pelos pontos dinâmicos abordados no texto, mas é importante lembrar que você tem opções. E, não desista, lembre-se dos pequenos, mas importantes passos!
Fontes:
Smith, Dana G. (2022). Antidepressants Don’t Work the Way Many People Think. https://www.nytimes.com/2022/11/08/well/mind/antidepressants-effects-alternatives.html
Podova, M. (2012) William James on the Psychology of Habit. https://www.themarginalian.org/2012/09/25/william-james-on-habit/
A psicoeducação no Transtorno Bipolar (TB) é definida como treinamento comportamental baseado em informações, com o objetivo de ajustar o estilo de vida para lidar com o TB. Os componentes incluem aumentar a conscientização sobre a doença, adesão ao tratamento, detecção precoce de recaídas e evitar possíveis desencadeadores, como drogas ilícitas e privação de sono (Sarkhel et al., 2020).
A psicoeducação na fase de mania, num quadro de TB, tem efeitos de uma redução significativa na recorrência da mania, mas não na recorrência depressiva. Entretanto, na fase na mania os efeitos incluem o aumento do tempo de remissão, taxas mais baixas de reinternação, desde que com tratamento ativo (Chen et al., 2019).
Avaliação de seguimento em T0: linha de base; T1: 4ª sessão e T2: 8ª sessão.
Instrumentos para a avaliação de seguimento (Chen et al., 2019):
a) Escala de Avaliação Hamilton para depressão
b) Escala de Avaliação de Mania para Jovens
c) Escala de Gravidade de Impressão Clínica Global e a Classificação Internacional de Saúde, Incapacidade e Funcionalidade – CIF da OMS para aferição do funcionamento global
AS SESSÕES INCLUEM OS SEGUINTES TÓPICOS (Chen et al., 2019):
SESSÃO 1: introdução sobre o TB para conhecimento da etiologia biológica, epidemiologia e conceitos
A maioria dos pacientes com TB tem uma visão pobre de sua condição. Se o paciente não compreender sua condição, é improvável que se interesse pelas sessões subsequentes de psicoeducação. Enfatizar o modelo médico da doença ajuda a reduzir o estigma relacionado à doença. Também é ensinado que a doença tem origem biológica, embora os fatores desencadeantes possam ser biológicos ou psicológicos (Sarkhel et al., 2020).
Os assuntos abordados abrangem as seguintes áreas (Sarkhel et al., 2020):
· Introdução
· O que é Transtorno Bipolar?
· Etiologias e fatores desencadeantes
· Sintomas de mania e hipomania
· Sintomas de depressão e episódio misto
· Curso e resultado do transtorno bipolar.
SESSÃO 2: Definição de mania e hipomania (estado misto), depressão e sintomas psicóticos
Os assuntos abordados abrangem as seguintes áreas (Sarkhel et al., 2020):
· Sintomas de mania e hipomania
· Sintomas de depressão e episódio misto
· Curso e resultado do transtorno bipolar.
Sessão 3: Ritmos biológicos e episódio maníaco/depressivo
SESSÃO 4: O papel do tratamento farmacológico e dos diferentes tipos de medicamentos
Quase metade dos pacientes com TB descontinua o tratamento abruptamente e sem supervisão em algum momento de suas vidas. Quase todos os pacientes com TB pensam em interromper a medicação em algum momento durante o curso da doença. Isso ocorre muito comumente durante a fase eutímica ou naqueles com comorbidade de abuso de substâncias ou transtorno de personalidade. As áreas que precisam ser cobertas visando uma melhor adesão ao tratamento são as seguintes (Sarkhel et al., 2020):
1. estabilizadores de humor
2. agentes antimaníacos
3. antidepressivos
4. níveis séricos de lítio, carbamazepina e valproato
5. gravidez e aconselhamento genético
6. psicofarmacologia versus terapias alternativas
7. riscos associados à retirada do tratamento.
SESSÃO 5: Adesão e monitoramento medicamentoso, terapia eletroconvulsiva e psicoterapia
Uma discussão detalhada sobre os efeitos colaterais dos medicamentos comumente usados e as formas de manuseá-los é essencial para acabar com vários mitos entre os pacientes em relação aos medicamentos. O medo de se tornar “dependente para o resto da vida” desses medicamentos ou “perder a nitidez da mente” são alguns dos equívocos bem divulgados em relação aos psicotrópicos que forçam os pacientes a interromper abruptamente os medicamentos. Tais mitos devem ser gradualmente dissipados por uma discussão cuidadosa (Sarkhel et al., 2020).
SESSÃO 6: Gerenciamento de estresse, estratégias de enfretamento de problemas e relacionamentos interpessoais
Incluindo nesta etapa, procedimentos disfuncionais como o abuso de substâncias. Neste grupo clínico, mais da metade dos pacientes com TB têm abuso de substâncias comórbidas. O álcool é a droga mais frequentemente utilizada de forma abusiva entre os pacientes bipolares. Isso está associado a mais episódios depressivos, maiores problemas de adesão e má recuperação. Às vezes, o uso de substâncias pode desencadear um episódio afetivo completo. A psicoeducação deve envolver o conhecimento sobre o álcool e outras drogas e seus efeitos nocivos em pacientes com TB (Sarkhel et al., 2020).
SESSÃO 7: Sintomas recorrentes, detecção precoce de episódios e como procurar suporte na rede de apoio pessoal e clínica
Detectar os primeiros sinais de alerta é um passo muito importante para prevenir um episódio completo. É muito importante enfatizar que um episódio hipomaníaco precisa ser identificado e tratado rapidamente, pois pode evoluir rapidamente para um estado maníaco. Também precisa ser abordado que muitos pacientes apreciam a elevação inicial do humor do episódio hipomaníaco e, portanto, tendem a não relatar os sintomas aos familiares ou psiquiatras. Também é importante dar ao paciente e familiares um plano de emergência do que deve ser feito em caso de recaída.
SESSÃO 8: revisão e avaliação, criação de um plano de manejo e como monitorar o humor diário.
Os hábitos regulares, incluindo hábitos de sono adequados e estruturação de atividades, são enfatizados. A necessidade de 7 a 9 horas de sono noturno é enfatizada e é ensinado a evitar cochilos durante o dia. O papel da privação do sono no desencadeamento de episódios maníacos também é destacado. Os pacientes também são ensinados sobre a necessidade de exercícios físicos regulares. Técnicas de gerenciamento de estresse também são ensinadas, seguidas de habilidades simples de resolução de problemas que podem ser úteis no dia a dia.
MODALIDADE DO PROGRAMA: em grupo para 8-12 pacientes ou individual
DOSAGEM TERAPÊUTICA PARA INÍCIO DE EFEITO CLÍNICO:
DURAÇÃO: 2 meses
FREQUÊNCIA: 8 sessões
INTENSIDADE: 40-60 minutos
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
Anderson, C. M., Hogarty, G. E., & Reiss, D. J. (1980). Family Treatment of Adult Schizophrenic Patients: A Psycho-educational Approach. Schizophrenia Bulletin, 6(3), 490–505. https://doi.org/10.1093/schbul/6.3.490
Chen, R., Zhu, X., Capitão, L. P., Zhang, H., Luo, J., Wang, X., Xi, Y., Song, X., Feng, Y., Cao, L., & Malhi, G. S. (2019). Psychoeducation for psychiatric inpatients following remission of a manic episode in bipolar I disorder: A randomized controlled trial. Bipolar Disorders, 21(1), 76–85. https://doi.org/10.1111/bdi.12642
Sarkhel, S., Singh, O., & Arora, M. (2020). Clinical Practice Guidelines for Psychoeducation in Psychiatric Disorders General Principles of Psychoeducation. Indian Journal of Psychiatry, 62(8), 319. https://doi.org/10.4103/psychiatry.IndianJPsychiatry_780_19
Os ataques de pânicos giram em torno do terror e de uma constelação de sintomas, tanto físicos quanto cognitivos.
O cérebro da pessoa em crise é tomado pelo medo, o seu corpo responde, e pode ser difícil entender tudo isso.
Em termos neurofisiológicos, o do ataque de pânico é irrompido quando o cérebro não é capaz de enviar mensagens entre o córtex pré-frontal, que está associado à lógica e ao raciocínio, e a amígdala, que ativa a urgência da regulação emocional. Durante um ataque de pânico, a amígdala é hiper-reativa, como num quarto pegando fogo na saída de uma tomada, enquanto o córtex pré-frontal é menos responsivo, ou seja, ele não consegue ativar o sistema gerenciamento e inibição de incêndio do prédio, levando o quarto a um incêndio com capacidade para queimar todo o apto ou o prédio.
Ele tem início súbito, acompanhado de um medo intenso, em oposição a uma condição de ansiedade generalizada, que geralmente se manifesta como uma preocupação quase constante.
Os sintomas podem variar de pessoa para pessoa, mas geralmente, seguem os seguintes sintomas:
· Palpitações cardíacas
· Dificuldade de respirar
· Formigamento em membros superiores e inferiores
· Enjoos
· Sensação de compreensão no peito e/ou sufocamentos
· Calor, suor e/ou calafrios
· Medo agitado e desestabilizador
No auge do ataque de pânico, há pensamentos como:
· Percepção de estado de loucura, perda do controle cognitivo e das reações fisiológicas
· Percepção de que estaria tendo um ataque cardíaco
· Sensação de pré-morte
Importante salientar que, a maioria das pessoas que experimenta um ataque de pânico não apresenta todos esses sintomas acima, mas pode ter muito deles.
Um pequeno grupo de pessoas que sofrem de ataques de pânico, no entanto, apresentam sintomas limitados, nos quais encontram três ou menos dos listados acima.
E, quase tão repentinamente os ataques de pânicos irrompem, eles geralmente se dissipam. Os sintomas aumentam ao longo de dez minutos e, geralmente, desaparecem em meia hora, embora algumas pessoas possam sentir efeitos prolongados.
Por ser uma experiência traumática, esse grupo clínico pode começar a temer sensações que os lembram de seus sintomas. Consequentemente, começam a evitar qualquer coisa que os lembrem do episódico, por exemplo, os locais em que os eventos se desencadearam, estourando outro transtorno conhecido como agorafobia.
O desencadeamento do ataque de pânico se relaciona a um conjunto diversificado de estressores – como eventos traumáticos; preocupações financeiras; tarefas do cotidiano, como falar em público; ou até mesmo não ter nenhum gatilho discernível.
Dicas para autocuidado durante um ataque de pânico:
· Feche os olhos e converse com você mesmo, lembrando do seguinte ponto: você já passou pela experiência antes, embora muito assustadora, o pânico em si não é perigoso.
· Ligue para alguém de sua confiança: falar com alguém sobre o que você está experimentando e nomear as sensações dissipadas pelo seu corpo colabora para amenizar e estabilizar os sintomas no momento.
· Exercício de aterramento: conte e nomeie as cores ao seu redor. Diga cada uma em voz alta, ou apenas anote-as em sua mente. Esse recurso, e um descolamento perceptivo e atencional para pontos neutros e não ameaçadores que seu corpo está ativando em si.
· Regulação da atenção para o presente, pela via sensorial tátil: coloque um pano úmido e frio sobre o pulso. Isto ajuda também a aliviar o calor desconfortável e a transpiração que algumas pessoas sentem durante os seus ataques de pânico.
· Regulação da respiração: sair do padrão de hiperventilação, comum num ataque, para um padrão de respiração diafragmática, ou seja, respirar como um bebê, concentrando-se em expandir o abdômen. Isso pode retardar e aprofundar a respiração, inundando o cérebro com oxigênio e acionado o sistema nervoso parassimpático, que ajuda a sinalizar que não precisamos lutar e reduz os níveis de angústia.
Entretanto, essas dicas são temporárias. E, no caso de um transtorno, são necessárias condutas clínicas para intervenção, via medicamento e psicoterapia, para que num ambiente controlado possa ser modulado os medos e as sensações experimentadas durante um ataque de pânico.
Por exemplo, o EMDR - Eye Movement Desensitization and Reprocessing (Dessensibilização e Reprocessamento por meio de Movimentos Oculares) é uma técnica toda atrelada a regulação da neurobiologia do medo, incluindo os parâmetros de nível cognitivo, quanto as crenças disfuncionais e as memórias traumáticas associadas aos sintomas. Assim como, a Terapia Cognitiva Comportamental -TCC.
Lembre-se por mais desconcertante que um ataque de pânico possa ser, é importante lembrar que eles são altamente tratáveis e que, tão repentinamente quanto podem surgir, eles começam a desaparecer.
Fonte: Blum, Dani. The anatomy of a panic attack. https://www.nytimes.com/interactive/2022/11/10/well/mind/panic-attack-symptoms-causes.html
“Nossos cérebros evoluíram para serem sociais: precisamos de interação e conversas frequentes para manter a sanidade” (Suzanne Dikker, neurocientista cognitiva e linguista da Universidade de Nova York).
“A conversa é nossa maior ferramenta para alinhar mentes. Não pensamos no vácuo, mas com outras pessoas.” (Thalia Wheatley, neurocientista social do Dartmouth College).
Em momentos de fortes divisões de opiniões, como as que estamos vivendo na área política atual, relativas a temas sociais importantes, é possível o alinhamento de crenças por meio do diálogo?
A resposta é sim. No entanto, desde que o grupo de discussões esteja livre de fanfarrões, desses que só desejam lacrar (palavra cafona da moda nas redes sociais).
As discussões em grupo para resolver problemas comuns é um dos empreendimentos mais importantes nas sociedades humanas, mas chegar a um consenso, como sabemos, pode ser muito aflitivo.
Apesar das pessoas perceberem fatos de maneiras diferentes e terem relatos também diferentes sobre um acontecimento, é possível chegar a um consenso e termos modulações cognitivas, após uma discussão pujante.
Uma conversa robusta que resulta de um consenso, sincroniza os cérebros dos falantes não apenas quando se pensa no tópico que foi explicitamente discutido, mas em situações relacionadas que não foram alvo da conversa, posteriormente.
Entretanto, a BARREIRA para este padrão de saúde cognitiva, por meio de uma discussão em prol do acordo, é ter um membro do grupo cujas opiniões estridentes afetam a todos os outros.
Em contrapartida, após uma discussão alentada, temos maior alinhamento sobre um fato ao ser reanalisado pelos canais auditivos e visuais e, pelos domínios atencionais, mnemônicos, linguísticos e outros, e com sincronia de ativação cerebral do grupo participante da conversa e mesmo para novos pontos que são vistos individualmente. Logo, só atingimos uma dimensão ampliada sobre um tema, após uma conversa sem empecilhos individuais (crenças enrijecidas) de todos os presentes no grupo em prol do diálogo e com condutas de mediação.
Pontos importantes:
· Pessoas que compartilham crenças tendem a compartilhar ativações cerebrais semelhantes. Por exemplo, indivíduos que vêm uma imagem de notícias, a atividade cerebral daqueles com concepções conservadoras se pareciam mais com a de outros conservadores e vice-versa, conforme estudos.
· Traços de personalidade e dinâmicas de conversação, como reversar, podem afetar a dinâmica de um bate-papo, para ativar ou inibir a sincronia promovida pela comunicação.
Desta forma, o grau de similaridade nas respostas cerebrais depende não apenas das predisposições inerentes das pessoas, mas também do terreno comum criado por uma conversa.
Agora, o comportamento de um indivíduo pode influenciar drasticamente uma decisão de grupo. Por exemplo, num viés da divergência com condutas persuasivas de fanfarronice, dando ordens e executando conversas pontuais, não com o grupo, mas isoladamente com outros indivíduos para desagregar. Em compensação, num viés de mediação, a presença de condutas para leitura do contexto pelos participantes da discussão e tentativas de encontro de um terreno comum facilitam o diálogo.
Portanto, só existe alinhamento no processamento cognitivo em temas divergentes, mas em prol do consenso, via diálogo, se entrarmos numa discussão dispostos a mudar de ideia e não rígidos em nossas crenças, a tal ponto de agirmos apenas com imposições de visões individuais.
Fonte: Hughes, Virginia. How to Change Minds? A Study Makes the Case for Talking It Out. The New York Times. https://www.nytimes.com/2022/09/16/science/group-consensus-persuasion-brain-alignment.html
Inúmeros fatores podem contribuir para o fracasso de uma criança em aprender.
Consequentemente, as razões para o fracasso escolar de uma criança não devem ser consideradas isoladamente, mas sim no contexto das circunstâncias sociais e ambientais.
Assim, é possível categorizar 3 causas mais expressivas do fracasso escolar de crianças:
1. Características intrínsecas da criança: que são os transtornos do neurodesenvolvimento, como o Transtorno do Desenvolvimento da Linguagem – TDL, Distúrbios Específicos de Aprendizagem - DEA, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH, Deficiência Intelectual - DI, Deficiência Sensorial, e as doenças crônicas, etc.
2. Características do ambiente da criança: disfunções familiares, problemas sociais e escolarização ineficaz.
3. Consequências da interação entre a criança e seu ambiente: disfunção temperamental, falhas de atenção e transtornos emocionais
Por conseguinte, a avaliação neuropsicológica deve considerar a miríade dessas razões para insucesso escolar de uma criança e ser um exame de captura dessas causas por meio de dados quantitativos e qualitativos devidamente tratados e analisados.
E só diante desse rastreio, é possível:
a) executar a intervenção com as condições clínicas subjacentes especificadas e dimensionadas,
b) implementar aconselhamentos adequados,
c) promover a comunicação com os serviços e recursos médicos, educacionais e familiar necessários para a crianças,
d) coordenar os procedimentos de seguimento do tratamento, e
e) realizar os encaminhamentos adicionais.
Fonte: Dworkin PH. School failure. Pediatr Rev. 1989 Apr;10(10):301-12. doi: 10.1542/pir.10-10-301. PMID: 2704665.
Com o desenvolvimento contínuo da sociedade moderna, tem potencializado as experiências das pessoas com vidas tensas e ocupadas e enfrentando todos os tipos de pressões diárias. Quando os indivíduos têm dificuldade em se ajustar às pressões da vida, eles são propensos à depressão.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde - OMS, no ano de 2017 cerca de 5,8% da população brasileira sofria de depressão – um total de 11,5 milhões de casos. Sendo o maior índice na América Latina. Já em pesquisa Vigitel de 2021, esse percentual subiu para 11,3%. Tendo a maior frequência entre as mulheres (14,7%) em comparação com os homens (7,3%).
Entretanto, apesar da existência de tratamentos efetivos para a depressão, menos da metade das pessoas afetadas no mundo – e, em alguns países, menos de 10% dos casos – recebem ajuda clínica. As barreiras incluem falta de recursos, falta de profissionais capacitados e o estigma social associado aos transtornos mentais, além de falhas no diagnóstico.
Uma das facetas emocionais desses pacientes, é que muitas vezes eles sentem que suas vidas não têm sentido e valor, às vezes acompanhadas de pensamentos e tentativas de suicídio. Em contraposição, uma vida significativa é uma variável importante para a prevenção e cuidado do suicídio. Portanto, os recursos de prevenção ao suicídio devem incluir componentes relacionados ao sentido da vida.
Desta forma, os profissionais de saúde podem intervir para que os pacientes com depressão explorem seu significado de vida, enquanto esses suportam e transformam a dor emocional que acompanha a depressão. Portanto, diminuindo suas ideações suicidas.
Um dos recursos é a Terapia do Significado, criada por Victor Frankl (1946). Nessa modalidade terapêutica, Vitor Frankl apresentou três fontes únicas onde as pessoas desvendam e descobrem os significados da vida:
1) O valor da criatividade (o sentido do trabalho): neste caso, os indivíduos são incentivados a investir em um novo objetivo de vida. Quando os indivíduos se dedicam ao trabalho ou, à criação, experimentam o sentido da vida e sentem o valor da autoexistência.
2) O valor da experiência (o significado do amor): nesta etapa, os indivíduos são incentivados a experimentar a dimensão deste afeto consigo mesmo, família, amizade, comunidade, na sua concepção religiosa, e para toda a humanidade em todo o mundo, bem como, com o próprio planeta Terra.
3) O valor das atitudes (o significado do sofrimento): aqui, visa ampliar a percepção de que os seres humanos estão fadados a sofrer dores inevitáveis em suas vidas. No entanto, como afirma V. Frankl que, na dor, os indivíduos podem manter a liberdade de escolher como enfrentá-la, mudar suas atitudes em relação ao sofrimento, tratar o sofrimento como uma experiência vivida e compreender o significado do sofrimento como fundido com a própria vida. Se os indivíduos acreditam que o sofrimento tem significado, eles podem optar por suportá-lo e trabalhá-lo.
Fonte: Zeng YY, Long A, Chiang CY, Chiu NM, Sun FK. Exploring the meaning of life from the perspective of patients with depression: A phenomenological study. Arch Psychiatr Nurs. 2021 Oct;35(5):427-433. doi: 10.1016/j.apnu.2021.06.004. Epub 2021 Jun 22. PMID: 34561055.
Segundo a Dra. Lauren, professora de psiquiatria da Universidade de Michigan, o objetivo da avaliação é tentar evitar a prescrição de medicamentos sem um cálculo das causas subjacentes.
Ela argumenta que conhecer as causas subjacentes dos sintomas comportamentais e psicológicos da demência, realmente ajudará a direcionar adequadamente o tratamento. Uma vez que a gestão de quadros de infecções e psicose, ou problemas com cuidadores e com o meio ambiente devem ser abordados de maneira muito diferente neste grupo clínico. E sem conhecer as causas, como tratar?
No entanto, discorre ela, “na prática clínica do mundo real, as pessoas com demência geralmente recebem medicamentos psicotrópicos, como antipsicóticos, apesar da evidência de um efeito de evolução modesto. Embora os antipsicóticos tenham as melhores evidências para o tratamento dos sintomas comportamentais e psicológicos na demência, eles estão associados a um risco significativo, incluindo aumento da mortalidade, quedas, confusão, sedação e efeitos colaterais motores”.
E no mais, a avaliação permite a individualização da gestão clínica da condição de saúde. Por exemplo, recentemente a Clarivate publicou o relatório sobre o impacto de condutas orientadas para o paciente a partir de tratamentos de dados que visam realmente fornecer tomadas de decisões clínicas individualizadas.
Na atualidade, as condutas clínicas passam pela tipificação individualizada das disfunções cognitivas e deficiências do corpo, das limitações na execução de atividades e restrições de participação, e das barreias individuais e ambientais para a condução adequada da intervenção. Esses dados permitem a gestão abrangente da intervenção e a redução de efeitos clínicos adversos.
Fonte: Lauren Gerlach, MD, professora assistente de psiquiatria na Divisão de Psiquiatria Geriátrica da Universidade de Michigan para o Psychopharmacology Institute.
A robótica é uma importante tecnologia que trouxe avanços no campo da neurorreabilitação assistida por robô (Tieri et al., 2018).
O objetivo do uso dessa tecnologia é proporcionar um treino intensivo, repetitivo e orientado para tarefas, principalmente para membros superiores ou inferiores, o que representa um aspecto importante para a neurorreabilitação quanto ao controle das variáveis intensidade e frequência da dosagem terapêutica efetiva clinicamente. Além do feedback necessário para a execução correta da tarefa em lesões e/ou disfunções que afetam a memória operacional (esboço visuoespacial) e impedem o sequenciamento correto do movimento, por exemplo (Tieri et al., 2018).
Atualmente, existem muitos dispositivos-robôs que têm sido utilizados na neurorreabilitação. A título de exemplo, as tecnologias robóticas que foram combinadas com ambientes virtuais para reabilitação da marcha e os seus efeitos potencializados com a combinação de técnicas tradicionais da fisioterapia, RV e robôs (Tieri et al., 2018):
a. Os efeitos em pacientes com Acidente Vascular Encefálico – AVE com o sistema de reabilitação de tornozelo Rutgers, por meio de robô + RV: os pacientes submetidos apresentaram melhor evolução na capacidade de caminhar (ou seja, velocidade e distância percorrida). Ainda, efeitos positivos da RV na marcha também foram obtidos por meio do treinamento de marcha assistida por robô, onde foi utilizada a versão moderna Lokomat (Lokomat-Pro, (Hocoma Inc., Volketswil, Suíça), ou seja, um dispositivo robótico composto por (i) uma órtese motorizada capaz de guiar os movimentos do joelho e tornozelo, enquanto o paciente caminha em uma esteira, combinada com (ii) uma tela para exibição de um ambiente virtual não imersivo capaz de fornecer feedback interativo e direto ao paciente durante a caminhada (Tieri et al., 2018).
b. Os efeitos em pacientes com esclerose múltipla com deficiência de locomoção: Os pacientes submetidos ao treinamento de marcha assistida por robô tiveram bons resultados funcionais, mas aqueles que realizam RV tiveram melhores resultados, incluindo evolução do equilíbrio (Tieri et al., 2018).
c. Os efeitos em pacientes com hemiparesia crônica: Evidências mostraram que a RV induziu uma evolução na marcha e no equilíbrio e, mais importante, os resultados do Eletroencefalografia-EEG mostraram que o uso da RV sugeriu melhorar o desempenho motor ativando áreas fronto-parieto-occipitais do cérebro envolvidas no planejamento motor e aprendizado (Tieri et al., 2018).
Assim, essas evidências sugerem que o uso de feedback 2D VR desempenha um papel fundamental na dinamização do tratamento. Além de permitir o recrutamento da abordagem top-down e aumentar a participação ativa do paciente que é um facilitador do resultado positivo da neurorreabilitação. Finalmente, outra aplicação promissora que merece ser mencionada vem da pesquisa robótica desenvolvida pelo Laboratório PERCRO de Pisa que implementou e investigou a combinação de um protótipo de exoesqueleto com VR para reabilitação de membros superiores (para mais informações, ver referencias abaixo).
Fonte do texto: Tieri, G., Morone, G., Paolucci, S., & Iosa, M. (2018). Virtual reality in cognitive and motor rehabilitation: facts, fiction and fallacies. Expert Review of Medical Devices, 15(2), 107–117. https://doi.org/10.1080/17434440.2018.1425613
Fonte dos estudos sobre o tema no Laboratório PERCRO de Pisa:
Frisoli A, Borelli L, Montagner A, et al. Arm rehabilitation with a robotic exoskeleleton in virtual reality. 2007 IEEE 10th Int. Conf. Rehabil. Robot. ICORR’07; 2007. p. 631–642.
Frisoli A, Salsedo F, Bergamasco M, et al. A force-feedback exoskeleton for upper-limb rehabilitation in virtual reality. Applied Bionics Biomech. 2009;6:115–126
O hiperfoco é um fenômeno que reflete a completa absorção de uma pessoa numa tarefa, a tal ponto que a pessoa parece ignorar completamente ou 'desligar' todo o resto. Sendo que na literatura psiquiátrica o termo frequentemente utilizado é o hiperfoco e na literatura relacionada ao campo da psicologia positiva o termo é fluxo, apesar da fenomenologia ser quase idêntica. Logo, a literatura de fluxo pode ser usada como uma estrutura para entender o hiperfoco.
Geralmente, o hiperfoco ocorre quando uma pessoa está engajada numa atividade particularmente divertida ou interessante. Um exemplo de hiperconcentração, é quando uma criança fica envolvida em um videogame a ponto de não ouvir os pais chamando pelo seu nome.
Embora, a maioria das pessoas neurotípicas relatem ter experimentado um estado semelhante ao hiperfoco, em algum momento de sua vida, ele é mais frequentemente mencionado em quadros clínicos de autismo, esquizofrenia e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade - condições que têm consequências nas habilidades de atenção.
Assim, em termos técnicos, a hiperfocalização se caracterizada por concentração intensa em atividades interessantes e não rotineiras acompanhada por percepção temporariamente diminuída do ambiente.
Por certo, há quatro características gerais ou critérios de hiperfoco que são relatados de forma consistente:
I. O hiperfoco é caracterizado por um intenso estado de concentração/foco.
II. Quando as pessoas estão envolvidas tarefas de hiperfoco, estímulos externos não relacionados não parecem ser percebidos conscientemente; às vezes relatado como uma percepção diminuída do ambiente.
III. Para se engajar no hiperfoco, a tarefa deve ser divertida ou interessante.
IV. Durante um estado de hiperfoco, o desempenho da tarefa melhora.
Por sua vez, as condições para entrar no hiperfoco incluem:
· desafios percebidos, ou oportunidades de ação, que aumentam, mas não superam as habilidades existentes;
· objetivos proximais claros e feedback imediato sobre o progresso que está sendo feito.
Nessas condições, a experiência se desdobra perfeitamente de momento a momento e a pessoa entra num estado subjetivo com as seguintes características:
· concentração intensa e focada no momento presente;
· fusão de ação e consciência;
· perda de autoconsciência reflexiva (isto é, perda de consciência de si mesmo como ator social);
· uma sensação de que se pode controlar as próprias ações; isto é, a sensação de que podemos, em princípio, lidar com a situação porque sabemos como responder a tudo o que acontece a seguir;
· distorção da experiência temporal (normalmente uma sensação de que o tempo passou mais rápido do que o normal);
· a experiência da atividade como intrinsecamente gratificante, de forma que muitas vezes o objetivo final é apenas uma desculpa para o processo.
Portanto, o fluxo indica ser mais alto quando há igualdade entre a dificuldade e a habilidade percebida da tarefa pelos executores (denominado compatibilidade habilidades-demanda). Neste caso, um exemplo numa tarefa de baixa importância e capaz de levar ao fluxo é o videogame pac-man para alguns indivíduos. Desta maneira, o fluxo alto se manifesta em tarefas fáceis e com compatibilidade de demanda de habilidades, em comparação de quando a tarefa é difícil. Já no quesito motivação para realização de uma tarefa, é comum que as pessoas motivadas por sua 'esperança de sucesso', em comparação às com 'medo do fracasso’, as primeiras tendem a potencializar o fluxo durante a tarefa.
Assim, o aumento da importância percebida da tarefa tem potencial de aumentar a motivação do sujeito para se engajar nela e, subsequentemente, moderar as condições sob as quais o fluxo foi alcançado.
Em termos de fluxo, a “experiência da atividade como intrinsecamente gratificante”, pode ser um dos critérios para entrar em um estado de fluxo, ao invés de um efeito desses estados. Isso sugere que envolver o hiperfoco requer o envolvimento de tarefas, o que seria simplesmente mais comum durante tarefas divertidas ou interessantes.
Em relação ao desempenho, o fluxo produz uma execução inerentemente alta. Por exemplo, na execução de uma tarefa em três condições experimentais distintas: tédio, ajuste e sobrecarga, foi visto que na condição de ajuste, observou-se um estado de fluxo, enquanto na condição de sobrecarga e tédio não. Por exemplo:
a) Na condição de tédio, foram feitas perguntas muito fáceis ao longo dos blocos.
b) Na condição de ajuste (ou adaptativo), as dificuldades das questões foram adaptadas com base no desempenho (quando se acertava uma questão, a próxima era mais difícil; quando errava, a próxima era mais fácil).
c) E na condição de sobrecarga, a dificuldade das questões foram consistentemente muito difíceis para os sujeitos ao longo dos blocos.
E o mais interessante, visto neste experimento, é que foi apurado um aumento do estresse na condição de sobrecarga, já que os indivíduos estavam lutando para ter sucesso, mas também na condição de ajuste, com os mesmos valores da condição de sobrecarga. Desta maneira, as experiências de fluxo podem ser consideradas como envolvendo tensão excessiva e carga mental de uma perspectiva fisiológica.
Resumindo, a definição operacional para quatro características distintas e testáveis do hiperfoco são:
(1) o hiperfoco é induzido pelo engajamento da tarefa;
(2) o hiperfoco é caracterizado por um estado intenso de atenção sustentada ou seletiva;
(3) durante um estado de hiperfoco, há uma percepção diminuída de estímulos não relevantes para a tarefa; e
(4) durante um estado de hiperfoco, o desempenho da tarefa melhora.
Fonte: Ashinoff, B. K., & Abu-Akel, A. (2021). Hyperfocus: the forgotten frontier of attention. Psychological research, 85(1), 1–19. https://doi.org/10.1007/s00426-019-01245-8
Por Juno DeMelo
Pelo New York Times
A discussão sobre os fatores emocionais no desencadeamento da dor crônica não é nova. Recentemente, o jornal New York Times discutiu o assunto, por meio da reportagem de Juno DeMelo. Ele conta a sua história na busca de um tratamento para uma dor crônica em dois momentos e entrelaça essa experiência com as discussões no universo científico sobre o tema.
Ele inicia a discussão com o livro Free Yourself From Back Pain, um best-seller de 1991, que afirma que, para distrair um sofredor de ansiedade reprimida, raiva ou sentimentos de inferioridade, o cérebro cria dores no pescoço, ombros, costas e nádegas, diminuindo assim o fluxo sanguíneo para os músculos e nervos. O autor do livro, John Sarno, era um médico em reabilitação da Universidade de Nova York.
De acordo com Sarno, quase todas as dores crônicas são causadas por emoções reprimidas. E ao fazer psicoterapia ou escrever sobre essas dores, as pessoas seriam curadas sem medicação, cirurgia ou exercícios especiais.
Consequentemente, pela lógica metódica da teoria de Sarno, a dor emocional causa dor física. E, embora, a dor não se originasse de um andar peculiar ou de uma posição inadequada ao dormir, ela seria real. Entretanto, ninguém na comunidade médica pareceu concordar com Sarno, já que ele não tinha estudos para demonstrar os efeitos clínicos de seu programa. Contudo, não podiam também negar que funcionava para alguns de seus pacientes ou conhecedores de seu livro. Esses, depois de exorcizar num diário os seus sentimentos negativos, por um tempo, apareciam curados.
A DOR GERALMENTE COMEÇA NO CÉREBRO
"A ideia de que uma proporção substancial de pessoas pode ser ajudada repensando as causas de sua dor é agora prevalente", segundo Tor Wager, professor de neurociência no Dartmouth College e diretor de seu Laboratório de Neurociência Cognitiva e Afetiva. "Entretanto, isso é diferente da ideia de que seu relacionamento não resolvido com sua mãe se manifesta como dor." Desta forma, a maioria dos cientistas agora acreditam que a dor nem sempre é algo que começa no corpo e, seja percebida pelo cérebro. Assim, pode não ser uma doença em si, ou seja, de origem biológica.
Uma vez que, cerca de 85% das dores nas costas e 78% das dores de cabeça não têm um gatilho identificável, embora a maioria dos cientistas não afirmem que toda a dor crônica seja puramente psicológica. Já que existem também razões sociais e biológicas para a dor. Logo, para a maioria das pessoas, a dor é uma confluência dos três, conforme argumenta Daniel Clauw, professor de anestesiologia, medicina e psiquiatria da Universidade de Michigan e diretor de Centro para Dor Crônica e Pesquisa de Fadiga. Ademais, para Clauw, há muitas pessoas para as quais o método de Sarno não iria funcionar.
Atualmente, uma abordagem semelhante ao método de Sarno é a teoria da consciência e da expressão emocional, na qual os pacientes identificam e expressam as emoções que têm evitado. Essa teria não apenas demonstrou reduzir significativamente a dor em pessoas com fibromialgia e dor musculoesquelética crônica , como também é considerada pelo Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA como uma das melhores práticas para o tratamento da dor crônica (junto com massagem e terapia cognitivo-comportamental )
A DOR PODE TER VIDA PRÓPRIA
Contudo, como o cérebro causa dor crônica em primeiro lugar? A teoria de Sarno de que nosso cérebro usa a dor para nos distrair das emoções negativas, cortando o fluxo sanguíneo para os músculos, não é apoiada pela ciência, de acordo com Wager. Em vez do fluxo sanguíneo, os cientistas agora olham para o sistema nervoso para entender a dor crônica que não é causada por danos nos nervos ou tecidos. Basicamente, nesses casos, os circuitos cerebrais funcionam mal, prolongando, amplificando e até criando a dor.
SEIS DICAS PARA TRATAR A DOR CRÔNICA
1. Compreenda: para quem a experimenta cronicamente, a dor é sua própria doença, não apenas um sintoma. Os estudos indicam que pode ser causada pelo desequilíbrio das células nervosas especializadas.
2. O exercício físico ajuda: se você tem dor crônica, pode continuar se exercitando. E, em muitos casos, pode ajudar a reduzir a sensação de desconforto e aumentar o limiar de dor.
3. Controle a dor desde a fonte: embora a dor crônica seja uma doença, você tem muito poder sobre ela e pode voltar para sua mente para começar a encontrar alívio. O que pode lhe ajudar? Mantenha um diário para expressar seus sentimentos.
4. Reformule seus pensamentos: os especialistas estão descobrindo que os psicólogos da dor podem ajudá-lo a mudar a maneira como o cérebro processa a dor .
5. Use uma linguagem descritiva útil: usar metáforas ou outras linguagens para falar sobre sua dor pode realmente mudar o quanto você sente . Por exemplo, falar abertamente do desconforto que sua dor lhe provoca pode ser mais benéfico do que usar palavras substitutas.
6. Encontre uma equipe: em um mundo ideal, os médicos saberiam como tratar doenças crônicas como a dor. No mundo real, você pode ter que procurar ativamente a equipe de atendimento para você.
Na prática, Wager diz que não entendemos totalmente os mecanismos disso, mas "sabemos que os estressores podem promover inflamação na medula espinhal e no cérebro, que estão ligados ao aumento das sensações de dor." As adversidades iniciais, como abuso infantil, dificuldades financeiras, violência e negligência, também foram associadas à dor crônica.
Além do mais, para complicar ainda mais as coisas: a dor pode gerar mais dor. Por exemplo, uma lesão pode aumentar o volume de sua resposta à dor a lesões futuras. O estresse pode fazer com que a dor se prolongue por muito tempo após a cicatrização da lesão. E se suas costas doem e você começa a imaginar todas as maneiras como isso poderia piorar, esse medo pode aumentar sua dor, o que pode levá-lo a evitar atividades físicas, tornando a dor ainda pior. Os especialistas chamam isso de ciclo da dor.
Nesse caso, a ideia de Sarno de que o cérebro provoca dor estava parcialmente correta. A pesquisa mostra que a catastrofização pode transformar a dor aguda em dor crônica e aumentar a atividade em áreas do cérebro relacionadas à antecipação e atenção à dor. Essa é uma das razões pelas quais os médicos estão começando a tratar os distúrbios dolorosos de maneira semelhante, por exemplo, aos distúrbios de ansiedade, incentivando os pacientes a se exercitarem para que possam superar o medo de se movimentarem. Enquanto um paciente com ansiedade social pode dar pequenos passos para falar com estranhos, por exemplo, um paciente com dor nas costas pode começar a correr ou andar de bicicleta.
VOCÊ PODE ENCONTRAR O INTERRUPTOR DE ELIMINAÇÃO
O resultado final, de acordo com Howard Schubiner, um aprendiz de Sarno, é que "toda dor é real e toda dor é gerada pelo cérebro". Schubiner é atualmente diretor do Programa de Medicina do Corpo Mente em Southfield, Michigan, e professor clínico da Faculdade de Medicina Humana da Universidade Estadual de Michigan.
Qualquer que seja, a dor desencadeada por estresse ou lesão física, o cérebro gera as sensações. E - este é um conceito incrível - você não apenas reflete o que sente, você decide se liga ou desliga a sua dor.
No final, Sarno acertou ao afirmar que os exercícios ajudam na recuperação quanto a relação entre a dor emocional e a física. Entretanto, errou por não considerar que nem toda dor crônica é psicológica. O tratamento Freudiano de Sarno está longe de ser o único que funciona. E, poucos cientistas diriam que nosso cérebro usa a dor para nos distrair das emoções negativas (e definitivamente jamais afirmariam algo do tipo como cortando o fluxo sanguíneo para os músculos).
O diagnóstico de câncer é um evento estressante e potencialmente traumático e, mesmo após o tratamento bem-sucedido, os efeitos relacionados podem continuar a ser uma fonte de sofrimento considerável.
Efetivamente, explorar e expressar pensamentos e sentimentos são considerados aspectos centrais da psicoterapia, e há evidências que sugerem que intervenções expressivas potencializam para que esses pacientes possam expressar seus pensamentos e emoções relacionados ao câncer. O efeito, que ainda carece de melhores estudos, é da melhora nos resultados da saúde física e psicológica.
Consequentemente, a vontade, a capacidade e a oportunidade de expressar preocupações e emoções relacionadas ao câncer - ou a falta delas - podem influenciar o prognóstico dos pacientes com estressores associados à doença e ao tratamento. Daí que tal situação pode ter consequências não apenas para a saúde psicológica do paciente, mas também nos resultados da sua saúde física, incluindo o prognóstico.
Por sua vez, um modo de expressão emocional ligada a resultados benéficos para a saúde é a escrita. Desse modo, as primeiras pesquisas de Pennebaker et al. (1986) demonstraram que para início de efeito clínico da escrita expressiva deverá ter intensidade de 15-20 minutos, com a frequência de 3 dias sobre emoções associadas a um evento traumático. Essa estratégia indica potencial clínico quanto à melhorias na saúde psicológica e biológica de pacientes oncológicos.
É importante ressaltar que não são todos os pacientes que são elegíveis para se beneficiar com o uso da técnica. Por exemplo:
a) os efeitos da expressão emocional são dependentes do contexto, ou seja, há efeitos diferentes entre pacientes, dependendo da disponibilidade percebida de suporte emocional por eles. Para tanto, os pontos abaixo são fundamentais para a indicação ou não da técnica:
a flexibilidade expressiva, ou seja, a capacidade de regular a amplitude da emoção, uma vez que essa regulação é indicada como associada ao ajustamento psicológico de longo-prazo.
indivíduos de forma geral gerenciam suas emoções de maneiras diferentes, dependendo do nível de intensidade, isso sugere que pode ser adaptativo para envolver e se desligar das emoções, dependendo do contexto.
por exemplo, os pacientes com baixos níveis de suporte emocional ou altos níveis de restrições sociais experimentadas são mais propensos a se beneficiar da escrita expressiva do que pacientes com altos níveis de suporte emocional.
a escrita expressiva é relativamente eficaz para participantes com baixo índice de evitação, enquanto uma redação mais positiva com foco na descoberta de benefícios indica ser mais eficaz para mulheres com alto índice de evitação.
a escrita expressiva, em comparação com a escrita neutra, teve sucesso em induzir os breves aumentos no humor negativo, geralmente associados à revelação emocional
Embora a escrita expressiva não pareça funcionar bem para todos os pacientes oncológicos, dado ser uma intervenção muito prática e barata, mesmo com pequenos efeitos em subgrupos de pacientes, ela é indicada ser clinicamente relevante. Uma vez que há vestígios em estudos de efeitos para níveis de angústia pré-intervenção e fatores dependentes do contexto, como suporte emocional.
A associação da escrita expressiva com outras abordagens, por exemplo, instrução aos participantes a se concentrarem na descoberta de benefícios, intervenções multimodais combinando 'expressões saudáveis' verbais e escritas ou ajudando os outros, também são necessárias.
Fontes:
Pennebaker JW, Beall SK. Confronting a traumatic event: toward an understanding of inhibition and disease. J Abnorm Psychol 1986;95(3):274–281.
Zachariae, R., & O'Toole, M. S. (2015). The effect of expressive writing intervention on psychological and physical health outcomes in cancer patients--a systematic review and meta-analysis. Psycho-oncology, 24(11), 1349–1359. https://doi.org/10.1002/pon.3802
Uma das correntes em desenvolvimento de pensamento, pesquisa e prática no campo da superdotação é a exploração da co-ocorrência, distribuição e etiologia de dons (talentos) e deficiências. Cresce a consciência de que existe um grupo substancial de crianças que preenchem as qualificações para serem “duas vezes excepcionais” (2e), nomeadamente, crescer com capacidades e deficiências excepcionais em simultâneo (Grigorenko, 2020).
Para ficar dentro do contexto 2e, existe um subgrupo com transtornos de desenvolvimento do comportamento e um subgrupo com dons (talentos), e que esses grupos podem se sobrepor. Como esse grupo de co-ocorrência não foi bem pesquisado, a maioria das fontes de evidências que confirmam sua existência são complementares (Grigorenko, 2020).
Embora tenha havido um fluxo consistente de relatos sobre a co-ocorrência de dons (talentos) e deficiências em crianças com necessidades especiais, que remonta à cristalização dos diagnósticos relevantes, só recentemente ficou claro que essas co-ocorrências não se limitam a um transtorno do neurodesenvolvimento particular, como o Transtorno do Espectro do Autismo ou Distúrbios de Aprendizagem Específicas, mas são fenômenos que foram observados em deficiências de desenvolvimento em geral (Grigorenko, 2020).
No entanto, em grande parte devido às trajetórias de desenvolvimento paralelas, em vez de entrelaçadas, dos campos de estudos sobre dons (talentos) e deficiências de desenvolvimento, os relatórios publicados dessas co-ocorrências não foram volumosos (Grigorenko, 2020).
No século XXI, essas trajetórias têm se tornado mais próximas e mais conectadas, especialmente após a re-autorização de 2004 da Lei de Melhoria da Educação de Indivíduos com Deficiências nos EUA, IDEIA (Lei de Melhoria da Educação de Indivíduos com Deficiências, 2004), que reconheceu formalmente os alunos 2e (Grigorenko, 2020).
Ainda, o mais importante, não existe uma definição única de status 2e. Ao contrário, há muita discussão na literatura sobre como essa condição deve ser definida. Uma definição de trabalho alcançou um consenso substancial, entre as 26 organizações que apoiam as necessidades de pesquisa e educação dos alunos 2e: “Indivíduos duas vezes excepcionais evidenciam capacidade e deficiência excepcionais, o que resulta em um conjunto único de circunstâncias. Sua habilidade excepcional pode dominar, escondendo sua deficiência; sua deficiência pode dominar, escondendo sua habilidade excepcional; cada uma pode mascarar a outra para que nenhuma seja reconhecida ou diagnosticada” (Grigorenko, 2020).
A definição de superdotação (talento) utiliza a acepção desenvolvida pela National Association for Gifted Children, ou seja, “superdotados são aqueles que demonstram níveis excepcionais de aptidão (definido como uma capacidade excepcional de raciocinar e aprender) ou competência (desempenho ou realização documentada entre os 10% melhores da população geral) em um ou mais domínios. Os domínios incluem qualquer área estruturada de atividade que tenha seu próprio sistema de símbolos - por exemplo, matemática, música, linguagem) e/ou conjunto de habilidades sensório-motoras (por exemplo, pintura, dança, esportes (Grigorenko, 2020).
Fonte:
Grigorenko, E. L. (2020). Twice Exceptional Students: Gifts and Talents, the Performing Arts, and Juvenile Delinquency. New Directions for Child and Adolescent Development, 2020(169), 59–74. https://doi.org/10.1002/cad.20326
Em 1983, Bradley (1983) revisou os estudos israelenses e americanos para determinar algo parecido com o que discutimos em terminologias atuais quanto ao grau de evidência de recomendações do Programa de Enriquecimento Instrumento (PEI) quanto ao seu efeito clínico nas modificações de estruturas cognitivas de adolescentes com Deficiência Intelectual (DI). O autor argumenta que embora a pesquisa tenha produzido alguns resultados estatisticamente significativos em favor do grupo do PEI, a importância dessas descobertas seria questionada com base em falhas no projeto da pesquisa, na magnitude relativamente sem importância das diferenças médias que foram relatadas como significativas e, na deficiência quanto mudanças de pontuação em medidas de capacidade cognitiva para se refletir no desempenho escolar.
Consequentemente, ele conclui que as alegações de que a pesquisa leva "apoio substancial" à eficácia do PEI deveriam ser rejeitadas.
E foram rejeitadas já por quase 38 anos! E o instrumento jogado ao limbo do esquecimento! No seu lugar não foi incorporado nenhum outro produto com o seu potencial. A exceção são os trabalhos nos campos da inteligência e da deficiência intelectual de J.P. Das (Jagannath Prasad Das), esse também desconhecido pelos neuroreabilitadores atuais.
E adversamente, o foco nos últimos anos das pesquisas quanto a intervenção em DI se voltou para as questões motoras e funcionais, apesar de com problemas sérios também no desenho de pesquisa e preteriu os aspectos cognitivos primários da condição clínica, como o raciocínio, ou em especial a terceira unidade funcional de A. R. Luria (1973), acoplada com a etapa de elaboração de Feuerstein.
Com certeza, a posologia errada junto com designer de pesquisa desastroso não invalida inicialmente o recurso. As falhas apontadas por Bradley (1983) são sem dúvidas relevantes. Entretanto, a julgar a vanguarda de suas críticas ao instrumento, o mais sensato seria modificar e aprimorar a metodologia de pesquisa e, não desconsiderar o instrumento em si, conforme autor sinaliza em seu estudo quanto a necessidade de ajuste nas futuras investigações, mas não o seu abandono.
Efetivamente, o PEI despertou muita atenção e interesse nas últimas décadas do século passado, como um modelo para diagnosticar e intervir nos déficits cognitivos de crianças com DI. E atualmente, há uma urgência no seu resgaste com fundamentação empírica.
O PEI é um modelo criado por Reuven Feuerstein para avaliação dinâmica e instrução de desempenho aplicado, entre outras condições clínicas, em deficientes intelectuais. A atenção e o interesse são bem-merecidos porque, se as reivindicações feitas por esse modelo forem apoiadas por um corpo de pesquisas com designer adequado, as ramificações enviarão ondas de choque por todo o mundo da neuroreabilitação e da educação especial (Bradley, 1983).
Por exemplo, se os profissionais da saúde e educação podem avaliar a natureza dos déficits cognitivos específicos que prejudicam o funcionamento intelectual de uma criança; se essa avaliação leva a um programa eficaz de intervenção cognitiva e; se os efeitos desse programa corretivo são duráveis e generalizam-se para outras atividades de vida-diária e instrumental além do treinamento tarefas; não há dúvidas de que o campo da saúde cognitiva enfrentará a necessidade de mudanças perturbadoras (Bradley, 1983).
Em nossa clemência por aqueles a quem estamos comprometidos em tratar, todos queremos acreditar que o modelo de Feuerstein para modificabilidade cognitiva tem, ou irá, em breve adquirir aquele grau de suporte empírico necessário para recomendar sua adoção generalizada. (Bradley, 1983).
Fonte:
Bradley, T. B. (1983). REMEDIATION OF COGNITIVE DEFICITS: A CRITICAL APPRAISAL OF THE FEUERSTEIN MODEL*. Journal of Intellectual Disability Research, 27(2), 79–92. https://doi.org/10.1111/j.1365-2788.1983.tb00281.x
É comum, como sabe, no contexto escolar, algumas crianças, mesmo com ajustes nos recursos didáticos, não responderem adequadamente quanto ao desempenho escolar. Neste caso, a avaliação neuropsicológica é tida como o recurso mais adequado para identificação das causas e para direcionar a intervenção pedagógica, sendo que em alguns casos de transtornos, também nortear a intervenção clínica.
Como é um fato importante que foi conquistado pela inclusão, hoje a maioria das escolas abordam uma ampla gama de níveis de funcionamento, desde os portadores de transtornos neuropsiquiátricos e neurológicos de níveis leves, moderados e graves de desenvolvimento até os superdotados.
Consequentemente, para que os programas pedagógicos, nestas situações, funcionem com eficácia, a avaliação neuropsicológica deve identificar os pontos fortes e fracos de aprendizagem de cada criança, de modo que elas sejam assistidas com manejo pedagógico estruturado as suas necessidades cognitivas para atingir seu pleno potencial de aprendizagem. Quanto mais amplo for o repertório de ferramentas do neuropsicólogo, mais completa será a avaliação. E, quanto mais completa for a avaliação, mais adequada será a intervenção da criança no contexto escolar.
Pontos importantes (Parsons & Duffield, 2020):
a) DE uma ciência comportamental desintegrada e com poucos dados PARA uma ciência coesa e rica em dados que permita uma tradução melhorada da pesquisa de bancada para a clínica.
b) Os 4 principais avanços que influenciam as prioridades científicas de um plano estratégico recente do NIH Office of Behavioral and Social Sciences Research:
1. Integração da neurociência nas ciências comportamentais e sociais
2. Avanços transformacionais na ciência da medição
3. Plataformas de intervenção digital e coortes populacionais em grande escala
4. Integração de dados
c) A necessidade de desenvolvimento nessas áreas para neuropsicologia manter a sua relevância como uma disciplina científica e avançar no desenvolvimento científico.
d) Além disso, os efeitos de tais avanços requerem discussão e modificação do treinamento, bem como dos códigos éticos e legais para pesquisas e práticas neuropsicológicas.
Neuropsicólogos clínicos têm tradicionalmente desenvolvido e validado ferramentas de avaliação parcimoniosas usando tecnologias básicas (isto é, protocolos de lápis e papel, modelo linear geral). Avanços ocorreram predominantemente em padrões normativos expandidos ao longo da história desta profissão. Embora essas ferramentas de baixa dimensão sejam avaliações bem validadas de construtos cognitivos básicos, elas têm apresentação limitada (estímulos 2D estáticos) e recursos de registro (que requerem registro manual de respostas). Além disso, as abordagens de baixa dimensão limitam sua modelagem estatística (normalmente linear) a combinações de recursos relativos a um conjunto de pesos para prever o valor das variáveis de critério. Alguns neuropsicólogos podem argumentar que a parcimônia oferecida por ferramentas de baixa dimensão reflete a realidade de um déficit de dimensão muito superior. No entanto, ferramentas de baixa dimensão podem oferecer interpretações reduzidas de fenômenos complexos (Parsons & Duffield, 2020).
A preferência por ferramentas de baixa dimensão é aparente em pesquisas de avaliações usadas por neuropsicólogos. Este conservadorismo resultou em avaliações neuropsicológicas que quase não mudaram desde que as escalas originais foram estabelecidas no início de 1900. As ferramentas de avaliação neuropsicológica de baixa dimensão colocam o neuropsicólogo no mesmo nível do trabalho literário do século 19 sobre a natureza da percepção e da dimensionalidade. Para os neuropsicólogos, as tecnologias de baixa dimensão nos levaram a buscar explicações simplificadas de fenômenos complexos, o que limita nossa capacidade de desenvolver, validar, interpretar e comunicar modelos úteis da neuropsicologia humana. Recentemente, psicólogos cognitivos chamaram isso de falácia Flatland. Eles afirmam que a falácia Flatland pode ser superada formalizando teorias psicológicas como modelos computacionais que têm a capacidade de fazer previsões precisas sobre cognição e / ou comportamento (Parsons & Duffield, 2020).
Existem evidências de que está ocorrendo progresso na neuropsicologia; no entanto, mais trabalho precisa ser feito. Muito desse trabalho envolve a adoção, desenvolvimento e validação de novas tecnologias. Da mesma forma, há a necessidade de um sistema de classificação (baseado em pesquisas em neurociência e psicologia) que vá além das ênfases de baixa dimensão em construções cognitivas unitárias específicas para um suposto sistema funcional ou neuronal. Em termos mais básicos, os neuropsicólogos deveriam teorizar com verbos em vez de substantivos para servir ao progresso científico. Só então os neuropsicólogos podem integrar dados para desenvolver ontologias significativas e bases de conhecimento colaborativas de fenômenos neuropsicológicos de alta dimensão. A modelagem computacional é uma grande promessa para atingir esse objetivo (Parsons & Duffield, 2020).
A neuropsicologia de alta dimensão requer uma reforma substancial na maneira como a profissão conduz o treinamento. O treinamento de alta dimensão deve ser adicionado aos treinamentos atuais que enfatizam principalmente (em alguns programas pode ser apenas) testes neuropsicológicos de baixa dimensão (por exemplo, testes de papel e lápis) e métodos (introdução limitada à modelagem linear geral). Maior ênfase deve ser colocada no desenvolvimento de habilidades técnicas com tecnologias de alta dimensão e raciocínio inferencial baseado em dados. Os currículos dos programas de neuropsicologia devem ser expandidos para se adaptar aos recentes avanços tecnológicos que levaram ao crescimento exponencial nas outras ciências. Isso exigiria reimaginar o treinamento em programas de psicologia clínica. Se os neuropsicólogos do futuro devem trabalhar com grandes bases de conhecimento colaborativo e realizar modelagem computacional complicada de big data, então eles precisam de pelo menos treinamento básico em áreas tradicionalmente associadas com ciência da computação (por exemplo, programação de computadores) e informática (algoritmos e bancos de dados). Como tal, seu treinamento estatístico básico precisaria ser aprimorado para incluir manipulação de dados, geração de modelo preditivo, aprendizado de máquina, processamento de linguagem natural, teoria de gráfico e visualização. Uma maior ênfase no treinamento de habilidades técnicas e computacionais básicas melhorará a capacidade dos futuros neuropsicólogos de participar da ciência. programação de computadores) e informática (algoritmos e bases de dados). Como tal, seu treinamento estatístico básico precisaria ser aprimorado para incluir manipulação de dados, geração de modelo preditivo, aprendizado de máquina, processamento de linguagem natural, teoria de gráfico e visualização. Uma maior ênfase no treinamento de habilidades técnicas e computacionais básicas melhorará a capacidade dos futuros neuropsicólogos de participar da ciência. programação de computadores) e informática (algoritmos e bases de dados). Como tal, seu treinamento estatístico básico precisaria ser aprimorado para incluir manipulação de dados, geração de modelo preditivo, aprendizado de máquina, processamento de linguagem natural, teoria de gráfico e visualização. Uma maior ênfase no treinamento de habilidades técnicas e computacionais básicas melhorará a capacidade dos futuros neuropsicólogos de participar da ciência (Parsons & Duffield, 2020).
Uma nota final é a iniciativa BRAIN, que promove o uso de novas ferramentas e tecnologias importantes (Parsons & Duffield, 2020):
(1) tecnologias para monitorar a atividade do circuito neural e
(2) tecnologias que permitem a modulação dos circuitos neurais.
Como esperado, as preocupações éticas relacionadas ao uso médico e não médico de neurotecnologias por neuropsicólogos são profundas. A neuroética para neurotecnologias inclui uma combinação de abordagens éticas de princípio, deontológicas e consequentes para responder aos dilemas éticos. O treinamento em neuroética e o uso ético de tecnologias de alta dimensão permitirão que os neuropsicólogos forneçam cuidados aprimorados a seus pacientes (Parsons & Duffield, 2020).
Fonte:
Parsons, T., & Duffield, T. (2020). Paradigm Shift Toward Digital Neuropsychology and High-Dimensional Neuropsychological Assessments: Review. Journal of medical Internet research, 22(12), e23777. https://doi.org/10.2196/23777
Na verdade, atrasar o início das demências em apenas alguns anos poderia reduzir substancialmente sua prevalência e os encargos humanos e econômicos relacionados ao quadro clínico (KIVIPELTO et al., 2020).
Consequentemente, as intervenções preventivas nas demências são implementadas para (KIVIPELTO et al., 2020):
a) prevenir ou retardar o início
c) tratar efetivamente outros distúrbios que aumentam a incidência das demências
c) levar a um ciclo de progressão lenta da demência quando já irrompida.
E COMO PROCEDER NA PREVENÇÃO? Uma menor ocorrência de demência, em alguns países, estava relacionado as mudanças nos perfis de fatores de risco, incluindo melhorias nos tratamentos da hipertensão, diabetes e de doenças cardiovasculares, bem como, maiores oportunidades educacionais (KIVIPELTO et al., 2020).
Desta forma, os sete fatores elencados nos estudos quanto aos riscos potencialmente modificáveis na prevenção das demências, em especial na doença de Alzheimer - DA (KIVIPELTO et al., 2020):
a) Diabetes
b) Hipertensão da meia-idade
c) Obesidade na meia-idade
d) Sedentarismo
e) Depressão
f) Tabagismo
g) Baixo nível de escolaridade.
Assim, a intervenção no estilo de vida em múltiplos domínios pode melhorar a função cognitiva em adultos mais velhos. No geral, a população que está em alto risco de desenvolver demência (KIVIPELTO et al., 2020).
Porém, como fazer essas melhoras? Com aconselhamento dietético, exercícios físicos, treinamento cognitivo, e monitoramento de risco cardiovascular e metabólico (KIVIPELTO et al., 2020).
Corroborando as informações acima, a Comissão Lancet sobre Prevenção, Intervenção e Cuidado nas Demências propôs um modelo de risco de demência ao longo da vida que reflete como os fatores de estilo de vida implementados ao longo da vida contribuem para o risco de demência. Eles estimaram que as intervenções ao longo da vida poderiam teoricamente prevenir mais de um terço dos casos de demência (KIVIPELTO et al., 2020).
E de novo, nessa recomendação, as intervenções incluem o (KIVIPELTO et al., 2020):
a) aumento do acesso e da qualidade da educação na primeira infância;
b) tratar ou reduzir hipertensão e obesidade na meia-idade;
c) intervir na perda auditiva; e
d) reduzir o tabagismo, depressão, sedentarismo, isolamento social e diabetes na vida adulta.
A grande evidência quanto ao estilo de vida associado ao declínio cognitivo e demências vem do estudo de Intervenção Geriátrica Finlandesa para Prevenir disfunções Cognitiva e Incapacidades gerais (FINGER, ClinicalTrials.gov: NCT01041989). Esse trabalho representa o primeiro grande ensaio clínico controlado randomizado de longo-prazo (RCT) demonstrando que uma intervenção em estilo de vida de múltiplos domínios pode melhorar a função cognitiva em adultos mais velhos, grupo alvo que está em alto risco de desenvolver demências (KIVIPELTO et al., 2020).
Os participantes do estudo foram randomizados para um grupo que recebeu aconselhamento geral de saúde (grupo 1) e outro um grupo em que recebeu intervenção de múltiplos domínios por 2 anos (grupo 2) (KIVIPELTO et al., 2020).
A intervenção de múltiplos domínios incorporou aconselhamento dietético, exercícios físicos, treinamento cognitivo, e monitoramento de risco vascular e metabólico (KIVIPELTO et al., 2020).
Resultados: melhoria na cognição global após 24 meses, avaliado usando a bateria de teste neuropsicológico abrangente (pontuação total NTB), foi 25% maior no grupo de intervenção de múltiplos domínios do que no grupo de aconselhamento geral de saúde (P = 0,03). O desempenho foi melhorado em todos os subdomínios cognitivos, incluindo função executiva, velocidade de processamento e tarefas complexas de memória (KIVIPELTO et al., 2020).
Análises adicionais mostraram que a intervenção de vários domínios FINGER beneficiou a cognição, independentemente de fatores sociodemográficos e socioeconômicos ou outras características basais, apoiando os benefícios potenciais do modelo FINGER para grandes populações em risco.
Os indivíduos com suscetibilidade genética (portadores do gene da apolipoproteína E (APOE) ε4) mostraram benefícios cognitivos oriundos da intervenção. A intervenção FINGER também reduziu o risco de desenvolver novas doenças crônicas (KIVIPELTO et al., 2020).
Embora os resultados do estudo FINGER tenham sido encorajadores, dois outros grandes ECRs de múltiplos domínios - o French Multidmain Alzheimer Preventive Trial (MAPT) e o Dutch Prevention of Dementia by Intensive Vascular Care (PreDIVA) - relataram a falta de efeito sobre os resultados primários (KIVIPELTO et al., 2020).
Contudo, notavelmente, análises exploratórias de subgrupos em ambos os estudos forneceram evidências de que as intervenções produziram benefícios cognitivos em subpopulações de participantes com maior risco de demência, destacando a importância de questões metodológicas, como seleção de indivíduos em risco, tempo adequado e intensidade das intervenções, e seleção de ferramentas sensíveis apropriadas para detectar mudanças na cognição (KIVIPELTO et al., 2020).
Fonte:
KIVIPELTO, M. et al. World‐Wide FINGERS Network: A global approach to risk reduction and prevention of dementia. Alzheimer’s & Dementia, v. 16, n. 7, p. 1078–1094, 5 jul. 2020.
Neuropsicólogos acadêmicos e clínicos esclareceram a disfunção cognitiva em várias populações neuropsiquiátricas ao longo de muitos anos (RANDOLPH, 2018).
Por fim, agora temos um conhecimento oriundo de trabalhos sólidos das sequelas esperadas quanto à esclerose múltipla, acidente vascular encefálico, epilepsia, doença de Parkinson, lesões cerebrais de todos os níveis de gravidade e várias formas de demência (RANDOLPH, 2018).
No entanto, sabemos muito menos sobre indivíduos com condições que afetam o funcionamento neuropsicológico e que apresentam resultados positivos. Por exemplo, cerca de 50% das pessoas com esclerose múltipla apresentam alterações cognitivas; muito menos se sabe sobre os outros 50% que permanecem cognitivamente intactos. Alguns pacientes podem ser cognitivamente resilientes devido ao estilo de vida, fatores genéticos, disposicionais, entre outros (RANDOLPH, 2018).
Voltando ao exemplo acima, indivíduos com esclerose múltipla sem comprometimento cognitivo objetivo, sem queixas cognitivas subjetivas e falta de disfunção cognitiva diária confirmada por informante mostram menos sintomas de fadiga e labilidade de humor subclínica do que outros pacientes com esclerose múltipla. Outro fato clínico que nos chamam a atenção, quanto ao fator de envolvimento em atividades de estilo de vida e afeto positivo, por terem o potencial de reduzir a probabilidade de conversão de comprometimento cognitivo leve (CCL) em demência (RANDOLPH, 2018).
Efetivamente, não há dúvidas que os fatores atitudinais como determinação, otimismo disposicional, atitudes positivas e mudanças de perspectiva fazem parte dos resultados positivos quanto ao efeito clínico na cognição humana (RANDOLPH, 2018).
Do mesmo modo, atribuições de sintomas e conhecimento sobre lesão cerebral também desempenha papéis críticos na recuperação. Bem como, o senso de propósito de vida de uma pessoa como um fator potencialmente protetor contra o declínio cognitivo ou doenças neurológicas. De fato, um senso de propósito mais forte está associado à chance reduzida de infartos lacunares macroscópicos ou AVE de tipo hemorrágico e menor risco de desenvolver CCL ou demência. Este fator também vem sendo relatado para moderar o impacto da patologia da doença de Alzheimer na cognição. Além disso, há evidências de que alguns traços de personalidade, como consciência e abertura à experiência, conferem risco reduzido de declínio cognitivo em idosos (RANDOLPH, 2018).
De modo mais geral, os neuropsicólogos que adotam uma perspectiva de bem-estar cognitivo podem ajudar a maximizar a qualidade de vida e o funcionamento cognitivo daqueles com quem prestam os seus serviços clínicos (RANDOLPH, 2018).
Fonte:
Randolph JJ. Positive neuropsychology: The science and practice of promoting cognitive health. Appl Neuropsychol Adult. 2018 Jul-Aug;25(4):287-294. doi: 10.1080/23279095.2018.1457465. PMID: 29781728.
A comunidade científica biomédica está atualmente passando por uma expansão dramática na forma como os dados estão sendo usados para gerar novos conhecimentos, cumprir as metas de redução de doenças e deficiências e, melhoria da prestação de cuidados de saúde. Com efeito, são vários os fatores que contribuem para essa expansão dos dados. Os avanços em computação e tecnologia da informação, bioestatística, bioinformática, capacidade de uso da internet e tecnologia na nuvem tornaram possível analisar, armazenar, transferir e compartilhar digitalmente grandes conjuntos de dados em níveis que não eram imaginados alguns anos atrás (Ottenbacher et al., 2019).
Essas mudanças resultaram no surgimento de uma nova disciplina científica e acadêmica conhecida como ciência de dados. Um campo interdisciplinar de investigação em que abordagens quantitativas e analíticas, processos e sistemas são desenvolvidos e usados para extrair conhecimento e percepções de conjuntos de dados cada vez maiores e / ou complexos (Ottenbacher et al., 2019).
Consequentemente, mudanças de paradigma na área de saúde se tornaram a norma. Duas décadas atrás, a pesquisa translacional estava em sua infância. Agora, é o conceito central que sustenta a pesquisa na prática e nos resultados de saúde. Uma década atrás, a ideia da pesquisa de resultados centrada no paciente estava apenas sendo introduzida. Agora, incluir ativamente as partes interessadas no processo de pesquisa é a regra, e não a exceção. Da mesma forma, a pesquisa qualitativa foi considerada por muitos como ciência leve. Hoje, os métodos mistos são vistos como uma abordagem importante no estudo da saúde humana. O recente surgimento do big data e da ciência de dados provavelmente prenuncia a próxima série de mudanças transformadoras. E o seu foco está na pesquisa de eficácia comparativa (Ottenbacher et al., 2019).
O referido Big data é geralmente definido como conjuntos de dados com tamanhos além da capacidade das ferramentas de software tradicionais de capturar, limpar, gerenciar e processar as informações dentro de um período de tempo razoável. Por tudo isto, a análise de big data envolve novos métodos e tecnologias (por exemplo, aprendizado de máquina) que requerem novas formas de software e a integração de dados que são diversos, complexos e existem em grande escala (Ottenbacher et al., 2019).
Fonte:
Ottenbacher, K. J., Graham, J. E., & Fisher, S. R. (2019). Data Science in Physical Medicine and Rehabilitation. Physical Medicine and Rehabilitation Clinics of North America, 30(2), 459–471. https://doi.org/10.1016/j.pmr.2018.12.003
A base de evidências para intervenções em pessoas com Distúrbio Específico de Aprendizagem - DEA é forte, refletindo o acúmulo de evidências de grandes ensaios clínicos randomizados (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Por sua vez, as intervenções acadêmicas são terapias cognitivas complexas que abrangem mais do que simplesmente encorajar as crianças a se envolverem na tarefa. Para aquelas que estão lutando para aprender a ler, escrever e compreender textos e cálculos, a instrução deve ser explícita. Isso significa que o professor, por exemplo, envolve propositalmente e intencionalmente o aluno no material a ser aprendido, com explicações diretas, modelagem de habilidades com estratégias e oportunidades de prática supervisionada (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Quanto ao domínio da automatização das tarefas, a prática acelerada é melhor do que a prática não cronometrada, junto com o engajamento estruturado em experiências autênticas que apoiam a prática em leitura, matemática e escrita. E mais, as intervenções abrangentes que incorporam múltiplas práticas de ensino são mais eficazes do que as abordagens focadas em habilidades (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Assim, as crianças com dificuldades no nível das palavras precisam de programas que não apenas ensinem a decodificação, mas também se concentrem na compreensão e na automatização das tarefas (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Outro aspecto, as crianças aprendem tanto sobre fatos matemáticos se praticarem sistematicamente, por um curto período dentro do contexto de uma abordagem de resolução de problemas, quanto quando ensinadas como uma habilidade isolada. O segredo é que a instrução seja explícita, diferenciada e de acordo com os pontos fortes e fracos nos domínios acadêmicos, E treinadas com intensidade o suficiente em relação à gravidade do problema acadêmico. As intervenções mais eficazes também incorporam uma autorregulação dos componentes que trata da atenção e das dificuldades organizacionais experimentadas por muitos com DEA (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Do mesmo modo, as intervenções ineficazes envolvem abordagens que não são explícitas, muitas vezes baseadas em abordagens construcionistas de descoberta. Além disso, a instrução deve se concentrar no conteúdo acadêmico. As intervenções que treinam habilidades isoladas, como memória operacional, processamento auditivo e visual de baixo nível ou outras intervenções não acadêmicas baseadas na modulação cerebral ou visual, não se generalizam para o domínio acadêmico (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Um outro quesito apontado nos estudos neurobiológicos, é a extensão da plasticidade nas redes neurais que modulam a leitura e a matemática. Existem mais de 20 estudos que combinam neuroimagem funcional antes e depois da intervenção de leitura, e alguns estudos em matemática. Na leitura, os estudos mostram uma maleabilidade significativa em crianças que respondem à intervenção, com alterações essencialmente normalizadas refletindo o aumento da ativação dos sistemas dorsal e ventral dependendo da tarefa e (provavelmente) da intervenção. Essas mudanças são mantidas em acompanhamentos de 1 ano. Após a intervenção na matemática, ocorre ativação reduzida e uma rede neural melhor organizada, com redução da hiperconectividade (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Essas indicações de plasticidade facilitam a interpretação de um achado fundamental da pesquisa de intervenção: os melhores resultados estão associados a intervenções precoces. Quando as crianças são identificadas com dificuldades básicas de leitura e matemática no início do desenvolvimento (antes da 3ª série), os esforços de intervenção levam a uma maior automaticidade. Com esforços corretivos posteriores, a automatização é difícil de alcançar, possivelmente porque os sistemas ventrais precisam de considerável exposição explícita para imprimir e processar padrões ortográficos rapidamente. Sem essa capacidade, a pessoa lê de forma lenta e ineficiente, com atenção excessiva à leitura de palavras, o que prejudica o acesso ao sentido do texto (Fletcher & Grigorenko, 2017).
Fonte:
Fletcher, J. M., & Grigorenko, E. L. (2017). Neuropsychology of Learning Disabilities: The Past and the Future. Journal of the International Neuropsychological Society, 23(9–10), 930–940. https://doi.org/10.1017/S1355617717001084
Sim, pois o estudo da função cerebral na saúde ou doença requer a integração de dados comportamentais e neurofisiológicos. Os exames de imagens fornecem os dados neurofisiológicos, mas não os comportamentais. Por esse motivo, a necessidade da avaliação neuropsicológica (ROALF; GUR, 2017). .
Clinicamente, o potencial é incomensurável para que a Imagem de Ressonância Magnética funcional - fMRI se torne parte integrante da prática clínica da neuropsicologia. Atualmente, a fMRI clínica tem duas aplicações principais(ROALF; GUR, 2017):
a) a geração de biomarcadores não invasivos da função cerebral para a classificação e monitoramento de pacientes neurológicos e psiquiátricos, e
b) planejamento pré-cirúrgico em cirurgias que podem afetar áreas motoras, de linguagem e de memória.
Outra contribuição entre esses dois exames é a incorporação da análise de rede na neuropsicologia via a fMRI. A cognição humana adulta é apoiada por sistemas de regiões cerebrais, ou módulos, que são funcionalmente coerentes em repouso e ativados coletivamente por requisitos de tarefas distintos. Várias redes fundamentais em estado de repouso foram descobertas pela junção desses campos, incluindo as redes somatossensoriais e redes de modo padrão. A elucidação das redes de estado de repouso envolvidas na atenção e cognição é talvez ainda mais relevante para a neuropsicologia. Isso inclui as redes de atenção dorsal e ventral; o primeiro envolvido no controle executivo da atenção, enquanto o último auxilia na detecção de pistas salientes. Além disso, a rede de controle frontoparietal e a rede cingulo-opercular parecem estar envolvidas em funções de ordem superior, como tomada de decisão e execução de tarefas direcionadas a objetivos, respectivamente (ROALF; GUR, 2017).
Consequentemente, as flutuações espontâneas na atividade cerebral aparentemente servem para organizar, coordenar e manter sistemas cerebrais funcionais e auxiliar no processamento de informações. Uma compreensão de como a formação desses módulos apoia a evolução das capacidades cognitivas pode ser alcançada aplicando métodos da teoria dos grafos, projetados para caracterizar padrões de conectividade. As regiões do cérebro são definidas como nós e as conexões entre elas como “bordas”. A teoria dos grafos pode usar qualquer medida que defina a força da conectividade entre os nós, como correlações de séries temporais de flutuações de sinal, para construir um modelo de conectividade geral e regional (ROALF; GUR, 2017).
Do mesmo modo, essa abordagem tem sido útil para medir a plasticidade dos sistemas cognitivos durante o treinamento cognitivo, estudando mudanças no desenvolvimento e relacionadas à idade nas redes neurais; e na diferenciação de indivíduos com distúrbios neurológicos e neuropsiquiátricos de indivíduos saudáveis (ROALF; GUR, 2017).
A melhoria no desempenho cognitivo é uma pedra angular da neuropsicologia e estudos recentes de rsfMRI, em que demonstraram que a experiência repetida com problemas de raciocínio altera a conectividade do cérebro. Especificamente, o treinamento durante um período de três meses alterou a conectividade funcional nos sistemas cerebrais frontoparietal e parietal-estriatal. Mais importante ainda, essas mudanças na conectividade do cérebro foram associadas a melhorias nos testes padronizados. Tal resultado sugere que as abordagens neuropsicológicas podem ter um impacto direto e significativo nos padrões cerebrais individualizados de rsfMRI (ROALF; GUR, 2017).
Num cérebro lesionado ou com disfunção em uma área específica requer a conjunção desses dois exames. No futuro, o profissional neuropsicólogo irá aplicar a sua bateria de testagem computadorizadas baseados na neurociência cognitiva moderna e validados com neuroimagem estrutural e funcional. Logo, esse neuropsicólogo clínico irá acompanhar a entrevista clínica e os exames com uma sessão de fMRI, supervisionada pelo neuropsicólogo, na qual uma bateria computadorizada de exames será administrada ao paciente no scanner. A leitura incluirá de forma mais rápida as informações sobre aberrações em parâmetros cerebrais e redes relacionadas a déficits comportamentais, que serão auxiliados por imagens e gráficos a serem interpretados pelo neuropsicólogo clínico (ROALF; GUR, 2017).
Fonte:
ROALF, D. R.; GUR, R. C. Functional brain imaging in neuropsychology over the past 25 years. Neuropsychology, v. 31, n. 8, p. 954–971, nov. 2017.
A neuroreabilitação das funções cognitivas em pessoas com Esclerose Múltipla – EM se baseia numa combinação de abordagens comportamentais (cognitivas e exercícios físicos) e farmacológicas. Entretanto, dada a atual falta de evidências de abordagens farmacológicas e de exercícios físicos, a neuroreabilitação cognitiva é a intervenção atual de escolha (Benedict et al., 2017).
Consequentemente, a neuroreabilitação é primordial, em função da frequência e gravidade das deficiências cognitivas na EM e do seu impacto na vida cotidiana. Por exemplo, na revisão da Cochrane realizada por das Nair, Martin, & Lincoln (2016), foi indicado o efeito clínico significativo da intervenção na memória de curto e longo-prazo, acompanhado de melhora substancial na qualidade de vida desses pacientes (Benedict et al., 2017).
Outro exemplo, essa de recomendação máxima (classe 1), é a Técnica de Memória de História modificada (mSMT). A técnica é projetada para melhorar a aquisição de novo aprendizado. Os resultados indicaram melhora considerável na aprendizagem, na memória e na vida cotidiana dos pacientes (Benedict et al., 2017).
Do mesmo modo, outras técnicas de modulação da memória têm se mostrado eficazes na melhoria da codificação, armazenamento e recuperação de conteúdo mnemônico: a aprendizagem espaçada, a aprendizagem autogerada e a prática de recuperação – ou o efeito de teste (Benedict et al., 2017).
Importante ressaltar que não é só o domínio mnemônico que são foco de intervenção efetivas. Outros recursos vêm sendo demonstrados como essenciais para modular a atenção, memória operacional e outros subnúcleos das funções executivas (Benedict et al., 2017).
Igualmente, numerosos estudos demonstraram que a reabilitação cognitiva não apenas melhora as funções cognitivas e a atividade da vida cotidiana, mas também promove mudanças adaptativas na atividade cerebral por meio da neuroplasticidade (Benedict et al., 2017).
Por exemplo, Chiaravalloti et al. demonstraram que as melhorias cognitivas e comportamentais observadas usando a intervenção comportamental mSMT foram associadas ao aumento da atividade em várias redes cerebrais, aumento da conectividade funcional no estado de repouso entre o hipocampo e outras estruturas cerebrais, e que esses efeitos foram mantidos no acompanhamento de longo prazo (Chiaravalloti et al., 2020).
Existem agora dezenas de estudos de pesquisa que mostram mudanças de plasticidade adaptativa semelhantes seguindo vários tipos e formas de reabilitação cognitiva em pessoas com EM (Benedict et al., 2017).
Em resumo, diante de resultados mistos, geralmente negativos, de intervenções farmacológicas para melhorar a memória e do exercício físico, embora promissor, seus efeitos definitivos na cognição aguardam novas pesquisas com projetos metodológicos aprimorados, até o momento, as intervenções de base cognitiva continuam sendo a abordagem mais eficaz para tratar o comprometimento cognitivo nesse grupo clínico (Benedict et al., 2017).
Fontes:
Benedict, R.H.B., DeLuca, J., Enzinger, C., Geurts, J.J.G., Krupp, L.B., Rao, S.M., 2017. Neuropsychology of Multiple Sclerosis: Looking Back and Moving Forward. J. Int. Neuropsychol. Soc. 23, 832–842. https://doi.org/10.1017/S1355617717000959
Chiaravalloti, N.D., Moore, N.B., DeLuca, J., 2020. The efficacy of the modified Story Memory Technique in progressive MS. Mult. Scler. J. 26, 354–362. https://doi.org/10.1177/1352458519826463
A Negligência Espacial é uma condição incapacitante que frequentemente apresenta dificuldades diagnósticas, mesmo para especialistas familiarizados com essa classe. Esta síndrome, classicamente, se apresenta como desorientação espacial não dominante (frequentemente do lado esquerdo) após um evento patológico no hemisfério cerebral direito, geralmente no córtex parietal posterior direito. Ela, além do comprometimento sensorial e motor, também pode afetar outros componentes como déficits perceptuais, representacionais, visuoespaciais, comportamentais, etc. O aspecto mais desafiador desta doença é a consciência anormal e frequente do paciente em relação ao seu déficit, denominado anosognosia e presença de disfunção emocional (SARWAR; EMMADY, 2021).
A negligência espacial afeta 50% dos sobreviventes de AVE agudo. Adversamente, impacta a recuperação desses pacientes levando-os a maiores despesas hospitalares e pós-hospitalares (BARRETT et al., 2013).
Os profissionais podem estimar a gravidade dessa negligência unilateral usando o Processo de Avaliação de Negligência da Fundação Kessler (KF-NAP) ou os escores da Escala de Conley (SARWAR; EMMADY, 2021).
A negligência é uma síndrome heterogênea devido as variações na localização e extensão do dano cerebral. Esse desequilíbrio inter-hemisférico faz com que o hemisfério esquerdo se torne mais ativo após a lesão do hemisfério direito, o que resulta em desvio de atenção e movimentos dos olhos para o lado direito. A presença de negligência espacial indica um prognóstico grave em termos de funcionamento independente a longo prazo do paciente (SARWAR; EMMADY, 2021).
Inicialmente, os tratamentos de negligência espacial tratavam principalmente da disfunção visual, embora os estudos na área das neurociências dissessem que, distinto dos erros visuoespaciais, as pessoas com negligência espacial cometem erros espaciais incapacitantes, baseados no corpo e na exploração motora. O equívoco de privilegiar apenas uma abordagem visual, é provavelmente em função dos designers dos estudos feitos no passado, que recrutavam indivíduos e avaliam os resultados de forma a evitar a detecção de melhorias na função motora espacial. Esse bloqueio translacional entre a neurociência e a pesquisa clínica pode ter confundido a conduta dos neuroreabilitadores (BARRETT et al., 2013).
A vantagem do treinamento de adaptação de prisma é que o recurso é simples e acessível, quando comparado com as terapias visuais comumente usadas. Outra vantagem é a posologia clínica de efeito inicial, uma vez que as sessões são curtas e frequentes, no caso do contexto hospitalar. Por exemplo, com as lentes de prisma convergente, com deslocamento para a direita de 20 dioptrias de 12,4° são geralmente usadas em 10 sessões curtas de treinamento motor intensivo (BARRETT et al., 2013).
Na referida intervenção, os pacientes apontam repetidamente para alvos ou realizam tarefas manuais contínuas, enquanto a visão dos próprios movimentos do braço é parcialmente bloqueada. Durante o treinamento, os participantes, inicialmente, apresentam erros para a direita, ou seja, na orientação do deslocamento óptico, mas conforme executam movimentos repetidos (geralmente por volta de 50 tentativas) muitos começam a apontar com precisão (BARRETT et al., 2013).
Dosagem de início terapêutico:
Duração:10 sessões de treinamento
Intensidade: 15-30 minutos.
Acrescenta-se que os prismas são usados apenas durante o treinamento, deixando o resto do dia livre para outras atividades ou reabilitação. Após o treinamento, com a remoção das lentes, os pacientes geralmente apresentam efeitos colaterais transitórios. Ou seja, erram os movimentos na direção oposta - para a esquerda (BARRETT et al., 2013).
Os resultados do procedimento em sobreviventes de AVE com negligência podem persistir por mais tempo do que em controles saudáveis e a melhoria do "direcionamento" motor espacial para a esquerda pode generalizar-se para melhorar a função da vida diária (BARRETT et al., 2013).
Do mesmo modo, melhorias significativas na independência foram relatadas em alguns pacientes, após o treinamento de adaptação do prisma. Isto é, eles começaram a andar por conta própria em uma cadeira de rodas para deslocamentos ou recuperaram a capacidade de se vestirem (BARRETT et al., 2013).
Portanto, os pontos de vantagens do treinamento de adaptação do prisma, quanto a sua eficácia que vem sendo demonstrada, é que a técnica:
a) primeiro, emprega princípios de aprendizagem motora, uma abordagem fundamental para apoiar a reabilitação funcional motora.
b) segundo, é dependente da experiência ou da atividade (cognição-motora, via regulação entre os polos percepção-ação) ao invés das estratégias puramente top-down.
c) terceiro, é um procedimento, em vez de um conjunto de instruções verbais ou objetivos conscientes a serem lembrados; ela fornece múltiplas oportunidades de aprendizagem e experiência direta com erro (BARRETT et al., 2013).
Fontes:
BARRETT, A. M. et al. Neurorehabilitation: Five new things. Neurology. Clinical practice, v. 3, n. 6, p. 484–492, dez. 2013.
SARWAR, A.; EMMADY, P. D. Spatial Neglect. 2021.
A neuroreabilitação desempenha um papel importante para a plasticidade neural e recuperação funcional após uma lesão ou disfunção neuropsiquiátrica (Fujiwara et al., 2017). Bem como, em sua aplicação clínica, é um novo arsenal de recursos clínicos que os profissionais da saúde têm para intervir em distúrbios cerebrais incapacitantes, como por exemplo, o Acidente Vascular Encefálico – AVE e a Lesão Cerebral Traumática (Barrett et al., 2013). Essa área é baseada na medicina de reabilitação, neurociência e neurofisiologia (Fujiwara et al., 2017).
Por exemplo, a neuroreabilitação usando a estimulação elétrica neuromuscular controlada por eletromiografia (EMG) para a função motora da extremidade superior, após o AVE, melhorou a função do braço e da mão e pode induzir alteração plástica no interneurônio intracortical e no interneurônio recíproco espinhal. Outro uso demonstrado, é na recuperação funcional induzida pelo exercício após lesão medular. O exercício terapêutico pode induzir a remodelação do músculo esquelético, alteração fisiológica do neurônio motor espinhal e remodelação do córtex motor (Fujiwara et al., 2017).
Do mesmo modo, estudos neurofisiológicos revelaram atividade neural relacionada à redução da velocidade da marcha na doença de Parkinson e recuperação funcional da hemiplegia após AVE (Fujiwara et al., 2017).
Em outras palavras, esse é um paradigma intelectual emergente para recuperação neurológica que inclui regeneração neural, reparo e reorganização dinâmica de sistemas neurais funcionais, bem como o aumento da consciência dos princípios comportamentais que podem modular o retorno e/ou compensação da funcionalidade. Ainda que timidamente, muitos profissionais já vêm ofertando aos sistemas de saúde e aos pacientes tratamentos baseados na aprendizagem dependente da experiência, estimulação neurofisiológica e uma combinação desses conceitos (Barrett et al., 2013).
As intervenções com a neuroreabilitação deflagraram-se a partir do ano 2000, em paralelo com uma mudança no paradigma dos cuidados neurológicos. Em meados do século XX, abandonamos a suposição de que o efeito de uma lesão cerebral, como um AVE; na função, atividade e participação – indicadores ancorados na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, conhecida como CIF, seria permanente e nos tornamos cada vez mais conscientes do potencial regenerativo do cérebro, bem como da reorganização dinâmica dele, após meses e até muitos anos depois de um evento traumático. Cientistas de neuroreabilitação vêm mostrando por meio de pesquisas translacionais sob quais condições ocorrem as mudanças e a recuperação ideal do cérebro. Nesses casos, aparentemente, exigindo estimulação intensiva e controlada de redes cerebrais prejudicadas (Barrett et al., 2013).
Um dos principais recursos usados nas demonstrações da plasticidade neural induzida pela neuroreabilitação são as aferições via neuroimagem. Esses estudos vêm revelando novos achados de reorganização cortical após lesão da medula espinhal, paralisia do nervo facial, perda auditiva e exercícios aeróbicos em adultos mais velhos. Logo, as técnicas neurofisiológicas e de neuroimagem avançadas estão fornecendo novos insights sobre a recuperação funcional em distúrbios neurológicos (Fujiwara et al., 2017).
Fontes:
Barrett, A. M., Oh-Park, M., Chen, P., & Ifejika, N. L. (2013). Neurorehabilitation: Five new things. Neurology: Clinical Practice, 3(6), 484–492. https://doi.org/10.1212/01.CPJ.0000437088.98407.fa
Fujiwara, T., Paik, N.-J., & Platz, T. (2017). Neurorehabilitation: Neural Plasticity and Functional Recovery. Neural Plasticity, 2017, 1–1. https://doi.org/10.1155/2017/3764564
Este programa de fisioterapia convencional, conjugado com o console de Nintendo Wii demonstrou melhorar a funcionalidade, o equilíbrio e as atividades de vida diária dos pacientes que sofreram um AVE. O programa recorre a um método inovador, eficiente e acessível.
Recursos necessários:
Realidade virtual com Nintendo Wii (VRWiiG)
Treino de equilíbrio com Wii Balance Board
Exercícios de membros superiores com pacote Wii Sports
Somados a fisioterapia convencional
O estudo explica que os jogos de vídeo-game permitem aos fisioterapeutas projetarem os programas de reabilitação para otimizar os princípios de plasticidade cerebral. E não somente isso, o console dá respostas em tempo quanto ao desempenho e ao progresso, que permitem modular a resposta motora, além de aumentar a motivação, o divertimento e a aderência dos pacientes ao tratamento.
Os outros benefícios do Wii são que ele é fácil de usar; relativamente disponível; pode ser usado individualmente e, em casa. Esses atributos permitem aumentar a frequência de treinamento, tão importante para alcançar a neuroplasticidade positiva das habilidades alvo do treino.
Neste caso, quanto a neuroplasticidade, uma das ferramentas do Wii é o controle da distância, agregado a uma tabela de equilibrio que detecta a transferência do peso. Esses dados são refletidos num avatar na tela, que permite que o paciente observe seus próprios movimentos e gere uma reação positiva. Ao mesmo tempo, o feedback do seu movimento tem tempo real conduz a um reforço dos mecanismos de aprendizagem motora. Assim, quando o paciente observa os seus movimentos, as mudanças da plasticidade que dependem do uso das áreas sensoriais que pertencem ao sistema de neurônio espelho são reforçados.
Dosagem de início de efeito clínico:
Duração: 4 semanas
Intensidade: 50 minutos
Frequência: 2 vezes por semana
Avaliação de seguimento T1 (início da intervenção) e T2 (final da intervenção):
Timed up and go (TUG)
Tinetti Performance-Oriented Mobility Assessment (POMA)
Berg Balance Scale (BBS)
Avaliação Fugl-Meyer do Membro Superior, Índice de Barthel, Índice de Atividade de Frenchay (FAI)
Resultados: Foram promissores na funcionalidade, equilíbrio e atividades de vida diária ao adicionar a realidade virtual com Nintendo Wii à fisioterapia convencional em sobreviventes de AVE crônico, quando comparado ao grupo que recebeu apenas a fisioterapia convencional.
Fonte:
Marques-Sule E, Arnal-Gómez A, Buitrago-Jiménez G, Suso-Martí L, Cuenca-Martínez F, Espí-López GV. Effectiveness of Nintendo Wii and Physical Therapy in Functionality, Balance, and Daily Activities in Chronic Stroke Patients. J Am Med Dir Assoc. 2021 May;22(5):1073-1080. doi: 10.1016/j.jamda.2021.01.076. Epub 2021 Feb 24. PMID: 33639116.
Existem três categorias gerais de causas do declínio cognitivo associado ao envelhecimento:
desuso
doença e
envelhecimento per se.
Devido ao desuso, as pessoas tendem a usar prioritariamente certas habilidades em detrimento de outras com a idade e, portanto, essas habilidades que são colocadas em "stand-by" diminuem.
Quanto a doenças, principalmente a físicas, tendem a aumentar a incidência com a idade, o que potencializa o comprometimento do funcionamento cognitivo.
E por último, devido ao envelhecimento normotípico, existem mudanças neurobiológicas reais com a idade que contribuirão para a deterioração das habilidades cognitivas, conforme pode ser visualizado na figura acima, o auge da performance foi entre 18 e 21 anos e após esta faixa etária o desempenho começa a retroceder novamente. Esses dados foram retirados do teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey (RAVLT), na etapa de recordação de palavras com o passar do tempo, em validação para a população brasileira.
A variabilidade de desempenho entre diferentes indivíduos dentro de uma faixa etária aumenta com a idade devido a cada um desses três principais fatores (desuso, doença e envelhecimento per se) que contribuem para o declínio da idade.
A melhor defesa contra a deterioração cognitiva relacionada à idade é a prática. Neste caso, a prática dever ser vista como o que disseram os pais da neuroplasticidade: “o cérebro encolhe com o empobrecimento e cresce em um ambiente enriquecido em qualquer idade” (Diamond et al., 1971 , 1984 ; Malkasian e Diamond, 1971) e para que ele tenha uma neuroplasticidade positiva, Diamond identificou cinco aspectos essenciais que o nutre no decorrer na vida: a novidade, o desafio, o exercício físico, a dieta e o amor (Shaffer J. 2016). Portanto, a prática desses 5 aspectos tende a mitigar os efeitos do envelhecimento, não permitindo que ocorra o desuso.
Além disso, a prática pode supercompensar os efeitos da idade ao construir uma “poupança” de reserva cognitiva maior para compensar quaisquer efeitos neurobiológicos reais da idade. A prática também pode levar a estratégias compensatórias nas quais são encontradas maneiras alternativas de manter os níveis de desempenho.
Logo, qualquer melhoria na função cognitiva agrega melhorias também na qualidade de vida e bem-estar, uma vez que a literatura sugere que as medidas de variáveis não cognitivas, como humor, funcionalidade, qualidade de vida percebida, estão associadas aos efeitos de interações cognitivas.
Fontes:
Shaffer J. (2016). Neuroplasticity and Clinical Practice: Building Brain Power for Health. Frontiers in psychology, 7, 1118. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2016.01118
ZEC, R. F. The neuropsychology of aging. Experimental Gerontology, v. 30, n. 3–4, p. 431–442, maio 1995.
O desempenho da leitura na hemianopia depende altamente de sua configuração: na divisão macular, metade do campo visual de leitura é coberto pelo escotoma e, consequentemente, é disfuncional. Em pacientes com preservação macular, o campo visual de leitura (amplitude de percepção durante uma fixação) pode ser totalmente poupado e a leitura não é prejudicada. Por outro lado, um pequeno escotoma homônimo paracentral pode cobrir metade do campo visual de leitura e levar a graves problemas de leitura.
O desempenho de leitura depende do lado em que se encontra a disfunção de campo, no que diz respeito à direção de leitura:
a) em idiomas que exigem mover os olhos da esquerda para a direita ao longo da linha, os pacientes são muito mais prejudicados por uma hemianopia direita, indicado por um aumento do número de sacadas, regressões e uma velocidade de leitura severamente reduzida.
b) Se houver hemianopsia esquerda, os pacientes têm o problema de encontrar o início da próxima linha, indicada por várias sacadas hipométricas durante a varredura de retorno.
MECANISMOS ADAPTATIVOS ESPONTÂNEOS PARA LEITURAUm mecanismo adaptativo promissor é a fixação excêntrica: uma minoria de pacientes (aproximadamente 20%) é capaz de usar um locus de fixação ligeiramente excêntrico, que muda sua borda do campo visual para o lado hemianópico e cria uma faixa estreita de visão ao longo da borda do campo vertical. Eles podem usar este mecanismo sacrificando um pouco da acuidade visual e ganhando um campo visual de leitura ligeiramente ampliado, o que leva à fixação excêntrica homônima.
Outro mecanismo adaptativo favorável é fazer sacadas preditivas, especialmente em pacientes com hemianopia esquerda. Esses podem aprender a aplicar uma única sacada preditiva hipermétrica para encontrar o início da nova linha.
EVIDÊNCIAS QUANTO A NEUROREABILITAÇÃO DO DISTÚRBIO HEMIANÓPICO DE LEITURAEm estudos controlados randomizados foi demonstrado que a leitura de texto guiado para hemianopia direita foi eficaz para melhorar a velocidade de leitura. Outra estratégia para melhorar a velocidade de leitura, é por meio da modulação via tarefa de busca em uma linha de palavras e com treinamento anti-sacádico.
Outras abordagens, baseadas na experiência clínica, são para potencializar a orientação na página por meio do uso de recursos visuais e táteis, por exemplo, o dedo indicador, uma régua ou uma régua de aumento ligeiramente vertical com uma linha guia vermelha. No entanto, transformar o texto em uma orientação vertical ou diagonal ainda não foi estudado sistematicamente.
Reafirmando, que para potencializar a reabilitação da hemianopia, apenas métodos compensatórios têm se mostrado eficazes em estudos baseados em evidências até o momento, via:
a) tarefas de busca visual e audiovisual,
b) treinamento de atenção e tarefas sacádicas / anti-sacádicas.
Para leitura:
a) texto guiado para hemianopia direita e tarefa de pesquisa em uma linha de palavras.
Fonte:Horton, J. C., Fahle, M., Mulder, T., & Trauzettel-Klosinski, S. (2017). Adaptation, perceptual learning, and plasticity of brain functions. Graefe's archive for clinical and experimental ophthalmology = Albrecht von Graefes Archiv fur klinische und experimentelle Ophthalmologie, 255(3), 435–447. https://doi.org/10.1007/s00417-016-3580-y
A base do manejo clínico convencional do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem sido as intervenções farmacológicas e comportamentais/psicológicas. Quanto aos exercícios físicos, incluindo o esporte estruturado, ainda é tímida a indicação na clínica como recurso complementar. Ainda que exista uma base sustentável quanto ao seu efeito clínico na modulação dos sintomas cognitivos/comportamentais e ser uma alternativa de tratamento para àqueles em que as intervenções tradicionais indicam baixa resposta clínica e/ou efeitos adversos, no caso do tratamento medicamentoso (Christiansen et al., 2019; Ng et al., 2017).
Claro, o campo de evidências quanto a recomendação do esporte nas doenças psiquiátricas e neurológicas é novo. A psiquiatria do esporte, contendo o tópico de tratamento de transtornos mentais com exercícios, surgiu a pouco menos de 3 décadas, em 1994. Logo, desde então é que a terapia esportiva de transtornos mentais vem recebendo base científica. A prevenção psiquiátrica otimizada, o tratamento de atletas e o suporte ideal relacionado ao esporte para indivíduos com transtornos mentais devem ser o principal objetivo para o futuro próximo. (Ströhle, 2019).
Consequentemente, voltando ao cerne da questão, nas instalações de treinamento esportivo, o modelo de diferença tem maior probabilidade de ser eficaz para pacientes com TDAH porque eles têm a oportunidade de se adaptar e mudar seus comportamentos, em vez de serem culpados e punidos por seus sintomas de TDAH. Nesse contexto, o treinador tem estratégias que leva o seu aluno a assumir o controle, administrar e se envolver com o ambiente para minimizar os sintomas de TDAH (Wolfe and Madden, 2016).
Em outras palavras, os treinadores esportivos são prestadores de cuidados de saúde valiosos e essenciais para pacientes com TDAH. Esses profissionais atuam de forma orientada para o desempenho no esporte via educação diretiva. No entanto, para que um paciente com TDAH tenha um resultado bem-sucedido em um ambiente de treinamento atlético movimentado, esses treinadores devem adaptar o ambiente de tratamento às necessidades desses pacientes. E, para tanto, eles podem se orientar nas “recomendações baseadas em evidências para treinadores esportivos que cuidam de pacientes com TDAH” de Wolfe and Madden (2016).
Consequentemente, o esporte individualizado é capaz de regular a parte motora, emocional e cognitivas de grupos clínicos com TDAH. Entretanto, sabemos que para isto ele não deve ser implementado eventualmente, e sem estratégias por parte do treinador. Na rotina de treinamento no esporte, para este grupo clínico, a frequência, a intensidade e a duração são alvos da variável de acompanhamento à curto, médio e longo prazo.
Por fim, o esporte tem sido sugerido como uma terapia adjuvante segura e de baixo custo para o TDAH e é relatado como sendo acompanhado por efeitos positivos em vários aspectos das funções cognitivas na população infantil em geral (Christiansen et al., 2019). Por exemplo, o estudo de Hattabi et al. (2019) investigou os efeitos de um programa de natação recreativa nas funções cognitivas de crianças tunisianas com TDAH. Os resultados indicaram que houve melhoria significativa na precisão da memória, atenção seletiva e processo de inibição. No pós-programa, as crianças experimentaram uma redução geral dos tempos de execução da tarefa com menos erros de omissões. Elas também cometeram menos erros em situações de interferência, sinalizando um melhor funcionamento cognitivo.
Portanto, o esporte estruturado é recomendado para pacientes com TDAH. Em pouco tempo de adesão, é possível aferir os efeitos benéficos em várias áreas da vida do paciente. Afinal, a intervenção é para melhorar o dia a dia das pessoas.
Fontes:Christiansen, L., Beck, M.M., Bilenberg, N., Wienecke, J., Astrup, A., Lundbye-Jensen, J., 2019. Effects of Exercise on Cognitive Performance in Children and Adolescents with ADHD: Potential Mechanisms and Evidence-based Recommendations. J. Clin. Med. 8, 841. https://doi.org/10.3390/jcm8060841
Hattabi, S., Bouallegue, M., Ben Yahya, H., Bouden, A., 2019. Rehabilitation of ADHD children by sport intervention: a Tunisian experience. Tunis. Med. 97, 874–881.
Ng, Q.X., Ho, C.Y.X., Chan, H.W., Yong, B.Z.J., Yeo, W.-S., 2017. Managing childhood and adolescent attention-deficit/hyperactivity disorder (ADHD) with exercise: A systematic review. Complement. Ther. Med. 34, 123–128. https://doi.org/10.1016/j.ctim.2017.08.018
Ströhle, A., 2019. Sports psychiatry: mental health and mental disorders in athletes and exercise treatment of mental disorders. Eur. Arch. Psychiatry Clin. Neurosci. 269, 485–498. https://doi.org/10.1007/s00406-018-0891-5
Wolfe, E.S., Madden, K.J., 2016. Evidence-Based Considerations and Recommendations for Athletic Trainers Caring for Patients With Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder. J. Athl. Train. 51, 813–820. https://doi.org/10.4085/1062-6050-51.12.11
Um programa de intervenção estruturado para modulação de disfunções é composto pelo número sessões, frequência, intensidade e o limiar de resistência cognitiva. Este último, praticamente inexistente quanto a sua exploração nos estudos da área. Entretanto, esses valores não devem ser definidos aleatoriamente, ou a esmo. É preciso ser pautado, no mínimo, em um estudo científico, que aferiu algum efeito clínico na manipulação dessas importantes variáveis.
Apresentamos 3 estudos que trazem a posologia das doses terapêuticas para a integração sensorial no grupo clínico de indivíduos com Transtorno do Espectro Autista – TEA. Bem como, as discrepâncias nos resultados clínicos alcançados entre eles. Atentem para o terceiro estudo, o único que indicou tamanho de efeito clínico recomendado.
Lembrando que, a abordagem integrativa sensorial abrange o uso de avaliações que medem áreas específicas de desempenho sensorial e motor, sendo fundamental que a intervenção seja guiada por princípios específicos e documentação de resultados sensíveis e significativos. Logo, com o controle rígido das variáveis dependentes e independentes no uso dos recursos de intervenções (Schaaf et al., 2014).
Estudo 1 (Iwanaga et al., 2014):Dosagem: 37,2 sessões; intensidade: 1 hora; frequência: 1 vez por semana (num período de 8 a 10 meses = média 9,3)
Os resultados: ganhos positivos e estatisticamente significativos para o grupo TEA em cinco das seis medidas de resultado; tamanho médio do efeito foi de 0,23; que está abaixo do corte de 0,25 recomendado pelas diretrizes do What Works Clearinghouse (Schoen et al., 2019).
Estudo 2 (Estudo 2 (Pfeiffer et al., 2011):Dosagem: 18 sessões; intensidade: 45 minutos; frequência: 3 vezes por semana (num período de 6 semanas).
Avaliação de linha de base e de saída: As dificuldades de integração sensorial foram confirmadas para todos os participantes por meio de uma avaliação completa antes do início da intervenção.
Resultados: melhorias estatisticamente significativas nas metas da Escala de Atingimento de Meta (GAS), bem como uma diminuição significativa nos maneirismos do autismo, conforme medido pela Escala de Responsividade Social (SRS). Tamanhos de efeitos positivos para as metas de GAS (tamanho do efeito = 0,360 para avaliações de professores e 0,125 para avaliações de pais), bem como para maneirismos de autismo no SRS (d = 0,131). No entanto, a média desses três tamanhos de efeito foi de 0,21, que está abaixo do corte de 0,25 recomendado pelas diretrizes do What Works Clearinghouse (Schoen et al., 2019).
Estudo 3 (Schaaf et al., 2014):Dosagem: 30 sessões; intensidade: 1hora; frequência: 3 vezes por semana (num período de 10 semanas).
Avaliação: ADIR e o ADOS para confirmar o diagnóstico de TEA (testes padrão ouro). Todas as crianças receberam uma avaliação completa da integração sensorial, permitindo aos intervencionistas individualizar o tratamento.
Resultados: Melhorias estatisticamente significativas para o grupo TEA. Um tamanho de efeito muito grande (d de Cohen = 1,20) para resultados GAS, para assistência do cuidador no autocuidado por meio da Pediatric Evaluation of Disability Inventory /PEDI (d = 0,9) e escalas de atividades sociais (d = 0,7) foram relatados para o grupo TEA. O tamanho médio do efeito é 0,933; bem acima das diretrizes do What Works Clearinghouse (Schoen et al., 2019).
FONTES:Iwanaga, R., Honda, S., Nakane, H., Tanaka, K., Toeda, H., Tanaka, G., 2014. Pilot Study: Efficacy of Sensory Integration Therapy for Japanese Children with High-Functioning Autism Spectrum Disorder. Occup. Ther. Int. 21, 4–11. https://doi.org/10.1002/oti.1357
Pfeiffer, B.A., Koenig, K., Kinnealey, M., Sheppard, M., Henderson, L., 2011. Effectiveness of Sensory Integration Interventions in Children With Autism Spectrum Disorders: A Pilot Study. Am. J. Occup. Ther. 65, 76–85. https://doi.org/10.5014/ajot.2011.09205
Schaaf, R.C., Burke, J.P., Cohn, E., May-Benson, T.A., Schoen, S.A., Roley, S.S., Lane, S.J., Parham, L.D., Mailloux, Z., 2014. State of Measurement in Occupational Therapy Using Sensory Integration. Am. J. Occup. Ther. 68, e149. https://doi.org/10.5014/ajot.2014.012526
Schoen, S.A., Lane, S.J., Mailloux, Z., May‐Benson, T., Parham, L.D., Smith Roley, S., Schaaf, R.C., 2019. A systematic review of ayres sensory integration intervention for children with autism. Autism Res. 12, 6–19. https://doi.org/10.1002/aur.2046